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O Impacto da Obesidade sobre a Fertilidade Feminina

A obesidade e o sedentarismo representam problemas importantes para a saúde pública, devido ao aumento acelerado de suas prevalências e associação com efeitos adversos à saúde cardiovascular e metabólica em idades cada vez mais precoces1-3.

O número de pessoas obesas supera mais de um bilhão de indivíduos em todo o mundo4 e dados recentes do Ministério da Saúde (2013) demonstram que a obesidade acomete um em cada cinco brasileiros de 18 anos ou mais (20,8%), sendo que o percentual é mais alto entre as mulheres (24,4% contra 16,8% dos homens) 5.

Apesar de parte das mulheres obesas engravidarem espontaneamente, sabe-se que a obesidade em mulheres em idade reprodutiva interfere negativamente nas chances de gestação, contribuindo para o aumento dos casos de infertilidade. Mulheres obesas têm três vezes mais chances de sofrer de infertilidade anovulatória do que pacientes com IMC normal6, além de ser co-morbidade associada a menores taxas de sucesso em ciclos de reprodução assistida7. A associação da obesidade com infertilidade decorrente de anovulação já é bem conhecida, entretanto, ainda não se chegou a nenhuma conclusão definitiva sobre os mecanismos pelos quais a obesidade interfere na concepção. Essa breve revisão se propõe a descrever outros possíveis macanismos envolvidos na piora da fertilidade que possam estar associados a comprometimento de qualidade oocitária, embrionária ou endometrial. Eles envolvem, de uma forma geral, estado pró-inflamatório, lipotoxicidade, tecido adiposo e seus hormônios, além de estresse oxidativo.

O excesso de ácidos graxos livres pode levar a efeito tóxico em tecidos reprodutivos levando a dano celular e a um estado de inflamação crônica de baixo grau8 em fluido folicular com níveis elevados de insulina, triglicérides e marcadores inflamatórios, como lactato e proteína C-reativa (PCR)9, além de afetar o oócito e o embrião devido a disrupção do fuso meiótico e comprometimento da dinâmica mitocondrial.

Em se tratando de qualidade oocitária, sugere-se que um possível mecanismo seja a lipotoxicidade. Mulheres obesas têm níveis circulantes mais elevados de ácidos graxos livres que podem danificar células não adiposas pela elevação de espécies reativas de oxigênio que induzem estresse tanto em mitôndrias quanto em retículo endoplasmático, levando à apoptose e anormalidades na morfologia do complexo cumulus oophorus10,11.

Além disso, a lipotoxicidade também exerce papel importante no desenvolvimento de resistência à insulina e aumento do estado pró-inflamatório12, observado pelos níveis mais elevados de proteína C reativa, marcador sistêmico de inflamação13, e de várias adipoquinas pró-inflamatórias, como a leptina, fator de necrose tumoral α (TNF- α) e interleucinas (IL-6)14. Não obstante, apresentam níveis circulantes reduzidos de uma importante adipoquina anti-inflamatória chamada adiponectina.

Níveis mais elevados de leptina em mulheres obesas se correlacionam com níveis mais elevados dessa substância também em fluido folicular15, e estudos in vitro sugerem que a leptina pode afetar vias esteroidogênicas nas células da granulosa, levando a um decréscimo na produção de estrogênio e de progesterona de forma dose-dependente16-19. Esse efeito da obesidade sobre o oócito pode gerar um efeito em cascata sobre a receptividade endometrial e implantação embrionária.

O embrião pré implantação também parece ser afetado por ambientes específicos da obesidade8. Embriões de ratos confinados com obesidade induzida por dieta apresentam menor expressão de receptor de IGF-1, afetando negativamente a sensibilidade à insulina e o transporte de glicose20. Outro estudo com mulheres com sobrepeso observou que seus embriões apresentavam menor tendência de se desenvolver após a fertilização, atingiam o estágio de mórula mais rapidamente, chegavam ao estágio de blastocisto com menos células no trofectoderma e apresentavam menor consumo de glicose e aumento nos níveis de triglicérides21. Os embriões podem também ser susceptíves a lipotoxicidade, como discutido previamente para os oócitos. Em mulheres submetidas à FIV, níveis elevados de ácido α-linoleico estavam associados a redução nas taxas de gravidez22, enquanto que o aumento da relação ácido linoleico ∕ ácido  α-linoleico se correlaciona com melhora nas taxas de gestação na mesma população23. Como abordado acima, níveis alterados de adipoquinas, como a leptina podem afetar a esteroidogênese e afetar diretamente o desenvolvimento do embrião. O nível de leptina tem efeito estimulante sobre o crescimento de células tronco-trofoblásticas humanas in vitro e sua inibição diminui a proliferação e aumenta drasticamente a apoptose24. Níveis persistentemente elevados de leptina poderiam reduzir a sensibilidade do trofoblasto aos seus efeitos.

Quanto ao endométrio, observa-se evidência de comprometimento de decidualização do estroma em mulheres obesas, o que explicaria a subfecundidade decorrente de comprometimento de receptividade endometrial15,25. Tal situação poderia estar envolvida em anormalidades placentárias manifestadas por maiores taxas de aborto, parto prematuro e pré-eclâmpsia na população obesa. A leptina também parece afetar o endométrio, devido a um possível papel regulatório na remodelação do epitélio endometrial humano, estimulando vias de proliferação e apoptose celular in vitro25. Além disso, parece modular a receptividade endometrial, como evidenciado através de regulação positiva de marcadores de receptividade mediante exposição à leptina tanto em células estromais quanto epiteliais27. Dessa forma, uma desregulação crônica das vias de leptina na obesidade pode afetar negativamente a implantação8.

Observamos que os mecanismos propostos para a infertilidade associada à obesidade são diversos e vão muito além da questão anovulatória. Muitas intervenções têm sido propostas no tratamento da obesidade ligada à infertilidade, como perda de peso, atividade física, dietas e cirurgia bariátrica. A compreensão desses possíveis mecanismos associados poderá nos guiar na proposição de novas estatégias de tratamento.

 

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Drogas Ilícitas durante a gravidez

O uso de drogas ilícitas aumentou em vários países do mundo, bem como no Brasil.1,2,3 Nos Estados unidos, 5% das gestantes relataram ter usado droga ilícita, sendo o uso da canabis  o mais comum, seguido da cocaína.4 O uso de álcool e drogas por mulheres grávidas pode resultar em significativa morbidade e mortalidade materna, fetal e neonatal. Em geral, as mulheres grávidas drogaditas são menos propensas a procurar cuidado pré-natal e têm taxas mais elevadas de HIV, hepatite e outras infecções sexualmente transmissíveis.4,5 A pesquisa para o uso de drogas deve fazer parte do cuidado obstétrico.6 A estratégia pesquisar, rápida intervenção e encaminhamento para tratamento é a abordagem ideal7.

Os principais CID 10 são: F14(transtornos devidos ao uso da cocaína,  F19(transtornos devidos ao uso de múltiplas drogas e outras substâncias psicoativas), T40.0(ópio), Z71.5 (aconselhamento e supervisão para abuso de drogas).

CANABIS

O princípio ativo da maconha é o delta-9-tetrahidrocanabinol, substância que atravessa com facilidade a barreira placentária.8,910 A utilização de canabis pelas mães leva a uma redução significativa, tanto no início como na duração da amamentação11.Em relação aos resultados do uso da maconha sobre o feto, há dificuldade para sua identificação precisa, pois há uma alta prevalência de pacientes que a usam concomitantemente a outras drogas, incluindo álcool e cigarro8. Foi verificado o aumento do risco de diversas malformações em mulheres que fizeram uso de maconha durante o pré-natal12. Entretanto esta foi uma casuística pequena e houve o uso concomitante frequente de cocaína e metanfetamina. Outros autores não relatam aumento das malformações em fetos expostos a canabis8. O resultado mais comum ligado à exposição à canabis no útero é a diminuição do peso ao nascer13. Em relação aos efeitos tardios para as crianças, foram relatados transtornos cognitivos e emocionais.14,15,16

COCAÍNA

A cocaína se consome mais frequentemente em sua forma solúvel (cloridrato de cocaína) ou em sua forma alcaloide, que em seu estado sólido, é conhecido como crack. O consumo conjunto de cocaína e álcool dão lugar a um metabólito, o cocaetileno. Este prolonga a sensação de euforia, produz maior depressão miocárdica e aumenta a vida média em 2,5 vezes em relação ao uso somente da cocaína.1,17 O uso de cocaína na gravidez está associado a convulsões, ruptura prematura das membranas e descolamento prematuro da placenta18. Pode levar ainda a pré-eclâmpsia grave, aborto espontâneo, parto prematuro e complicações no parto19. Estas gestantes devem receber cuidados médicos e psicológicos adequados, incluindo o tratamento de dependência, para reduzir esses riscos17. Os fetos expostos ao uso da cocaína durante a gravidez são frequentemente prematuros, têm baixo peso ao nascer, circunferência cefálica menor e menor estatura quando comparados a recém-nascidos não expostos.17,20

ESTIMULANTES

As anfetaminas causam euforia, aumento de energia e supressão do apetite.21 No entanto, a exposição a anfetamina durante os períodos do pós-parto precoce e tardio interrompem a interação mãe-bebê e encurta a duração da amamentação.22

“Ecstasy” (MDMA)

O que habitualmente se conhece com o nome de “ecstasy” é um derivado da molécula de anfetamina1. A exposição à metanfetamina durante a gravidez foi associada à morbidade e mortalidade materna e neonatal: aumento de duas a quatro vezes no risco de restrição do crescimento fetal21, 23 , pré-eclâmpsia, descolamento prematuro da placenta, parto prematuro, morte fetal, morte neonatal e morte infantil.24

OPIÁCEOS (Heroína)

Os tipos de opiáceos mais importantes são: morfina, codeína, meperidina, metadona, heroína e oxicodona1. O uso de opióides na gravidez aumentou drasticamente nos últimos anos, em paralelo com a epidemia observada na população em geral, levando a um aumento da mortalidade materna6. Os opiáceos, como a heroína, raramente causam anomalias congênitas25, mas como atravessam a barreira placentária podem levar à síndrome da abstinência fetal, cujos sintomas são: irritabilidade, choro excessivo, nervosismo, vômitos e diarreia26. Há uma maior incidência de parto prematuro em usuárias de opióides, principalmente quando associado ao uso concomitante de tabaco.27,28 Para mulheres grávidas usuárias de opiáceos, a farmacoterapia com agonistas opióides é a terapia recomendada.29,30

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS

O uso de drogas ilícitas ocorre em 5-8 % das gestantes. Todas as gestantes devem ser inquiridas do uso do álcool, tabaco e de drogas ilícitas e/ou com prescrição. A maconha é a droga mais utilizada, seguida da cocaína.  O abuso de substâncias na gravidez pode levar a uma série de efeitos deletérios sobre a interação mãe-bebê. Tais efeitos variam com base na droga, época de exposição e extensão de uso. A conscientização das mulheres das graves consequências do abuso de substâncias no período periconcepcional, na gestação e pós-parto deve fazer parte da assistência primária à saúde.


AUTORA: Dra Venina Isabel Poço Viana Leme de Barros

Títulos: Mestre e Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Membro da Comissão Nacional de Pré-natal da Febrasgo.

Médica Assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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Fístula Vesicovaginal

A fístula vesicovaginal é uma comunicação anormal entre a bexiga e a vagina levando a uma perda contínua de urina através do canal vaginal. Considerada como uma condição sem esperança nos primórdios da humanidade, somente em 1675, na Suíça, que Johann Fatio realizou o primeiro reparo bem sucedido de uma fístula vesicovaginal. Representa sem dúvida uma das condições de maior impacto na qualidade de vida da mulher, levando a grande insatisfação, limitação e revolta do ponto de vida socioemocional(1,7).

As fístulas uroginecológicas podem ser classificadas conforme a sua topografia em: vesicovaginais (72,2%), ureterovaginais (21,4%), uretrovaginais (5,6%) e vesicouterinas (0,8%)(2,4).  

 

ETIOLOGIA:

As fístulas vesicovaginais resultam principalmente de lesões obstétricas e lesões iatrogênicas decorrentes de cirurgias ginecológicas, principalmente aquelas que ocorrem durante a histerectomia abdominal, vaginal e/ou laparoscópica. A radioterapia e o câncer ginecológico avançado também são causas comuns de fístula vesicovaginal(4,10).

Estima-se que 1% das histerectomias por neoplasia e 0,1% por patologia benigna possam evoluir com algum tipo de fístula. Os principais fatores de risco são presença de cesárea prévia, radioterapia, infecção e endometriose(4). Apesar da subnotificação em nosso país, acredita-se que haja um número crescente de casos de fístulas decorrentes de cirurgias de endometriose profunda, em especial as fístulas ureterovaginais, devido a ampla dissecção e isquemia deste órgão.

As fístulas vesicovaginais originadas de causas obstétricas diminuíram muito nos últimos anos em decorrência do aperfeiçoamento dos métodos obstétricos, porém ainda são comuns nos países em desenvolvimento, principalmente na África e na Ásia(3,5).

Outras causas incomuns de fístulas vesicovaginais incluem, conização cervical, cálculo vesical, tuberculose, traumatismo com fratura dos ossos pélvicos, sinfisiotomia e uso prolongado de pessário(2)

 

DIAGNÓSTICO: 

A anamnese deve ser minuciosa, caracterizando o tipo de perda urinária, a história pregressa de cirurgias, paridade, radioterapia e traumatismos uroginecológicos, se existentes. No exame físico, deve-se tentar identificar o orifício fistuloso no canal vaginal, a presença de sinais de infecção local e a presença de corpo estranho intravaginal. No entanto, nem sempre é possível identificar o orifício fistuloso apenas através do exame físico, sendo que em alguns casos podemos utilizar o teste com infusão de azul de metileno intravesical, que além de confirmar o diagnóstico da fístula poderá nos auxiliar na topografia e trajeto da mesma(4,6).

A cistostocopia é um exame obrigatório, pois permite avaliar a integridade uretral, identificar a presença de corpo estranho (fios de suturas, telas, litíase vesical), localizar e caracterizar o orifício fistuloso e sua relação de proximidade com os meatos ureterais, permitindo assim uma programação mais adequada e segura do tratamento(2,3).

Outros métodos como tomografia de vias urinárias, urografia excretora, histerossalpingografia, cistografia, pielografia ascendente, ultrassonografia e ressonância magnética podem ser úteis no diagnóstico, principalmente quando não se consegue identificar orifício fistuloso(2,6).

 

TRATAMENTO: 

A reparação das fístulas vesicovaginais é quase sempre cirúrgica, uma vez que a abordagem conservadora falha na maioria dos casos. Porém, nas fístulas pequenas, não infectadas, bem vascularizadas e não irradiadas pode-se tentar a utilização prolongada de sonda de demora, associado ou não à fulguração do trajeto fistuloso com laser ou eletrocautério. O uso de estrogenioterapia também é útil para melhorar o trofismo vaginal(8,9).

O período ideal para realizar a abordagem cirúrgica das fístulas vesicovaginais depende basicamente das condições locais dos tecidos. Abordagem precoce tem sido preconizada pela maioria dos autores, pois diminui o trauma e o impacto socioemocional do paciente. Nas fístulas infectadas ou após radioterapia, indica-se intervenção tardia, pois é necessário a recuperação tecidual adequada(2,9).

O tratamento cirúrgico apresenta taxa de sucesso de 90% na primeira intervenção, quando realizado por cirurgiões experientes e habituados aos detalhes técnicos(4,6). A cirurgia consiste na individualização e exposição ampla da mucosa vaginal ao redor da fístula, de uma hemostasia rigorosa, da aproximação dos tecidos com pontos separados sem provocar isquemia, utilizando fios absorvíveis. A seguir, recomenda-se uma drenagem vesical pós-operatória por um período prolongado, 10 a 15 dias com manutenção de sonda. Se necessário, podemos realizar a interposição de tecidos (epiplon, gordura pré-retal, coxin vascular dos grandes lábios, dentre outros) entre o músculo detrusor e a mucosa vaginal(2,6,8).

A via de acesso pode ser abdominal transvesical, descrita pela primeira vez por Trendelenburg em 1890 ou transperitoneal descrita por Von Dittel em 1893. A via vaginal por sua vez foi descrita inicialmente por Latzko em 1914 sendo a preferida pela maioria dos ginecologistas(1). A escolha da via de acesso dependerá basicamente da experiência do cirurgião, do tamanho, da localização e da necessidade de outros procedimentos tais como reimplante ureteral. Contudo, a abordagem via vaginal associa-se à alta hospitalar mais precoce, menos dor no pós-operatório e uma morbidade menor se comparada à via abdominal.

 

CONCLUSÃO: 

A fístula vesicovaginal é uma condição incapacitante de grande impacto na qualidade de vida da mulher, por isso um diagnóstico e tratamento precoce deverão ser sempre preconizados. É necessário que se faça também um maior investimento, aprimoramento e capacitação dos cirurgiões ginecológicos, assim como a criação de programas e medidas preventivas de assistência ao parto

 

AUTOR:

Jânio Serafim de Sousa

Renata Bisinoto Maluf

 

INSTITUIÇÃO: Hospital de Base do Distrito Federal - HBDF

 

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  3. Toledo LGM, Santos VE, Maron PEG, Vedovato BC, Perez MDC. Fístula vesicovaginal continente. Einstein. 2013; 11(1):119-21.
  4. Almeida FG, Zambon JP. Urologia fundamental
  5. Abreu RD, Varregoso J, Vaz I, Gomes C. Fístula vesico-vaginais: uma visão sobre Moçambique. Rev Clin Hosp Prof Dr Fernando Fonseca. 2015; 3(2):27-32.
  6. Cardoso A, Soares R, Correia T, Reis F, Cerqueira M, Almeida M, Prisco R. Abordagem Terapêutica de fístula vesico-vaginal – análise retrospectiva e revisão temática. Acta Urológica. 2009; 26;1:19-25.
  7. Singha V, Jhanwar A, Mehrotra SB, Paul SC, Sinhaa RJ. A comparison of quality of life before and after successful repair of genitourinary fistula: Is there improvement across all the domains of. African Journal of Urology. 2015; 21,230–234.
  8. Zhang WY, Zhang XP, Sun YR, Wang HR, Xu KX. Comparison and discussion of diferente surgical methods used to treat vesicovaginal fistulas. Beijing da xue xue Bao Yi Xue Ban. 2017; 18:49(5) 889-892.
  9. Torloni MR, Riera R, Rogozinska E, Tunçlp O, Gulmezoglu AM, Widmer M. Systematica review of shorter versus longer duration of blandder catheterization after surgical repair of urinary obstetric fistula. Int J Gynecol Obstet. 2018; 1–8.
  10. Li F, Guo H, Qiu H, Liu S, Wang K, Yang C, Tang C, Zheng Q, Hou Y. Urological complications after radical hysterectomy with postoperative radiotherapy and radiotherapy alone for cervical câncer. Medicine Baltimore. 2018; 97(13).

 

 

Recomendações Febrasgo para temas controversos

Com o intuito de qualificar dia a dia a assistência ao parto, de assegurar ininterruptamente que o respeito à autonomia da mulher seja a tônica da relação médico-paciente, além de possibilitar o máximo de segurança aos especialistas na prática diária, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, lançou oficialmente no Congresso FIGO a série Posicionamento FEBRASGO.

São recomendações oficiais sobre temas controversos, conforme informa o diretor de Defesa e Valorização Profissional, Juvenal Barreto Borriello de Andrade. Em cinco manuais, cada um voltado a uma questão específica, há orientações completas sobre Cuidados Gerais na Assistência ao Parto, Disponibilidade e sobreaviso obstétrico, Local para o parto seguro; Defesa Profissional e Violência Obstétrica. Confira, a seguir, a íntegra da recomendação de Violência obstétrica e a de Disponibilidade/sobreaviso obstétrico. As demais seguirão em próxima news.

Violência Obstétrica

Relatora

Liduina Albuquerque Rocha de Souza

Presidente da SOCEGO – Associação Cearense de Ginecologia e Obstetrícia

Embora a expressão “Violência Obstétrica” tenha ganhado repercussão nos últimos anos, o debate acerca da violência institucional contra a mulher em trabalho de parto não é recente, como nos mostra artigo publicado no Lancet em 2002 (1). A intensificação do debate, contudo, coincide com a emergência de uma nova construção legal que engloba elementos da qualidade da assistência obstétrica e maus tratos às mulheres durante o parto (2).

Deste modo, o termo consagrado na literatura científica internacional - “violência obstétrica” - é um construto legal que inclui o tratamento desrespeitoso e abusivo que as mulheres podem experienciar durante a assistência à gravidez, parto e puerpério (3-5), bem como outros elementos de cuidado de má qualidade, como a não aderência às melhores práticas baseadas em evidências científicas (3, 5-7).

Há evidências sólidas e crescentes de uma série de práticas desrespeitosas e violentas que as mulheres experimentam em instalações de atendimento obstétrico, particularmente durante o parto, sendo este um ponto sem grandes divergências na literatura (1, 2, 3). É mister reconhecer, contudo, que, conquanto as evidências comprovem a violência obstétrica como uma realidade, não há consenso em nível global sobre como essas ocorrências são definidas e medidas (1, 2).

Neste sentido, vale destacar que as atitudes e ações agrupadas na expressão violência obstétrica não se restringem aos atos dos profissionais de saúde, embora os inclua. A literatura revela que a violência pode decorrer de falhas sistêmicas nos diferentes níveis de atenção dos sistemas de saúde (2, 3, 4) e inclui uma variedade de atos intencionais ou inadvertidos que possam vir a causar sofrimento ou ferir autonomia da paciente (1, 4-10). Deste modo, inclui atos intencionais de violência emocional, verbal e sexual, além de uma miríade de práticas obstétricas, sem respaldo pelas evidências e potencialmente prejudiciais como episiotomia desnecessária, abandono ou recusa em ajudar as mulheres durante o parto, falta de empatia do provedor e falta de informação, discussão e consentimento da mulher para as intervenções obstétricas que podem ser necessárias durante a assistência (1, 3-8).

É crucial, contudo, destacar que reconhecer a violência obstétrica como uma realidade, não significa culpabilizar nenhuma categoria profissional específica, posta que esta se consolida em termos estruturais (11). A violência obstétrica é uma expressão de violência durante a prestação de cuidados de saúde, que ocorre em um ambiente social e em sistemas de saúde cujos fundamentos políticos e econômicos fomentam o desenvolvimento de relações de poder (1, 12). Assumir a violência obstétrica como uma realidade a ser enfrentada não enfraquece os obstetras como categoria profissional. Ao contrário, a fortalece, uma vez que os profissionais de saúde também estão expostos a prejuízos oriundos da mesma estrutura que sustenta a institucionalização de práticas violentas contra as mulheres (12).

Deste modo, a busca constante por uma assistência materno-infantil de qualidade passa pelo enfrentamento da violência obstétrica (1,2) e reconhecer que a estrutura dos serviços é violenta contra os profissionais reforça a necessidade de enfrentamento à violência obstétrica, sendo também a recíproca verdadeira (12).

Como médicos Obstetras temos uma grande oportunidade em mostrar as mulheres que estamos ao lado delas na busca por uma assistência obstétrica de qualidade, que respeite sempre e acima de tudo cada gestante na sua individualidade e nos seus desejos para o seu parto.

RECOMENDAÇÕES SOBRE AS PRÁTICAS NA ASSISTÊNCIA AO PARTO PARA EVITARMOS A ACUSAÇÃO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

Ressalta-se que a questão central para não promover ações violentas na assistência ao Parto é o respeito a autonomia da mulher, assegurando também a beneficência e a não-maleficência nesse processo.

Nesse sentindo, a comunicação clara, o diálogo e o vínculo entre parturiente, família e equipe de assistência ao nascimento é o caminho natural e mais seguro para que se evitem situações percebidas como violentas, lembrando que algumas ações passam a ser entendidas como Violência Obstétrica quando utilizadas inadvertidamente, de forma imposta ou ferindo às evidências, desconsiderando a condição de sujeito da parturiente.

São recomendadas pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), pela Organização Mundial da Saúde (13), pela Comissão Nacional de Incorporação das Tecnologias no SUS (14) como boas práticas de assistência ao trabalho de parto e parto:

Individualidade: converse e oriente as parturientes chamando-a pelo seu nome. Jamais utilize de apelidos ou abreviações, exceto quando solicitado pela paciente.

Momento de internação na maternidade - Sempre que possível, internar a gestante para assistência ao parto quando esta estiver na fase ativa de trabalho de parto;

Acompanhantes – Estimule e facilite a presença do/a acompanhante, de livre escolha da parturiente, no ambiente de assistência ao trabalho de parto e parto, sem restrição de trânsito. Quando possível, deixe que a família da gestante frequente o local em que a gestante está em trabalho de parto. Além disso, inclua os acompanhantes na discussão e informação do que está sendo feito na assistência.

Dietas - Liberdade para ingestão de líquidos claros durante o trabalho de parto ativo para gestantes de Risco Obstétrico Habitual,

Preparo para o parto – Pergunte a mulher o que ela deseja quanto a tricotomia e enemas.

- Não realize tricotomia compulsoriamente;

- Não realizar enema ou laxativos como rotina;

Monitorização fetal - Manter ausculta fetal intermitente nas pacientes de baixo risco (a cada 30 minutos na fase ativa do trabalho de parto, e a cada 5 minutos no período expulsivo), preferencialmente permitindo que a parturiente e acompanhantes também possam ouvir os batimentos cardíacos fetais,

Parto – Discuta e respeite a liberdade de escolha da gestante ao escolher a posição mais confortável para o parto, estimulando as posições verticalizadas;

- Ofereça métodos não farmacológicos de alivio da dor, incluindo o apoio contínuo durante o trabalho de parto;

- Deixe que a gestante/parturiente escolha o momento de ter a analgesia farmacológica do parto, informando a ela que isso é uma escolha dela e que não irá prejudicar a evolução do parto;

- Não realizar episiotomia de rotina, e quando houver a percepção de que há necessidade da mesma, informe, explique e justifique esta necessidade para a parturiente e acompanhante, realizando-se após seu consentimento que virá naturalmente quando mostramos a ela que a estamos respeitando;

- Imediatamente após o nascimento, estimule e promova o contato pele a pele da mãe e seu filho, independentemente se for parto vaginal ou parto cesárea. Peça diretamente, quando necessário, que o pediatra promova e facilite este contato,

- Promova medidas de redução de hemorragia no 4º período do parto. (uso sistemático de ocitocina intramuscular).

REFERÊNCIAS:

1. d’Oliveira AF, Diniz SG, Schraiber LB. Violence against women in health-care institutions: an emerging problem. Lancet. 2002;359(9318):1681–5.

2. Williams CR, Jerez C, Klein K, Correa M, Belizán JM, Cormick G. Obstetric violence: a Latin American legal response to mistreatment during childbirth. BJOG 2018; 125:1208–1211.

3. Bowser D, Hill K. Exploring evidence for disrespect and abusein facility-based childbirth: Report of a landscape analysis.USAID-TRAction Project. Harvard School of Public Health, UniversityResearch Co., LLC, 2010. [www.urc-chs.com/uploads/resourceFiles/Live/RespectfulCareatBirth9-20-101Final.pdf]. Accessed 27December 2017

4. Bohren MA, Vogel JP, Hunter EC, et al. The Mistreatment of Women during Childbirth in Health Facilities Globally: A Mixed-Methods Systematic Review. Jewkes R, ed. PLoS Medicine. 2015;12(6): e1001847. doi:10.1371/journal.pmed.1001847.

5. Bohren MA, Vogel JP, Hunter EC, Lutsiv O, Makh SK, Souza JP, Aguiar C, Saraiva Coneglian F, Diniz ALA, Tunçalp Ö, Javadi D, Oladapo OT, Khosla R, Hindin MJ, Gülmezoglu AM. The mistreatment of women during childbirth in health facilities globally: a mixed-methods systematic review. PLoS Med. 2015;12(6) https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1001847.

6. D’Ambruoso L, Abbey M, Hussein J. Please understand when I cry out in pain: women’s accounts of maternity services during labour and delivery in Ghana. BMC Public Health. 2005;5:140.

7. Charles S. Obstetricians and violence against women. Am J Bioeth. 2011; 11(12):51–6.

8. Coyle J. Understanding dissatisfied users: developing a framework for comprehending criticisms of health care work. J Adv Nurs. 1999;30(3):723–31.

9. Perez D’Gregorio R. Obstetric violence: a new legal term introduced in Venezuela. Int J Gynaecol Obstet. 2010;111(3):201–2.

10. Brüggemann AJ, Wijma B, Swahnberg K. Abuse in health care: a concept analysis. Scand J Caring Sci. 2012;26(1):123–32.

11. Farmer, P. E., Nizeye, B., Stulac, S., & Keshavjee, S. (2006). Structural violence and clinical medicine. PLoS Medicine, 3(10), Article e449.

12. Morales XB, Chaves LVE, Delgado CEY. Neither Medicine Nor Health Care Staff Members Are Violent By Nature: Obstetric Violence From an Interactionist Perspective.Qualitative Health Research. 2018; 28(8):1308 – 1319

13. WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience ISBN 978-92-4-155021-5

14.Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal do Conitec, relatório de recomendações, 2016.


Disponibilidade Sobreaviso Obstétrico

Relator

Carlos Henrique Mascarenhas Silva

Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG

A Obstetrícia é provavelmente a única especialidade médica que tem um evento envolvendo assistência de equipe médica que obrigatoriamente irá ocorrer, mas ao mesmo tempo é impossível sabermos ou prevermos o que dia e o horário certo que ele irá acontecer. Este evento é o Parto vaginal ou o Parto Cesárea.

Há mais de 20 anos a Assistência Obstétrica, na medicina suplementar, está organizada de forma que uma paciente pode escolher o médico que fará o seu parto. Muitas vezes será o mesmo médico que faz o seu pré-natal, ou alguém indicado por ele, para substituí-lo. Diversos motivos estão envolvidos nesta escolha, o mais forte deles talvez seja a confiança adquirida ao longo dos nove meses de encontros e conversas sobre a gravidez e o parto durante o acompanhamento pré-natal.

Entretanto, nesta relação de escolha pela paciente do médico que fará seu parto, existe um trabalho que é executado ao longo de toda a gestação e que não tem uma remuneração estabelecida por nenhuma das OPS, e também não está no Rol de Procedimentos de cobertura obrigatória da ANS, que é o sobreaviso ou disponibilidade do médico, à pedido de sua paciente, para que fique à disposição para quando esta precisar. Ficar à disposição precisa e deve ser remunerado.

Quando uma paciente solicita e combina com o seu médico, para que este faça seu parto, são desencadeadas uma série de medidas para organizar e estruturar a garantia, dada por parte deste profissional, de que ele estará disponível para fazer o parto desta paciente. Férias, congressos, viagens e festas são mudadas e adaptadas para que esta presença seja garantida. Ele ficará acessível e disponível para esta paciente.

O Obstetra que combinou com sua paciente de ficar de sobreaviso e à sua disposição para ir à Maternidade quando for chamado precisará cancelar todas as suas atividades agendadas, cancelará todo o seu consultório, deixará de ir a eventos familiares e sociais. Ele assumiu um compromisso de estar presente, para assistir sua cliente, em um evento completamente aleatório e incerto.

É importante e indispensável aqui ressaltarmos que, um ato médico é a disponibilidade obstétrica, realizada e oferecida ao longo de toda a gestação. Outro ato é assistência ao parto e o parto vaginal/cesárea, este iniciado quando a paciente se interna em uma Maternidade para ter seu filho(a). Este segundo “trabalho”, como dito, já tem sua remuneração fixada, negociada e paga aos médicos pelas OPS. Mas o primeiro serviço prestado não tem esta previsão de cobertura e remuneração de honorários.

Temos de lembrar ainda de um importante preceito da Bioética, que é a Autonomia do Paciente. O princípio da autonomia requer que os indivíduos capacitados de deliberarem sobre suas escolhas pessoais, devem ser tratados com respeito pela sua capacidade de decisão. As pessoas têm o direito de decidir sobre as questões relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Quaisquer atos médicos devem ser compartilhados, escolhidos e autorizados pelo paciente. A gestante e seu marido tem o direito de escolher o Médico que que vai ficar disponível para o momento que ela precisar. Nossas clientes tem plena capacidade de escolher e decidir se querem ou não contratar a disponibilidade de seu Médico Obstetra.

O Código de Ética Médica, em seu capítulo 2, artigo X diz que é direito do médico “estabelecer seus honorários de forma justa e digna”. É exatamente isso que os Obstetras em todo o Brasil fazem quando combinam com suas pacientes os honorários médicos para a Disponibilidade Obstétrica.

Em 8 de novembro de 2012 o Conselho Federal de Medicina publicou o parecer 39/2012. Este parecer foi uma importante ferramenta de orientação e normatização, sobre a forma de se fazer esta cobrança.

Naquela época o CFM definiu as bases legais para este acordo feito entre médicos obstetras e as suas pacientes/clientes:

1. somente poderão realizar a cobrança de honorários pelo sobreaviso/disponibilidade os médicos que residem em cidades que possuam atendimento obstétrico privado organizado de forma que as maternidades privadas credenciadas pelas Operadoras de Planos de Saúde contem com médicos obstetras de plantão 24 horas, todos os dias da semana.

2. as pacientes devem ser avisadas na 1a consulta sobre esta forma de trabalho, deixando claro que este acordo e contratação são voluntárias e que caso não queiram fazer tal contratação deverão procurar o médicos plantonistas das maternidades no momento do parto. Um termo de consentimento livre e esclarecido deve ser fornecido e assinado, esclarecendo todas as dúvidas, inclusive o valor destes honorários.

3. Deve ser garantido a manutenção das consultas de pré-natal com o médico obstetra escolhido pela paciente, mesmo que esta faça a opção de ter seu parto com o médico plantonista, devendo todos os dados relativos aos cuidados prestados inseridos no cartão de pré-natal.

Complementarmente, fazemos as seguintes orientações:

- os médicos obstetras de cidades que não possuem Maternidades com plantões em obstetrícia organizado da forma acima devem trabalhar localmente para que tais Maternidades e as Operadoras locais providenciem este tipo de atendimento,

- é importante que todos os médicos obstetras observem as questões legais dos Estados em que residem, verificando nas federadas regionais da Febrasgo eventual impedimento a esta cobrança,

- A cobrança de honorários deve ser única, pelo menos até que novos posicionamentos buscados por algumas Federadas regionais e a Febrasgo sejam obtidas.

- emitir recibo ou nota fiscal deixando discriminado qual serviço foi realizado.

Precisamos deixar claro de uma vez por todas que não há nada de indevido quando a gestante deseja escolher um médico específico para auxiliá-la no seu parto, desde que essa decisão seja feita de acordo com as normativas existentes. O atendimento personalizado com a escolha de horários além dos estabelecidos previamente integra a medicina privada e, por isso, a precificação é de autonomia de cada profissional.

O sobreaviso médico e a sua disponibilidade na obstetrícia resultam em um honorário médico distinto e separado, que remunera o serviço do Médico ao longo de uma gestação, quando combinado e acordado com sua paciente.

Por ser de livre escolha, as Operadoras de Planos de Saúde não são responsáveis por oferecer a cobertura assistencial e não devem ser responsabilizadas pelo reembolso destes valores. Em Belo Horizonte e em outras cidades mineiras, essa relação ocorre, na maioria das vezes, sem problemas e é isso que devemos buscar: uma relação transparente que garanta a opção de escolha, contribuindo para que cada paciente opte pela forma da assistência médica que quer em seu parto.

A ultrassonografia das mamas de rotina em mulheres com menos de 40 anos como rotina

Vou te pedir uma ultrassonografia das mamas para fazer prevenção porque você ainda não tem 40 anos para fazer mamografia.

Reconhece a frase acima? É um bom emprego da tecnologia?

Vamos examinar mais a fundo.

O que significa um exame de prevenção? Significa rastrear, fazer um exame em uma pessoa assintomática na tentativa de diagnosticar precocemente uma determinada doença presumindo que essa precocidade do diagnóstico torne o tratamento mais eficaz.

Também está implícito na frase que a paciente precisa de um exame, e como ela não está na idade de fazer mamografia, ela fará uma ultrassonografia.

Talvez o leitor concorde comigo que nas entrelinhas estão ainda duas informações subliminares: “mal não faz” e “não custa nada”.

Reflitamos.

O rastreamento de uma doença só está indicado se ficar comprovado o seu benefício. E não há nenhum dado na literatura que mostre benefícios em rastrear com ultrassonografia mamária uma população de mulheres de menos de 40 anos de risco normal (as pacientes com verdadeiro alto risco são um caso totalmente distinto). Portanto “prevenção do câncer” (seria melhor dizer rastreamento ou detecção precoce) em uma mulher de 30 anos assintomática e de risco normal com ultrassonografia mamária não pode ser uma indicação aceita.

A presunção de que deve ser pedido um exame de mama obrigatoriamente para que o atendimento ginecológico de uma paciente assintomática seja bem feito. O exame só deve ser pedido se houver um benefício. Sabemos da pressão que as pacientes fazem para que solicitemos exames. Quantas vezes não ouvimos a frase “mudei de médico porque ele não me pediu nenhum exame”. Mas não devemos ceder a essa pressão sem ao menos tentar explicar para a paciente a ausência do benefício. Há outras formas de demonstrarmos que nos preocupamos com a saúde das mamas da paciente: conversar sobre auto palpação, sobre o que ela deve fazer se tiver um nódulo palpável ou uma descarga papilar, realizar um exame físico cuidadoso e atento. Não podemos esquecer que a solicitação de um exame mal indicado cria nas pacientes coletivamente uma sensação de que esse exame deva ser pedido sempre, gerando uma falsa demanda para o exame. Desfazer um costume é mais difícil que impedir a sua criação.

Por último, examinemos as afirmativas “mal não faz” e “não custa nada”. Não há exame ou intervenção médica que não tenha potencialmente uma iatrogenia associada. Assim como a prescrição de um medicamento de baixo risco pode resultar, mesmo que raramente, em uma reação alérgica grave e a colheita de um simples hemograma pode levar a complicações como a flebite, a ultrassonografia mamária também tem riscos. O maior deles é o falso positivo. Biópsias desnecessárias, exames adicionais, angústias, e até tratamentos e cirurgias diagnósticas dispensáveis. O que intuitivamente é percebido como um “direito da paciente” (fazer o exame) pode na verdade se tornar uma iatrogenia (prejudicar a paciente). E o custo não é só médico-humano. Há, sim, um custo financeiro. Os sistemas de saúde já estão sob uma grande pressão pelo crescimento da chamada inflação médica. Há muitas causas para esse aumento dos custos, a maior delas sendo a incorporação de novas técnicas e tratamentos, mas seria de boa norma não adicionarmos a realização de exames mal indicados em larga escala. E de uma forma perversa o aumento de gastos com exames desnecessários em uma prestadora de serviços médicos irá levar à diminuição dos honorários pagos aos outros médicos, pois o montante a ser dividido nunca tem a elasticidade necessária.

Uma última reflexão. O aumento exponencial na demanda por ultrassonografia mamária exige a disponibilização de um grande contingente de ultrassonografistas. Não havendo condições que provê-los, esses exames passarão a ser feitos por profissionais menos bem preparados, diminuindo a chance de uma paciente que realmente precisa ser atendida por um ultrassonografista bem formado. A ultrassonografia mamária, em função da discreta diferença entre o tecido normal e o patológico, é um exame que tem uma curva de aprendizado particularmente longa.

Uma ressalva, estamos falando de moças assintomáticas. A paciente portadora de nódulo palpável deve receber uma abordagem totalmente diferente.

Sei que essas reflexões irão de encontro a costumes difícil de combater, pressões sociais, rotinas regionais. Mas, ainda que não seja possível reverter de imediato uma situação estabelecida, é mister conhecer esses argumentos para embasar uma mudança no dia em que ela se tornar possível.


Autor: Hélio Sebastião Amâncio de Camargo Júnior

 

 

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