Maio Laranja: violência sexual contra crianças e adolescentes exige resposta urgente e multidisciplinar
18 de maio é o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes
A violência contra crianças e adolescentes é uma das mais graves violações dos direitos humanos e da saúde pública – conforme reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Trata-se de um fenômeno complexo, que ultrapassa aspectos sociais, exigindo uma ação conjunta do Estado, das famílias e da sociedade civil.
De acordo com o Ministério da Saúde (2015), a violência sexual é a infração dos direitos sexuais no sentido de abusar ou explorar o corpo e a sexualidade de crianças e adolescentes. Está dividido em duas categorias: abuso sexual e exploração sexual.
O abuso sexual refere-se à prática de atos sexuais por um adulto ou alguém com mais idade, com o intuito de obter satisfação sexual, como ou sem contato físico, com ou sem uso da força – a partir da confiança que se estabelece com a vítima. Pode incluir desde palavras obscenas, beijos forçados, carícias nas partes íntimas ou outras formas de contato físico com intenções sexuais.
Já a exploração sexual consiste na utilização de crianças ou adolescentes para fins sexuais, mediante pagamento ou troca de favores – sendo caracterizada por práticas como prostituição infantil, pornografia, tráfico de pessoas e turismo sexual. Neste caso, a vítima é duplamente agredida: pela exploração do corpo e pela prática de abuso sexual.
Para Dr. Olímpio Barbosa de Moraes Filho, médico ginecologista e Vice Presidente da Região Nordeste da FEBRASGO, “O mais triste de quando se trata de criança e adolescente é que, em torno de 70 a 80% do casos, são praticados por familiares ou por pessoas que deveriam protegê-las”.
Vale ressaltar que a violência sexual não exige contato físico para ser configurada. A exposição a conteúdos pornográficos, aliciamento on-line ou qualquer tipo de contato obsceno, entre outras ações, podem configurar violência sexual e gerar impactos no desenvolvimento físico, emocional e psicológico das vítimas.
Dados de violência sexual na Bahia e Pernambuco
Os números mais recentes reforçam a urgência de tratar o tema. De acordo com a Associação de Obstetrícia e Ginecologia da Bahia (SOGIBA), somente em 2023, foram notificados 5.024 casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes. A maioria das vítimas é do sexo feminino, com idades entre 10 e 14 anos, e, em cerca de 68% dos casos, o abuso ocorreu no ambiente familiar – tendo como agressores pessoas próximas como pais, padrastos, tios e avôs.
Em Pernambuco o cenário não é diferente. Conforme dados fornecidos pela Associação dos Ginecologistas e Obstetras de Pernambuco (SOGOPE), somente no primeiro trimestre de 2024, foram registrados 1.716 casos – o levantamento foi realizado pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e compilados pela Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE). Crianças entre 5 e 14 anos somam grande parte das vítimas, sendo que 87,6% são meninas. A pesquisa também aponta que a maioria dos casos ocorrem na própria casa.
O perfil dos abusadores também chama a atenção: em 22,6% dos casos, os agressores são amigos ou conhecidos das vítimas – pais e padrastos aparecem em 21,8% dos registros. A violência sexual, muitas vezes, silenciosa e prolongada, caracterizando um ciclo de medo e culpa por parte de quem sofreu a agressão.
Outro dado alarmante é a condição racial: 77,8% das vítimas, em Pernambuco, são negras (68% pardas e 9,70% pretas) – fato que evidencia como as desigualdades estruturais podem impactar a vulnerabilidade de meninas e meninos negros.
Atenção humanizada
Para romper o ciclo da violência, é fundamental um atendimento humanizado e multidisciplinar. A Norma Técnica do Ministério da Saúde orienta que o acolhimento seja feito por equipes formadas por profissionais capacitados - psicólogos, assistentes sociais, médicos e enfermeiros - com escuta qualificada, privacidade e empatia.
É essencial que as unidades de saúde disponham de protocolos bem definidos, ambiente protegido, prontuário único e articulação com os serviços de proteção social, educação e justiça. A abordagem deve garantir o suporte necessário à recuperação física e emocional das vítimas.
Prevenção, denúncia e responsabilidade coletiva
Além do atendimento às vítimas, a prevenção é um dos pilares mais importantes no enfrentamento à violência sexual. Campanhas educativas, formação de profissionais da saúde e da educação, acompanhamento de crianças em situação de vulnerabilidade e promoção de ambientes seguros nas escolas e comunidades são estratégias indispensáveis.
A notificação de casos é obrigatória por todos os profissionais de saúde, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) e a Lei nº 10.778/2003. A Portaria GM/MS nº 1.271, de 2014, garante que esses casos sejam tratados com prioridade absoluta.
Compromisso com a infância
A violência sexual contra crianças e adolescentes demanda uma resposta firme e contínua da sociedade. A responsabilização dos agressores, o rompimento do silêncio e a promoção de ambientes são indispensáveis. É dever de todos – familiares, escola, profissionais e gestores públicos. O compromisso visa garantir direitos fundamentais aos menores – bem como o desenvolvimento pleno e à proteção contra todas as formas de abuso.