RECOMENDAÇÕES DA VACINA VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO PARA GESTANTES

Segunda, 07 Julho 2025 14:10
Autoria: Membros da Comissão Nacional Especializada (CNE) em Vacinas da Febrasgo

O objetivo dessa nota é orientar ginecologistas e obstetras sobre as estratégias de proteção ao recém-nascido nos seus primeiros meses de vida contra a infecção pelo vírus sincicial respiratório (VSR), suas doenças do trato respiratório e suas consequências.

O VSR é o agente mais comum de infecção do trato respiratório inferior (responsável por aproximadamente 80% dos quadros de bronquiolites e até 60% das pneumonias em menores de dois anos), com a grande maioria das crianças experimentando pelo menos um episódio de infecção pelo VSR antes de completarem dois anos de idade. A elevada prevalência da infecção pelo VSR, assim como as características clínicas da doença em bebês, faz com que aproximadamente uma em cada cinco crianças irá necessitar de atendimento médico ambulatorial devido à infecção pelo VSR e uma em cada 50 crianças será hospitalizada ainda no primeiro ano de vida.1-4 Estima-se que as infecções do trato respiratório inferior (ITRI) pelo VSR causem, globalmente, entre dois e três milhões de hospitalizações e aproximadamente 60.000 a 120.000 mortes em crianças menores de cinco anos anualmente, com um dado ainda mais dramático: mais de 95% dos episódios agudos de ITRI associados ao VSR e mais de 97% das mortes atribuíveis ao VSR em todas as faixas etárias ocorreram em países de baixa e média renda (LMIC), incluindo o Brasil.2,5,6 Estes dados fazem do VSR a principal causa de mortalidade entre bebês.

Apesar de a idade ser o principal fator de risco identificado, a presença de determinadas condições também contribui para maiores taxas de hospitalização e ocorrência de doença mais grave pelo VSR. Entre estas condições destacamos a prematuridade, a doença pulmonar crônica da prematuridade (DPCP) e a doença cardíaca congênita (DCC).1,7,8

Apesar de todos os esforços realizados nas últimas décadas na tentativa do desenvolvimento de estratégias terapêuticas, ainda não dispomos de drogas antivirais específicas para combater as infecções pelo VSR. As atuais medidas de prevenção disponíveis se concentravam em medidas de higiene para redução do risco de transmissão e no uso do palivizumabe, um anticorpo monoclonal indicado apenas para crianças de alto risco, incluindo bebês prematuros e aqueles portadores de DPCP e DCC .9,10

Para a prevenção das doenças causadas pelo VSR em bebês, estão disponíveis atualmente duas estratégias: a vacina VSR para gestantes, por meio da transferência de anticorpos via transplacentária para o feto e os anticorpos monoclonais, administrados diretamente aos bebês. 11
Foi autorizada no Brasil em outubro de 2023 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o nirsevimabe, um anticorpo monoclonal (imunização passiva) de ação prolongada12 para a prevenção da infecção por VSR em lactentes, com as seguintes indicações: recém-nascidos e lactentes durante sua primeira temporada de circulação do VSR e crianças de até 24 meses, em sua segunda temporada, que permanecem vulneráveis à doença grave pelo VSR, que pode incluir crianças com as seguintes condições clínicas: doença pulmonar crônica da prematuridade; doença cardíaca congênita com repercussão hemodinâmica; fibrose cística; doenças neuromusculares; anomalias congênitas das vias aéreas; crianças imunocomprometidas e portadoras da Síndrome de Down.13

No momento, o nirsevimabe está disponível somente nos serviços privados de vacinação e está em avaliação estratégica pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunizações (CTAI) a definição das suas recomendações no SUS.

Outra ferramenta de prevenção da doença que foi autorizada para uso no Brasil em abril de 2024 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) - a imunização ativa materna com transferência de anticorpos para o feto (imunização passiva ao feto). Trata-se de uma vacina baseada na proteína F do VSR, em sua conformação pré-fusional, com nome de AbrysvoÒ (Pfizer)14. Esta vacina se mostrou eficaz na redução do risco de internação hospitalar decorrente de infecção do trato respiratório inferior pelo VSR nos primeiros 180 dias de vida.15 Licenciada para uso em gestantes de até 49 anos de idade e na faixa de idade gestacional entre 24 e 36 semanas.15

Outras agências regulatórias também aprovaram a Abrysvo, com diferentes recomendações: A Food and Drug Administration (FDA), aprovou a vacina para uso entre 32 e 36 semanas; a agência regulatória europeia, European Medicines Agency (EMA), autorizou a vacina entre 24 e 36 semanas de gestação; no Reino Unido, a recomendação foi estabelecida a partir de 28 semanas e, na Argentina, também a partir de 32 semanas.11

Anteriormente, a CNE vacinas da Febrasgo corroborou com a recomendação da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), que do ponto de vista da saúde individual, sugeriu a vacinação entre 32 e 36 semanas de gestação, porque a eficácia vacinal foi um pouco maior a partir de 32 semanas quando comparada com 24 semanas e, além disso, no estudo pivotal de licenciamento da vacina, houve um aumento discreto, sem significância estatística, de casos de prematuridade no grupo vacina comparado ao grupo placebo.16 Entretanto, um novo estudo de vida real realizado na Argentina, denominado, Estudo BERNI, trouxe dados de efetividade e segurança.17 Segundo o estudo, a efetividade da vacina em lactentes de 0 a 3 meses para prevenção de hospitalização por doença do trato respiratório inferior (DTRI) causada pelo VSR foi de 72,7% (IC 95% 60,0-81,4), e em lactentes de 0 a 6 meses foi de 68,0% (IC 95% 56,2-76,6) . Para DTRI grave em lactentes de 0 a 6 meses a efetividade foi de 73,9% (IC 95% 53,2-85,4). E nesse estudo de vida real, não se confirmaram os relatos de prematuridade encontrados no estudo pivotal.17 Pelo fato de não haver diferenças significativas de eficácia a aplicação da vacina nas idades gestacionais de 24 semanas a menos de 28 semanas e, de 28 semanas a menos de 32 semanas no estudo pivotal da vacina,16 a CNE vacinas da Febrasgo, que já havia inserido a vacina VSR no protocolo da Vacinação da Gestante18, corrobora com as recomendações da SBIm,19 com as seguintes orientações:

  • Vacina VSR (Abrysvo®) Pfizer
  • Gestantes a partir de 18 anos de idade (ou a critério médico abaixo dessa idade)
  • Uma dose, intramuscular, a partir de 28 semanas de gestação e sem limite de idade gestacional.
  • Aplicada a qualquer momento, independente de sazonalidade.
  • Repetir em cada gestação.
  • Pode ser coadministrada com as outras vacinas de rotina da gestante.
  • Como a Vacina VSR (Abrysvo®) é licenciada pela ANVISA de 24 a 36 semanas de gestação, fica a critério médico a recomendação em idades gestacionais entre 24 e 27 semanas.

A vacina Abrysvo® (Pfizer) encontra-se disponível nas clínicas privadas de vacinação e está sendo avaliada pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunizações (CTAI) para definição das suas recomendações pelo Programa Nacional de Imunizações.
Levando em conta os benefícios demonstrados de forma consistente nos estudos e antecipando o grande impacto que esta intervenção tem de promover a saúde dos lactentes, a CNE Vacinas da Febrasgo, recomenda a vacina para todas as gestantes, idealmente no terceiro trimestre da gestação (a partir de 28 semanas de IG), independente do período sazonal.


Referências bibliográficas:

  1. Hall CB, Weinberg GA, Iwane MK, Blumkin AK, Edwards KM, Staat MA, et al. The burden of respiratory syncytial virus infection in Young children. N Engl J Med. 2009; 360:588-98
  2. Li Y, Wang X, Blau DM, Caballero MT, Feikin DR, Gill CJ, et al. Global, regional, and national disease burden estimates of acute lower respiratory infections due to respiratory syncytial virus in children younger than 5 years in 2019: a systematic analysis. Lancet. 2022;399(10340):2047–2064.
  3. Lively JY, Curns AT, Weinberg GA, Edwards KM, Staat MA, Prill MM, et al. Respiratory Syncytial Virus-Associated Outpatient Visits Among Children Younger Than 24 Months. J Pediatric Infect Dis Soc. 2019;8(3):284-286.
  4. McLaughlin JM, Khan F, Schmitt HJ, Agosti Y, Jodar L, Simões EAF, et al. Respiratory Syncytial Virus-Associated Hospitalization Rates among US Infants: A Systematic Review and Meta- Analysis. J Infect Dis. 2020;225(6):1100-1111.
  5. Srikantiah P, Vora P, Klugman KP. Assessing the full burden of respiratory syncytial virus in Young infants in low- and middle-income countries: the importance of community mortality studies. Clin Infect Dis. 2021;73:S177–79.
  6. Freitas AR, Donalisio MR. Respiratory syncytial virus seasonality in Brazil: implications for the immunisation policy for at-risk populations. Mem Inst Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2016;111(5): 294-301.
  7. Meissner C H. Viral Bronchiolitis in Children. N Engl J Med. 2016;374:62-72.
  8. Meissner HC, Hall CB. Respiratory syncytial virus. In: Cherry JD, Harrison GJ, Kaplan SL, Steinbach WJ, Hotez PJ (Ed) Feigin and Cherry’s textbook of pediatric infectious diseases. 7th ed. Philadelphia: Elsevier Saunders, 2014: 2407-34.
  9. Sáfadi MAP e Kfouri RA. Posicionamento conjunto – Sociedade Brasileira de Pediatria e Sociedade Brasileira de Imunizações Imunização passiva com Nirsevimabe para prevenção da doença pelo Vírus Sincicial Respiratório (VSR) em crianças. 18 de Janeiro de 2024.
  10. Mazur NI, Terstappen J, Baral R, Bardají A, Beutels P, Buchholz UJ, et al. Respiratory syncytial virus prevention within reach: the vaccine and monoclonal antibody landscape. Lancet Infect Dis. 2022 Aug 8:S1473- 3099(22)00291-2.
  11. Roteli-Martins CM, Ballalai IA, Kfouri RA, Fialho SC. FEBRASGO POSITION STATEMENT. Respiratory syncytial virus: impact of the disease and preventive strategies in pregnant women and older adults. Femina. 2024; 6:1-7.
  12. Mazur NI, Terstappen J, Baral R, Bardají A, Beutels P, Buchholz UJ, et al. Respiratory syncytial virus prevention within reach: the vaccine and monoclonal antibody landscape. Lancet Infect Dis. 2022 Aug 8:S1473- 3099(22)00291-2.
  13. Gov.br. Anvisa aprova medicamento para prevenção do vírus sincicial respiratório (VSR). Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/ptbr/assuntos/noticias-anvisa/2023/anvisa- aprova-medicamento-para-prevencaodo-virus- sincicial-respiratorio-vsr Acesso em 15/12/2023.
  14. Anvisa registra vacina para prevenção de bronquiolite em bebês. Disponível em https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2024/anvisa-registravacina-para-prevencao-de-bronquiolite-em-bebes. Acessado em 30 de maio de 2025.
  15. Impact-RSV study group. Palivizumab, a humanized RSV monoclonal antibody, reduces hospitalization from RSV infection in high-risk infants. Pediatrics. 1998;102(3):531-537.
  16. Kampmann B, Madhi SA, Munjal I, Simões EA, Pahud BA, Llapur C, et al. Bivalent prefusion Fvaccine in pregnancy to prevent RSV illness in infants. N Engl J Med. 2023;388(16):1451-64.doi:10.1056/NEJMoa2216480
  17. Gonzalo Pérez Marc GP, Vizzotti C, Fell DB, et al. Real-world effectiveness of RSVpreF vaccination during pregnancy against RSV-associated lower respiratory tract disease leading to hospitalisation in infants during the 2024 RSV season in Argentina (BERNI study): a multicentre, retrospective, test-negative, case–control study. Lancet Infect Dis. 2025. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(25)00156-2.
  18. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Calendário de vacinação da gestante. 3a ed. São Paulo: FEBRASGO; 2024. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, n. 24/Comissão Nacional Especializada em Vacinas).
  19. Calendário vacinal da gestante 2025. SBIm. Disponível em: chromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://sbim.org.br/images/calendarios/calend-sbim-gestante.pdf 2. Acessado em 30 de maio de 2025.


Presidente:
Susana Cristina Aidé Viviani Fialho
Vice-presidente:
Nilma Antas Neves
Secretaria:
Cecilia Maria Roteli Martins

Membros:
André Luis Ferreira Santos
Caroline de Oliveira Alves Martins
Fabiola ZoppasFridman
Giuliane Jesus Lajos
Isabella de Assis Martins Ballalai
Juarez Cunha
Julio Cesar Teixeira
Marcia Marly Winck Yamamoto De Medeiros
Maria Carolina Pessoa Valença Rygaard
Mônica Levi
Newton Carvalho
Renato de Ávila Kfouri
Valentino Antonio Magno

Mais conteúdos

RECOMENDAÇÕES DA VACINA VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO PARA ADULTAS E IDOSAS

RECOMENDAÇÕES DA VACINA VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO PARA ADULTAS E IDOSAS

Autoria: Membros da Comissão Nacional Especializada de Vacinas da ...
Recomendações da FEBRASGO sobre canetas para perda de peso e anticoncepcionais orais

Recomendações da FEBRASGO sobre canetas para perda de peso e anticoncepcionais orais

Medicamentos agonistas dos receptores de GLP-1(glucose-like peptídeo 1) desenvolvidos ...
Luto materno: como oferecer apoio adequado após a perda de um bebê

Luto materno: como oferecer apoio adequado após a perda de um bebê

Especialista da FEBRASGO explica como identificar sinais de sofrimento psí...
-->

© Copyright 2025 - Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Todos os direitos são reservados.

Políticas de Privacidade e Termos De Uso.

Aceitar e continuar no site