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Reserva Ovariana – quando e como investigar?

Quinta, 01 Março 2018 17:49
            Embora a diminuição progressiva da quantidade e da qualidade dos oócitos ao longo da vida seja um fato concreto, a fecundidade varia significativamente entre as mulheres de uma mesma faixa etária e grande parcela permanece com ciclos menstruais normais até muito próximo da menopausa, tornando-se um desafio inferir suas chances de concepção. A necessidade de encontrar um bom teste de reserva ovariana ganha realce com a tendência atual de se postergar a maternidade (Hamilton et al, 2014). Entretanto, não há, até o momento, um teste que permita a previsão da menopausa, ou que identifique o declínio da fertilidade ou permita aferição das chances reais de se obter uma gravidez espontânea ou em técnicas de reprodução assistida (TRA) (Broekmans et al, 2006; Carvalho et al, 2008; Practice Committee ASRM, 2015).

            Talvez, mais difícil do que definir quais testes marcadores de reserva ovariana devem ser empregados, seja definir quando eles estão indicados. A avaliação de reserva ovariana como uma “previsão de longevidade da fertilidade feminina e permissão para se adiar a maternidade” tem sido empregada na prática, porém é uma ação arriscada. A maioria dos testes refere-se à produção hormonal do ovário (estradiol e inibinas) ou sua ação sobre o eixo hipotálamo-hipófise-ovariano (hormônios folículo-estimulante – FSH –  e luteinizante – LH), o que não garante a capacidade reprodutiva dos gametas. Além disso, a tal avaliação não pode ser parâmetro para inferência sobre o futuro reprodutivo. Por esse motivo, não há indicação de se incluir a avaliação de reserva ovariana como rotina para mulheres jovens sem prole definida (Busso et al, 2014).

            Em pacientes inférteis, os testes de reserva ovariana não devem ser adotados como critérios definidores de tratamento, já que alterados não implicam exatamente incapacidade de conceber (Practice Committee ASRM, 2015). Em pacientes que serão submetidas a TRA, a avaliação da função ovariana pode nortear protocolos de tratamento e, de maneira limitada, sugerir prognóstico (Busso et al, 2014).

            Como avaliar a reserva ovariana?

            Valores de FSH basal maiores que 8 UI/L em mulheres com menos de 40 anos correlacionaram-se com chances menores de gestação espontânea (van der Steeg et al, 2007). Em TRA, níveis de FSH ≥ 15 UI/mL foram associados a menor número de oócitos aspirados (Ashrafi et al, 2005; Klinkert et al, 2005), porém as taxas de gravidez em mulheres com menos de 35 anos e FSH basal alto foram maiores quando comparadas àquelas com idade mais avançada e níveis normais, sugerindo a superioridade da idade como marcador da reserva ovariana em relação ao FSH (Luna et al, 2007). Um grande problema desse marcador está na grande variabilidade dos níveis entre ciclos e mesmo em uma mesma amostra (Lambalk & de Koning, 1998). Dessa forma, pode-se dizer que uma única dosagem de FSH tem valor muito limitado na avaliação do potencial reprodutivo, seja em candidatas à concepção espontânea, seja em candidatas à TRA (Practice Committee ASRM, 2015).

            O hormônio anti-mülleriano (AMH) é o teste mais confiável para estimativa da reserva ovariana, uma vez que estabelece correlação positiva com a resposta ao estímulo exógeno em TRA (Fadini et al, 2011; Patrelli et al, 2012). Embora tenha se demonstrado associação significativa entre o desenvolvimento de embriões em TRA e níveis normais de AMH (Irez et al, 2011), são poucas as evidências de associação com gravidez (Arabzadeh et al, 2010; Gnoth et al, 2008; Sahmay et al, 2012). A grande variabilidade entre kits para dosagem do AMH sanguíneo é a principal barreira para o uso do teste como ferramenta cotidiana. Em termos gerais, até que valores confiáveis sejam internacionalmente validados, pode-se inferir a baixa reserva ovariana quando o nível sanguíneo de AMH for inferior a 1,0 ng/mL e risco de resposta excessiva em TRA com nível superior a 3,5 ng/mL (La Marca et al, 2007; Tal & Seifer, 2017).

            A contagem de folículos antrais (CFA) consiste na soma de todos os folículos entre 2-10 mm, nos dois ovários, ao exame de ultrassonografia transvaginal na fase folicular inicial (Pache et al, 1990; Scheffer et al, 2002; Frattarelli et al, 2003; ; Bancsi et al, 2004; McIlveen M et al, 2007). As vantagens do uso da CFA são: resultado imediato, confiabilidade entre ciclos e entre observadores. Sobrepeso e obesidade são fatores que podem comprometer a acurácia do teste (Broekmans et al, 2006). CFA menor ou igual a 4 parece predizer má resposta, enquanto que CFA maior ou igual a 16, está relacionada a risco de síndrome de hiperestimulação ovariana (Broer et al, 2011).

            Em suma, em estudo comparativo dos testes de avaliação da reserva ovariana, AMH e CFA foram os únicos testes com poder preditivo significativo para má resposta na estimulação ovariana (Jayaprakasan et al, 2010).


            Considerações Finais

  1. Não há, até o momento, um marcador de avaliação da reserva ovariana que permita a previsão da menopausa em mulheres com ciclos menstruais regulares ou que identifique se há declínio da fertilidade de forma precisa.
  2. Exames de reserva ovariana diminuída não implicam na incapacidade de conceber, tampouco testes normais garantem o sucesso do tratamento.
  3. A avaliação de reserva ovariana pelos marcadores atuais indica o estado do funcionamento ovariano naquele momento, e não podem ser parâmetro para inferências relativas ao futuro reprodutivo a médio e longo prazo.
  4. Não há indicação de se incluir a avaliação de reserva ovariana como rotina clínica para mulheres jovens ainda sem prole definida.
  5. Os marcadores de reserva ovariana podem trazer benefícios em casos de pacientes inférteis, especialmente naquelas que serão submetidas a TRA.
  6. O FSH elevado tem especificidade aceitável como marcador de mau prognóstico reprodutivo, embora tenha pouco valor de predição quando em níveis baixos (menores que 10 mIU/ml).
  7. O AMH e a CFA são os únicos testes com poder preditivo significativo para má resposta a estimulação ovariana.
            Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva, Andréa Prestes Nácul, Bruno Ramalho de Carvalho, Cristina Laguna Benetti-Pinto, Daniela Angerame Yela, Gustavo Arantes Rosa Maciel, José Maria Soares Júnior, Laura Olinda Bregieiro Fernandes Costa, Sebastião Freitas de Medeiros, Técia Maria Oliveira Maranhão

            Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Endócrina da Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia – FEBRASGO


            Autores:

Ana Carolina Japur de Sá Rosa-e-Silva, Andréa Prestes Nácul e Bruno Ramalho de Carvalho. 

            
REFERÊNCIAS:


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