62° CBGO 2025: Fórum fomenta a reflexão sobre a mortalidade materna no Brasil
Durante o Congresso Brasileiro de Ginecologia e Obstetrícia (CBGO 2025), aconteceu o Fórum Mortalidade Materna no Brasil. A atividade fomentou a reflexão e o debate sobre temas essenciais relacionados aos cuidados com as mulheres. Foram três palestras que buscaram chamar atenção para a situação da mortalidade materna em geral, a de mulheres negras e de adolescentes menores de 14 anos.
Um dos pontos principais da discussão foi a importância de promover a prevenção, o suporte e ações voltadas para reduzir a mortalidade de mulheres de classes, raças e idades distintas.
O Fórum foi a oportunidade de conhecer a realidade do Brasil sobre a questão, analisar os dados e as metas de mortalidade, o papel da atenção básica e o enfrentamento do estupro de vulnerável, além de discutir o racismo estrutural e institucional que muitas mulheres podem sofrer.
A atividade foi coordenada pela Dra. Rossana Pulcineli Vieira Francisco, obstetra presidente da CNE de Mortalidade Materna e membro do Núcleo Feminino da FEBRASGO, que reforçou ser fundamental todos assumirem o seu papel. “Precisamos estimular a reflexão para que todos compreendam que só com políticas públicas poderemos mudar a realidade dessas mulheres.”
A situação da mortalidade materna no Brasil e as metas do desenvolvimento sustentável
A Dra. Maria do Carmo Leal, obstetra membro da CNE de Mortalidade Materna, foi a responsável por apresentar o tema. Ela iniciou a palestra reforçando a importância dos ODSs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) e destacou que a meta, segundo os ODSs, é a redução da taxa de mortalidade materna global para menos de 70 mortes por 100.000 nascidos vivos, até 2030.
A especialista explicou que, de forma geral, essa meta foi atingida em 2022, depois de um período complicado com o aumento do indicador devido aos anos de pandemia, o que foi mostrado em reunião promovida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2023. No encontro, foram analisados os dados dos anos de 2016 a 2022.
Mas, ainda é preciso mais ações e estratégias para que os números não voltem a subir e que as novas metas possam ser alcançadas. “Neste encontro de avaliação, estabeleceu-se que, no Brasil, até 2030, a meta nacional é reduzir a razão de mortalidade materna (RMM) para, no máximo, 30 mortes por 100 mil nascidos vivos.”
Dentre algumas das iniciativas governamentais para o alcance das metas estão: assegurar, no mínimo, sete consultas pré-natal a todas as gestantes; aumentar o orçamento para a atenção básica e serviços de saúde obstétrica; fortalecer os programas de tratamento e diagnóstico precoce e ações de promoção de saúde, principalmente, na atenção primária; assegurar e ampliar a cobertura vacinal, fortalecendo o Programa Nacional de Imunizações (PNI); desmistificar as fake news sobre as vacinas; reconstruir a Rede Cegonha; fortalecer o ESF (Estratégia de Saúde da Família); e o Programa Mais Médicos.
A mortalidade materna em mulheres negras: da morte de Alyne Pimentel aos dias atuais
Para Dra. Rossana Pulcineli Vieira Francisco, compreender os fatores que contribuem para a mortalidade materna é fundamental, principalmente em mulheres negras. A médica abordou a questão em sua palestra e apresentou o caso de Alyne Pimentel, jovem gestante negra que faleceu em 2002 por falta de atendimento adequado.
“Falar sobre o caso Alyne Pimental é muito importante, pois se tornou um marco internacional na luta contra o racismo obstétrico. Foi a primeira condenação do Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU) por morte materna evitável, em 2011”, destacou ela, lamentando que negligências como as que ocorreram com Alyne ainda possam ser vistas atualmente.
De acordo com os dados apresentados pela médica, o percentual de mortes maternas segundo a cor passou de 50% a 60%, de 2002 a 2011, e para 65% até 2024. Para ela, esses números refletem a falta de acesso a serviços de saúde qualificados, desigualdade socioeconômica e de acesso à educação e o silenciamento das dores das mulheres negras. Por isso, a especialista reforçou a necessidade de estimular a reflexão sobre o racismo estrutural e institucional na saúde.
“O caminho para reduzir a mortalidade materna nessas mulheres é lutar contra essas práticas discriminatórias nos serviços públicos de saúde e discutir políticas públicas eficazes.”
Mortalidade materna em adolescentes menores de 14 anos e o enfrentamento do estupro de vulnerável
A gravidez infantil é um marcador de vulnerabilidade. Foi o que enfatizou a Dra. Ida Perea Monteiro, obstetra membro da CNE de Mortalidade Materna, na palestra que encerrou os debates do Fórum de Mortalidade Materna. Durante a aula foram apresentados dados atualizados sobre gestação em menores de 14 anos, comparando com as faixas etárias mais avançadas.
A Dra. Ida destacou ainda a importância de compreender as questões legais que envolvem o estupro de vulnerável e a responsabilidade dos profissionais de saúde na notificação, proteção e encaminhamento. “É preciso deixar claro que relações com menores de 14 anos configura como estupro de vulnerável, independentemente se for consensual.”
Outro ponto reforçado por ela é a discussão sobre o aborto legal, garantido por lei para essas meninas, os fluxos previstos na legislação e os principais obstáculos enfrentados por essas jovens, vítimas de violência sexual, e suas famílias. “É dever ético e legal dos profissionais atuarem na proteção de meninas, informar sobre os direitos à proteção e à interrupção da gravidez respeitando sua autonomia e integridade.”
A médica enfatizou que a gravidez nessa faixa etária é sempre resultado de estupro com risco aumentado de morte materna, além de ser um fracasso coletivo das políticas públicas. “É sempre importante reforçar que menina não é mãe e a mortalidade materna em menores de 14 anos é uma tragédia que exige resposta imediata”, completou Dra. Ida.