COSMIATRIA GENITAL

Terça, 24 Abril 2018 13:15

        Na atualidade temos acompanhado crescimento na oferta de cirurgias estéticas ginecológicas com a promessa de promover melhora da aparência e tornar a vida sexual da mulher mais prazerosa. Os termos utilizados para essa prática são “embelezamento íntimo, estética genital, estética vaginal, cirurgia íntima, bioplastia íntima, cirurgia estética genital, medicina estética e ginecologia, ginecologia estética, estética íntima, plástica da intimidade, cirurgia da intimidade, cirurgia cosmética vaginal, etc”.

        As propagandas para atrair as mulheres, os padrões oferecidos prometem uma genitália com aspecto muito jovem, quase infantil, além da promessa da perfeição sexual que estes procedimentos possam levar. Padrão de beleza da genitália não está estabelecido e é muito variável, dependente de uma série de fatores, culturas, religião, sexo, moda, assim como a resposta sexual feminina, que depende de fatores biológicos, psíquicos, culturais, relacionais, hormonais, etc. Desta forma, prometer a “perfeição” para beleza genital, e garantir que isto vai melhorar a vida sexual é uma farsa.

        Vários procedimentos estéticos tem sido ofertados: botox, preenchimento, clareamento, lipoaspiração, ninfoplastias, piercing, tatuagens. Alguns sem qualquer evidência científica de resultados positivos na saúde sexual o que infringe ética médica. Já outros, com comprovação científica de eficácia na melhora do trofismo vaginal, ou correção de assimetrias, porém utilizados com propagandas enganosas, e não aplicados por médico ginecologista. Pesquisadores ingleses alertam que o “rejuvenescimento vaginal” tem sido oferecido por cirurgiões, muitas vezes, impulsionados pela demanda de pacientes para melhora da estética vulvovaginal ou para o tratamento de disfunção sexual delas ou de seus parceiros, mas sem evidencia científica. Ressaltam ainda, que esta demanda não pode justificar o procedimento e nem o marketing em torno dele, e que a oferta desta prática tão pouco estudada, é antiética (Singh, Swift et al. 2015). Ademais, não há padronização da técnica cirúrgica, e muito pouco se sabe sobre taxas de complicações, parâmetros de sucesso do procedimento, ou definições de um resultado cirúrgico bem sucedido.

        O American College of Obstetricians and Gynecologiste (ACOG) recomenda que sejam consideradas as seguintes condições para a indicação e/ou realização da cirurgia íntima: i) a hipertrofia ou assimetria dos pequenos lábios percebida pela mulher e que causa desconforto com atividades esportivas ou uso de roupas, e dor ou aprisionamento intravaginal dos pequenos lábios durante a penetração vaginal, ii) alterações genitais devidas à gravidez ou a lesão obstétrica que afetam a aparência da genitália ou que interferem na sensação prazerosa ao coito, iii) frouxidão vaginal pós-parto que interfere na satisfação sexual da mulher (Goodman, Placik et al. 2010)

        Sobre as técnicas de laser e eletrocirurgia há estudos que mostram o estímulo de proliferação da mucosa, consequentemente aumentam o número de células que contém glicogênio, o que torna o pH vaginal ácido, restaurando a flora vaginal, aumentando a lubrificação e a vascularização da vagina,  e auxílio na proliferação de novo colágeno; pode trazer maior conforto na relação sexual, porém não há como afirmar que irá restaurar o prazer sexual, visto que o desejo sexual e orgasmo em uma relação sexual derivam da intimidade entre os parceiros, da ação de hormônios e neurotransmissores, e de fatores psíquicos  e não apenas, do orgão copulador.

        Estes procedimentos teriam indicação na mulher em carência hormonal, ou seja, na menopausa, onde a falta estrogênica propicia o quadro chamado síndrome genito-urinária, que cursa com sintomas de secura vaginal, dor à relação sexual, desconforto urinário, tudo isto devido a atrofia da mucosa vaginal. Na mulher, durante o menacme, não há recomendação para a técnica, ao contrário do que tem sido utilizado e propagado, como indicação para àquelas a partir de 35 anos. Nestas, NÃO HÁ alteração da anatomia ou da fisiologia. Ocorre uma melhora parcial do tônus, do colágeno e proliferação da mucosa, porém mudança da anatomia, só com cirurgia, o que não é o caso. Esta tecnologia é nova e promissora, porém os resultados ainda são observacionais, e estudos de longo prazo são necessários. Países como a Itália, que tem ampla experiência com a técnica, validou o uso do laser fracionado para tratamento da atrofia vaginal, e estudos tem mostrado respostas positivas e sem efeitos colaterais a curto prazo.

 

        Como especialistas da área da ginecologia e cirurgia a laser, necessitamos alertar a população que modismos e promessas de rejuvenescer a vagina, podem ser enganosas, e não isentos de complicações caso não esteja indicado. Além da frustração que pode gerar, pois não haverá efeito no prazer sexual. Utilizar a técnica em mulheres jovens que ainda tem a produção dos hormônios sexuais, não passa de modismo sem qualquer fundamento científico.

Vale frisar que não somos contrários à técnica, o laser que é fantástico para uma série de afecções médicas, porém de forma ética e controlada, sem MODISMOS. Técnicas como estas citadas, se mal aplicadas podem produzir malefícios, e contribuir para que o laser caia no descrédito por mau uso.

Nós, FEBRASGO, como representantes da ginecologia e obstetrícia do nosso país, queremos estabelecer diretrizes para que estes atos devam ser aplicados por médicos especialistas da nossa área. Estas mulheres necessitam de uma avaliação ginecológica apurada, com rastreio de neoplasias, estabelecimento de condições hormonais, avaliação de queixas sexuais, exclusão de infecções secundárias, avaliação do estado urodinâmico, para ver a indicação real do método, condições estas que só podem ser estabelecidas por médico ginecologista.

 

  • Por Neila Maria de Góis Speck, CREMESP 61715, Ginecologista e Obstetra, qualificação em Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia, habilitação em cirurgia a laser, Presidente da Comissão Nacional Especializada do Trato Genital Inferior da FEBRASGO e Lucia Alves da Silva Lara Ginecologista e Obstetra, área de atuação em Sexualidade Humana, Presidente da Comissão Nacional Especializada de Sexologia

 
        Fonte consultada:

        Goodman, M. P., O. J. Placik, R. H. Benson, 3rd, J. R. Miklos, R. D. Moore, R. A. Jason, D. L. Matlock, A. F. Simopoulos, B. H. Stern, R. A. Stanton, S. E. Kolb and F. Gonzalez (2010). "A large multicenter outcome study of female genital plastic surgery." J Sex Med 7(4 Pt 1): 1565-1577.

        Singh, A., S. Swift, V. Khullar and G. A. Digesu (2015). "Laser vaginal rejuvenation: not ready for prime time." Int Urogynecol J 26(2): 163-164.

        Cruz,V.L., et al

        Randomized, double-blind, placebo-controlled clinical trial for evaluating the efficacy of fractional CO2 laser compared with topical estriol in the treatment of vaginal atrophy in postmenopausal women.. Menopause: The Journal of The North American Menopause Society Vol. 25, No. 1, 2017, pp. 000-000 DOI: 10.1097/GME.0000000000000955


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