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A hiperprolactinemia no consultório do ginecologista: como e quando o tratamento medicamentoso é indicado?

Sexta, 16 Fevereiro 2018 16:15

Quando o ginecologista deve suspeitar de hiperprolactinemia?

        Queixas clinicas como irregularidade menstrual, galactorreia e infertilidade são os sintomas que indicam a suspeita clínica de hiperprolactinemia.

      
Sabe-se que há uma relação positiva entre os níveis de prolactina e o grau de inibição do eixo hipotálamo-hipófise ovariano. A irregularidade menstrual dependente desta interferência, podendo haver ciclos levemente encurtados (insuficiência lútea), ciclos longos ou amenorréia. Há casos até de amenorréia primária. O bloqueio do eixo causa hipogonadismo hipogonadotrófico, com hipoestrogenismo e manifestações como secura vaginal, dispareunia, disfunção sexual e até redução da densidade mineral óssea. O distúrbio ovulatório causa infertilidade. A galactorréia não é um sinal específico, podendo estar presente em indivíduos normoprolactinêmicos, ou estar ausente na presença de níveis elevados de prolactina (1).

Devo investigar quais causas de hiperprolactinemia?

        Os prolactinomas são a principal causa de hiperprolactinemia patológica. São denominados microprolactinomas quando menores que 1 centímetro e macroprolactinomas quando tem 1 ou mais centímetros. Outros tumores da região hipotalâmico-hipofisária podem cursar com hiperprolactinemia, seja por produção aumentada da PRL (adenomas hipofisários mistos produtores de PRL e GH ou de PRL e ACTH), seja por comprometimento da haste hipotálamo-hipofisária (adenomas hipofisários clinicamente não-funcionantes e craniofaringiomas). Nesta última situação, são chamados de pseudoprolactinomas, já que não secretam PRL, mas interferem com o aporte de dopamina do hipotálamo para a hipófise. Lesões infiltrativas, vasculares, pós-radioterapia e sela vazia também podem causar hiperprolactinemia.

Uma causa cada vez mais frequente é a hiperprolactinemia secundária a alguns medicamentos da classe dos neurolépticos, antidepressivos tricíclicos, inibidores da monoaminoxidase, alguns anti-hipertensivos, medicamentos de ação gastrointestinal e alguns inibidores seletivos da recaptação da serotonina. É preciso lembrar ainda das drogas ilícitas (heroína, cocaína, anfetamina, morfina) (2,3).

Cerca de 40% dos pacientes com hipotireoidismo primário também apresentam hiperprolactinemia e 30% dos casos de síndrome dos ovários policísticos (SOP). Também é comum na cirrose hepática ou insuficiência renal.

        A denominação hiperprolactinemia idiopática é reservada quando não há causa óbvia. Trata-se, provavelmente, de microadenoma com diâmetro pequeno e não visualizado (3).

        Citada mas nem sempre evidenciada, a hiperprolactinemia neurogênica ocorre por elevação reflexa da PRL devido a lesões irritativas da parede torácica (herpes zoster, toracotomia, queimadura, mastectomia) e por patologias do cordão medular. Excepcionalmente, há produção ectópica de PRL em gonadoblastoma, teratoma ovariano, carcinoma broncogênico e hipernefroma. Apenas para lembrar, a hiperprolactinemia é fisiológica na gravidez e amamentação, em situações de estresse, exercício e sono (4).

Então, se a paciente tiver queixa de ciclos longos ou amenorréia e galactorréia, associada ou não a infertilidade, devo investigar hiperprolactinemia? Como faço este diagnóstico?

        Sim, nestas situações deve-se solicitar dosagem de prolactina.  Para os ensaios mais utilizados, os níveis normais geralmente são inferiores a 25 ng/ml. Na maioria das vezes, uma única medida é adequada para diagnóstico, mas resultado pouco elevado (20-60 ng/ml) deve ser confirmado, especialmente quando não há correlação com a clínica. A dosagem de TSH deve ser solicitada para investigar hipotireoidismo. Proceder avaliação clínica e, se necessária, laboratorial, para diagnóstico de SOP, insuficiência hepática e renal.

Paciente com dosagens elevadas de prolactina, porém com ciclos regulares, sem galactorréia e sem nenhum outro sinal ou sintoma associado. O que fazer?

        O exame de sangue deve ser repetido e deve ser solicitada pesquisa de macroprolactina. Macroprolactina é uma isoforma de alto peso molecular da prolactina que pode interferir na dosagem desse hormônio. Constitui menos de 5% da prolactina circulante e tem baixa (ou nenhuma) atividade biológica, podendo confundir a investigação. Assim, se a proporção de macroprolactina for elevada, pode-se identificar altas concentrações de prolactina, sem que isso tenha significado clínico (5,6). 

Quando devo investigar a presença de macroprolactina?

        A macroprolactina deve ser investigada nas seguintes situações: casos de hiperprolactinemia em mulheres assintomáticas e naquelas com hiperprolactinemia em investigação para SOP. Com altas concentrações de prolactina sérica, mas a paciente não apresenta sintomatologia, desconfie de macroprolactina. Na segunda situação, hiperprolactinemia e investigação para SOP, tanto hiperprolactinemia como SOP apresentam irregularidades menstruais. A macroprolactina auxilia no diagnóstico (1,7).

Como devo pesquisar macroprolactina?

        A pesquisa de macroprolactina se faz por precipitação com polietilenoglicol (PEG) ou por cromatografia em gel. A primeira deve ser o método de rastreamento. A adição do polímero PEG precipita as moléculas de macroprolactina e o sobrenadante é quantificado e representa a prolactina verdadeira (8). A cromatografia é utilizada se a precipitação por PEG deixar dúvidas.

Devo tratar macroprolactinemia?

        A princípio, a presença de macroprolactinemia não tem necessidade de tratamento, sendo considerada um viés laboratorial.

Se a pesquisa de macroprolactina for negativa e a paciente tiver hiperprolactinemia verdadeira e sintomas, qual o próximo passo?

        Deve-se, então, afastar causas medicamentosas, patológicas ou fisiológicas. Após isso, deve-se proceder à investigação por técnicas de imagem, sendo de eleição a Ressonância Magnética (RM) de Hipófise.  A tomografia computadorizada (TC) é menos efetiva para a identificação de tumores, principalmente dos microprolactinomas, sendo indicada na impossibilidade ou contraindicação da RM (9).  Correlacionar dados clínicos, laboratoriais e de imagem antes de iniciar tratamento.

Como devo tratar a hiperprolactinemia por adenoma produtor de prolactina?

        Geralmente os prolactinomas respondem bem a tratamento farmacológico. São objetivos do tratamento: redução dos níveis de prolactina, correção dos sintomas, restabelecimento da função gonadal, do hipoestrogenismo e da fertilidade, redução do volume tumoral e de efeitos compressivos. O tratamento utiliza agonistas dopaminérgicos, sendo disponíveis em nosso país a cabergolina e a bromocriptina. A droga de escolha é a cabergolina, com forte efeito inibitório sobre a secreção de prolactina e menos efeitos colaterais, além de ter duração prolongada permitindo doses uma a duas vezes por semana (1, 10).

      Como sugestão, iniciar tratamento com cabergolina com um comprimido de 0,5 mg uma vez por semana ou dividir em duas tomadas semanais (meio comprimido). Acertar dose com novas dosagens de prolactina, aumentando meio comprimido semanal enquanto houver sintomas e os níveis se mantiverem elevados. O exame de imagem deve ser repetido geralmente em 12 a 24 meses; repetição com maior frequência apenas em situações específicas.

Se o diagnóstico em uma mulher sintomática for hiperprolactinemia idiopática, como devo tratar?

        O tratamento é através de agonistas dopaminérgicos, da mesma forma que nos prolactinomas.

Como acompanhar o tratamento medicamentoso da hiperprolactinemia?

        Sugere-se:

 

  1. Medir níveis de prolactina um a dois meses após início do tratamento
  2. Adequar gradativamente a dose do agente dopaminérgico, guiada pela clínica e dosagem de prolactina, até reversão da sintomatologia e do hipogonadismo
  3. Repetir RM dependendo da causa e da necessidade clínica, mais frequentemente nos macroadenomas. Campo visual em macroadenomas com risco de compressão do quiasma óptico ou com perda de campo visual.
  4. Avaliar perda óssea na amenorréia hipoestrogênica prolongada.
Como proceder se a hiperprolactinemia é por uso de medicamentos?

 

        O ideal seria dosar prolactina antes de iniciar o medicamento e 3 meses após. Níveis que se elevam após iniciar a medicação sugerem tranquilidade quanto à causa, priorizando a troca da medicação, quando possível, por medicamento sem este efeito. Não sendo possível, está indicado usar ciclo substitutivo com estrogênio e progestagênio para repor esteroides sexuais e minimizar efeitos do hipoestrogenismo. Em mulheres com prolactina elevada sem avaliação anterior, é preciso afastar causa tumoral.

E quando há aumento de prolactina e de TSH?

        É provável que a hiperprolactinemia seja secundária ao hipotireoidismo, quando a elevação do hormônio liberador da tireotrofina (TRH), que estimula a secreção do TSH, também estimula a prolactina. Deve-se tratar o hipotireoidismo e reavaliar a prolactina quando normalizado, uma vez que os níveis de prolactina tendem a se normalizar.

Autores:

Cristina Laguna Benetti Pinto

Daniela Angerame Yela

Gustavo A. R. Maciel

Referências

  1. Melmed S, Casanueva FF, Hoffman AR, Kleinberg DL, Montori VM, Schlechte JA, Wass JA. Endocrine Society. Diagnosis and treatment of hyperprolactinemia: an Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin Endocrinol Metab.2011;96(2):273-88.

  2. Molitch ME. Drugs and Prolactin. Pituitary 2008; 11(2): 209-18.

  3. Casanueva FF, Molitch ME, Schlechte JA, Abs R, Bonert V, Bronstein MD, et al. Guidelines of the Pituitary Society for the diagnosis and management of prolactinomas. Clin Endocrinol (Oxf). 2006;65(2):265-73

  4. Molitch ME. Disorders of prolactin secretion. Endocrinol Metab Clin 2001;30:585-610

  5. Samson SL, Hamrahian AH, Ezzat S; AACE Neuroendocrine and Pituitary Scientific Committee. American College of Endocrinology (ACE). American Association of Clinical Endocrinologists, American College of Endocrinology disease state clinical review: clinical relevance of macroprolactin in the absence or presence of true hyperprolactinemia. Endocr Pract. 2015 Dec;21(12):1427-35.

  6. Bronstein MD. Editorial: is macroprolactinemia just a diagnostic pitfall? Endocrine. 2012;41(2):169-70.

  7. Hayashida SA, Marcondes JA, Soares JM Jr, Rocha MP, Barcellos CR, Kobayashi NK, Baracat EC, Maciel GA. Evaluation of macroprolactinemia in 259 women under investigation for polycystic ovary syndrome. Clin Endocrinol (Oxf). 2014;80(4):616-8.

  8. Vieira JG, Tachibana TT, Ferrer CM, Sá Jd, Biscolla RP, Hoff AO, Kanashiro I. Hyperprolactinemia: new assay more specific for the monomeric form does not eliminate screening for macroprolactin with polyethylene glycol precipitation. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2010;54(9):856-7.

  9. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Hiperprolactinemia; Portaria SAS/MS nº 1160, de 18 de novembro de 2015.

  10. Webster J,Piscitelli G,Polli AFerrari CIIsmail IScanlon MF. A comparison of cabergoline and bromocriptine in the treatment of hyperprolactinemic amenorrhea. Cabergoline Comparative Study Group. N Engl J Med 1994; 331:904-9.


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