DOI: 10.1590/SO100-720320150005338 - volume 37 - Agosto 2015
Bruna Barbosa Hackbarth, Jessica Augustini Ferreira, Heidi Pfutzenreuter Carstens, Augusto Radunz Amaral, Mariana Ribeiro Silva, Jean Carl Silva, Paulo Henrique Condeixa de França
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define como prematuro todo recém-nascido (RN) vivo oriundo de gestação anterior à 37ª semana1. De acordo com a semana gestacional em que ocorre o nascimento, os casos de prematuridade podem ser classificados em limítrofes (35ª - <37ª semana), intermediários (32ª - <35ª semana), muito prematuros (28ª - <32ª semana) e extremos (<28ª semana)2.
Na maior parte dos países com estudos sobre a matéria, vem se percebendo um aumento nas taxas de prematuridade. Em 2010, 15 milhões de bebês nasceram prematuramente, sugerindo uma prevalência mundial de 11,1%3. Em 2005, essa prevalência era de 9,6%1. O Brasil, 10º país com maior número de casos estimados de prematuridade, apresenta cenário semelhante3. Estudos epidemiológicos mostram que a prevalência do nascimento prematuro vem aumentando desde 1990, tendo alcançado taxas de até 15% em algumas cidades do Sul e Sudeste do país em 20043 , 4. Um estudo de coorte brasileiro identificou a prematuridade como principal causa de morte neonatal5.
Na tentativa de reverter esse quadro, pesquisadores voltaram-se à identificação das causas do nascimento prematuro. Até o momento, são estudados os aspectos comportamentais e sociodemográficos, as condições médicas prévias ou complicações da gravidez e, mais recentemente, os fatores genéticos6.
A prematuridade como resultado do processo evolutivo constitui um novo tipo de abordagem. Ao se comparar humanos com primatas semelhantes, identifica-se que, ao longo do tempo, a nossa espécie apresentou um aumento substancial do crânio e um estreitamento da bacia pélvica, dificultando o trabalho de parto7. Tais constatações têm impulsionado a investigação de possíveis associações entre variantes de genes acelerados e a ocorrência de prematuridade. Plunkett et al.7 sugeriram que os genes FSHR e PGR, codificantes para os receptores do hormônio folículo estimulante e da progesterona, respectivamente, evoluíram de maneira acelerada na espécie humana, impactando o encurtamento da gestação e a facilitação do nascimento7. Até o momento, já foi identificada associação significativa entre a prematuridade e os polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs - Single Nucleotide Polymorphism) rs12473815 do gene FSHR e rs1942836 do gene PGR em algumas populações7 - 9.
O objetivo do estudo foi investigar a associação de certas características maternas, como consumo de álcool, uso de tabaco, escolaridade, condição socioeconômica, índice de massa corporal (IMC) pré-gestacional, diabetes gestacional (DG), ocorrência de infecções durante a gestação e a presença das variantes de risco relativas aos SNPs rs12473815 e rs1942836, com o nascimento prematuro.
O estudo retrospectivo do tipo caso-controle foi realizado na Maternidade Darcy Vargas (MDV), localizada em Joinville, Santa Catarina. A instituição é referência na assistência pré-natal e puerperal de toda a região norte do estado oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS).
A inclusão de pacientes e a coleta de dados ocorreram entre os meses de outubro de 2013 e outubro de 2014. Durante o período estipulado, 157 puérperas foram inclusas no estudo, sendo 45 (28,6%) com trabalho de parto prematuro (grupo "Caso") e 112 (71,4%) com trabalho de parto a termo (grupo "Controle"). Ambos os grupos apresentavam média de idade equivalente, sendo 23,3±4,0 anos para o grupo Caso e 23,3±3,9 anos para o Controle.
Foram inclusas, consecutivamente, puérperas primíparas entre 18 e 35 anos, atendidas na MDV com trabalho de parto espontâneo, resultando em RN único, vivo e sem malformações evidentes. Por meio da confirmação da idade gestacional por ultrassonografia, consideraram-se casos prematuros os partos ocorridos anteriormente à 37ª semana. Para o Grupo Controle, incluíram-se partos ocorridos entre a 37ª e a 42ª semana de gestação.
Após anuência da puérpera, realizou-se entrevista individualizada durante o período de internação pós-parto, empregando-se questionário de pesquisa composto por instrumentos já validados e por perguntas especialmente elaboradas para o estudo, além de consulta ao prontuário médico respectivo. Todas as informações coletadas foram digitadas em banco de dados utilizando-se o programa Epidata 3.1 (r).
Para avaliar o consumo de álcool, utilizou-se o instrumento AUDIT-C (Alcohol Use Disorders Identification Test C). As qualidades psicométricas desse questionário, já testadas para gestantes, identificam o consumo elevado de álcool com uma sensibilidade de 94,6% quando seus resultados são maiores ou iguais a 310.
A obtenção dos dados socioeconômicos foi definida pelo Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) da Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa11. Por meio do CCEB, atribui-se à participante uma pontuação que a classifica em estratos econômicos11. Para a definição da escolaridade da puérpera, empregaram-se as mesmas categorias contidas no CCEB.
Em relação à ocorrência de infecções durante a gestação, elaborou-se questionário contendo perguntas que abordavam os aspectos mais pertinentes, de acordo com revisão bibliográfica. Dentre eles, destacam-se o sítio da infecção apresentada, em qual trimestre gestacional se deu a ocorrência e se houve a necessidade de antibioticoterapia.
Quanto ao uso do tabaco, por não se dispor de um questionário padronizado e específico para essa população, foram investigados aspectos do tabagismo materno descritos em estudo realizado no extremo sul brasileiro12. Indagou-se se a participante fumou nos seis meses que antecederam a gravidez; se fumou durante a gravidez e em qual trimestre; e se seu companheiro ou outro familiar costumava fumar na mesma peça do domicílio em que ela se encontrava durante a gestação. Em caso de respostas afirmativas, as participantes eram consideradas tabagistas ativas ou passivas.
Em relação ao IMC, optou-se pela coleta de informações autorreferidas, a fim de se evitar a realização de manobras dolorosas para a medição da altura da paciente no pós-parto. Para a captação dos dados relacionados ao DG foram utilizadas as informações contidas nos prontuários médicos.
Para as análises genéticas foram utilizadas alíquotas residuais de sangue total sem aditivo, coletado para realização do teste VDRL (Veneral Disease Research Laboratory) na admissão hospitalar. A extração do DNA seguiu as recomendações do kit"Biopur Kit de Extração Mini Spin Plus" (Biopur, Reinach, Suíça). Em seguida, realizou-se a discriminação alélica dos polimorfismos rs12473815 e rs1942836 através do sistema Taqman (r) para PCR em Tempo Real (qPCR) (Life Technologies, Carlsbad, EUA). Na reação empregaram-se sondas com os fluoróforos reporter VIC(r) e FAM(r). Para a preparação de ambas as reações, estimou-se volume total de 25 µL, conforme a seguinte proporção: 100 ng de amostra de DNA, 12,5 µL de Taqman(r)Genotyping Master Mix (2X), 1,25 µL de TaqMan(r) SNP Genotyping Assay 4351379 (20X) e q.s.p. H20 DEPC (Diethylpyrocarbonate). As reações foram distribuídas em placa para leitura óptica (MicroAmp(r) Optical 96-well reaction plate) e levadas ao termociclador modelo CFX-96 Touch (Bio-Rad, Hercules, EUA). Utilizou-se a seguinte condição de termociclagem: 10 minutos a 95°C, 39 ciclos alternados de 15 segundos a 95°C e um minuto a 60°C. O resultado das análises foi avaliado mediante gráficos de discriminação alélica, construídos pelo próprio software do equipamento.
Para a análise descritiva, realizaram-se as medidas de média, desvio padrão e frequências absoluta e relativa. Inicialmente, foi avaliada a normalidade da distribuição dos dados utilizando-se o teste de Komolgorov-Smirnov. Aplicou-se o teste t para a análise da hipótese de igualdade entre as médias geradas a partir da variável idade materna. As frequências alélicas e genotípicas foram calculadas a partir de contagem direta e comparadas entre os grupos Caso e Controle. A partir daí, testou-se a aderência dos dados ao Equilíbrio de Hardy-Weinberg. Para a comparação das proporções entre os dois grupos, realizou-se teste χ2 ou teste exato de Fisher. Foram construídos modelos de regressão logística para avaliar a associação dos fatores de risco estudados com a prematuridade e ajustar as variáveis de confundimento. O intervalo de confiança (IC) estabelecido foi de 95% e significância quando p<0,05. A análise estatística foi realizada empregando-se o Software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 21.0.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade da Região de Joinville (parecer 392.814) e respeitou as normas contidas na Resolução CNS 466/2012 e complementares. A participação das puérperas se deu mediante assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido específico.
Dentre os nascimentos do grupo Caso, observou-se uma maior prevalência de prematuridade limítrofe (35 casos; 77,8%), seguida de 4 casos de prematuros moderados (8,9%), 3 de muito prematuros (6,7%) e 1 de prematuridade extrema (2,2%). Em dois eventos de nascimento prematuro (4,4%), a idade gestacional não foi informada no prontuário eletrônico. No entanto, diante da importância das informações fornecidas pela aplicação do questionário e do teste genético, optou-se por mantê-las no estudo.
Em relação à ocorrência de infecção microbiana, não se observou diferença significativa entre puérperas com parto prematuro (n=21; 46,7%) e a termo (n=49; 43,7%) (p=0,9). Dentre as participantes da pesquisa, 5 (3,3%) apresentavam DG. Destas, 4 pertenciam ao grupo Controle e 1 ao grupo Caso. A escolaridade, os estratos de condição socioeconômica e o comportamento tabagista também não tiveram influência sobre o desfecho estudado. Os resultados referentes à ingestão alcoólica e ao IMC pré-gestacional, entretanto, mostraram associação positiva com o nascimento prematuro (Tabela 1).
Tabela 1.
Influência do tabagismo, da ingestão alcoólica e do índice de massa corporal pré-gestacional sobre a frequência de nascimentos prematuros
Controle | Caso | OR | IC95% | |||
---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |||
Tabagismo ativo | 8 | 7,1 | 6 | 13,3 | 2,7 | 0,6–9,8 |
Tabagismo passive | 64 | 57,1 | 26 | 57,7 | 1,0 | 0,5–1,9 |
Consumo alcoólico mensal ≥2 vezes | 40 | 35,7 | 21 | 46,6 | 1,7 | 1,1–4,6* |
IMC baixo peso (<18,5 kg/m²) |
8 | 7,1 | 9 | 20 | 3,8 | 1,3–11,6* |
IMC excesso de peso (≥25,0 kg/m²) | 34 | 30,3 | 11 | 24,4 | 0,6 | 0,3–0,9* |
OR: Odds ratio; IC: Intervalo de confiança; IMC: Índice de massa corporal;
*
Significância estatística.
O consumo de álcool se tornou relevante somente com a ingestão superior a duas doses mensais. O teste AUDIT-C foi capaz de identificar a ingestão alcoólica excessiva como possível fator de risco para o nascimento prematuro. No grupo Caso, a ocorrência de puérperas com pontuação ≥3 (17,8%) foi superior à encontrada no grupo Controle (6,3%) (p=0,03). Da mesma forma, o baixo IMC pré-gestacional (<18,5kg/m²) aumentou em 3,8 vezes a chance de se desenvolver um parto prematuro (IC95% 1,3-11,6). Em oposição, o excesso de peso pré-gestacional (IMC>25,0kg/m²) apresentou efeito protetor sobre a prematuridade (IC95% 0,3-0,9).
Para a interpretação dos dados genéticos, três amostras foram excluídas da análise por apresentarem falha não identificável durante o processo de extração de DNA ou resultados inconclusivos após qPCR. Dessa maneira, 154 amostras foram consideradas em relação aos polimorfismos genéticos rs12473815 (45 controles e 109 casos) e rs1942836 (44 casos e 110 controles). Ambos os grupos se encontravam em equilíbrio de Hardy-Weinberg. Quando comparadas as frequências genotípicas e alélicas de ambos os polimorfismos entre os grupos, não se evidenciaram diferenças significativas em relação a sua distribuição (Tabela 2).
Tabela 2.
Frequências genotípicas e alélicas dos polimorfismos rs12473815 do gene FSHR e rs1942836 do gene PGR
Caso | Controle | Valor p | |||
---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||
FSHR | |||||
Genótipo | |||||
CC | 21 | 46,7 | 43 | 39,5 | 0,4* |
CT | 24 | 53,3 | 66 | 60,5 | |
Alelo | |||||
C | 66 | 73,3 | 152 | 69,7 | 0,4* |
T | 24 | 26,7 | 66 | 30,3 | |
PGR | |||||
Genótipo | |||||
TT | 24 | 54,5 | 73 | 66,3 | 0,2** |
TC | 16 | 36,4 | 32 | 29,1 | |
CC | 4 | 9,1 | 5 | 4,6 | |
Alelo | |||||
T | 64 | 72,7 | 178 | 0,11* | 0,1* |
C | 24 | 27,3 | 42 | 19,1 |
FSHR: Receptor do hormônio folículo estimulante; PGR: Receptor de progesterona;
*
Teste ?2;
**
Teste exato de Fisher.
IMC pré-gestacional, etilismo e tabagismo foram considerados como potenciais fatores confundidores e incluídos na análise multivariada. Nessa etapa, identificou-se que os genótipos TC e CC do SNP rs1942836 do gene PGR aumentaram em 1,4 (IC95% 1,1-1,9) e em 4,4 (IC95% 1,3-17,8) vezes, respectivamente, as chances de se desenvolver parto prematuro. Em relação ao gene FSHR, não foram detectadas gestantes homozigotas para a variável de risco do SNP rs12473815. No entanto, observou-se que gestantes com o genótipo CT apresentaram chances 1,6 (IC95% 1,2-3,3) vezes maiores de apresentarem prematuridade. Quando analisados os efeitos combinados de ambos os polimorfismos (rs12473815 e rs1942836) sobre o desfecho, foi observada maior ocorrência de prematuridade nas gestantes portadoras dos genótipos CT/TC (OR 2,0; IC95% 1,1-3,2) e CT/CC (OR 1,4; IC95% 1,1-2,5) (Tabela 3).
Tabela 3.
Análise multivariada da ocorrência de prematuridade de acordo com a apresentação das variantes dos polimorfismos dos genes FSHR (rs12473815) e PGR (rs1942836)
Caso | |||||
---|---|---|---|---|---|
n | OR bruto | IC95% | OR ajustado | IC95% | |
FSHR | |||||
CC | 21 | 0,7 | 0,4–1,2 | 0,6 | 0,2–1,1 |
CT | 24 | 0,8 | 0,4–2,3 | 1,6 | 1,2–3,3* |
PGR | |||||
TT | 24 | 0,6 | 0,3–1,3 | 0,7 | 0,3–1,4 |
TC | 16 | 1,1 | 0,5–2,2 | 1,4 | 1,1–1,9* |
CC | 4 | 3,8 | 1,1–15,1 | 4,4 | 1,3–17,8* |
FSHR e PGR | |||||
CT x TC | 11 | 1,6 | 0,7–3,8 | 2,0 | 1,1–3,2* |
CT x CC | 1 | ** | ** |
OR: Odds Ratio; IC: Intervalo de confiança; FSHR: Receptor do hormônio folículo estimulante; PGR: Receptor de progesterona.
*
Significância estatística.
**
Análise excluída em razão do baixo número amostral.
A predominância de prematuridade limítrofe encontrada no estudo é comparável a dados obtidos em revisão sistemática, em que se observaram prevalências de 63,2%, 76% e 79% em três diferentes populações13.
Neste estudo, o consumo alcoólico aumentou as chances de nascimento prematuro somente quando a ingestão ocorria em duas ou mais ocasiões por mês. Até o momento, entretanto, a maior parte das publicações mostra a necessidade de doses ainda maiores e mais frequentes para predispor à prematuridade. Uma revisão sistemática com metanálise realizada em 2011 identificou que apenas o consumo a partir de três doses diárias (ou 36 g/dia) aumentaria as chances de um parto prematuro14.
A influência de ambos os extremos do IMC pré-gestacional sobre a prematuridade já foi relatada na literatura15. Dessa forma, o efeito protetor do excesso de peso encontrado no presente estudo deve-se, possivelmente, a um viés de seleção, relacionado aos critérios de inclusão do estudo. Sabe-se que os extremos superiores do IMC pré-gestacional estão relacionados ao parto prematuro por Ruptura Prematura de Membrana ou por indicação médica, ambas as modalidades não admitidas no estudo16. Tal associação já foi verificada em coorte estadunidense ao se verificar associação entre IMC >30 kg/m² e os nascimentos prematuros por indicação médica, com OR de 1,4 nas gestações entre a 34ª e 36ª semana e de 1,7 nas anteriores à 34ª semana gestacional16.
Em relação ao uso do tabaco, mesmo não se encontrando associação significativa com a prematuridade, é possível observar que há uma elevação na taxa de gestantes tabagistas no local de estudo (13,3% no grupo Caso) quando comparada à média nacional (7,7%)17. Ainda, é importante salientar a taxa de gestantes consideradas fumantes passivas (57%). Recentemente, demonstrou-se associação positiva entre a inalação passiva do fumo e o nascimento prematuro, principalmente ao se considerar os partos ocorridos com idade gestacional inferior a 32 semanas18.
A prevalência de DG encontrada no estudo (3,3%) mostrou comportamento inverso ao apresentado pelo tabagismo. Segundo dados do Ministério da Saúde19publicados em 2010, a taxa de prevalência de DG em mulheres com mais de 20 anos atendidas no Sistema Único de Saúde é de 7,6%. Os dados das pacientes atendidas na MDV não correspondem à metade do valor encontrado nacionalmente. A MDV, por contar com ambulatório especializado em diabetes e com programa específico para prevenção de prematuridade, pode ter apresentado número reduzido de casos de DG severo ou descompensado, impossibilitando a verificação de sua associação com o desfecho.
A falta de associação entre escolaridade e condição socioeconômica e a prematuridade pode se dar pela sua difícil mensuração20. Em consonância com o modelo exposto pela OMS, os fatores socioeconômicos já foram identificados como determinantes estruturais do parto prematuro21. Segundo tal concepção, no entanto, eles não influenciam diretamente a condição de saúde da gestante, sendo capazes de alterar, apenas, seus aspectos comportamentais e psicossociais, os chamados determinantes intermediários. Neste estudo, elevados níveis de consumo alcoólico e o baixo IMC pré-gestacional podem ser considerados determinantes intermediários, capazes de aumentar as chances de um parto prematuro.
Os resultados encontrados sobre o polimorfismo do gene PGR confirmam os dados de estudos anteriores. Em pesquisas realizadas nos EUA, em 2007, e na Argentina, em 2013, se identificou a associação da variante de risco do SNP rs1942836 com a prematuridade limítrofe8 , 9. A influência dos genótipos TC e CC encontrada no presente estudo, entretanto, não se restringiu apenas a essa classe de nascimento prematuro. A associação foi identificada ao se considerar todos os tipos prematuridade, envolvendo casos limítrofes a extremos.
A influência do SNP rs12473815 sobre a prematuridade já foi observada em população finlandesa e afro-americana. Em finlandesas, analisando um grupo de 165 casos e 163 controles, observou-se diferença entre as frequências genotípicas e alélicas dos dois grupos7. Na população afro-americana, com 79 casos e 171 controles, também se observaram diferenças significativas entre tais frequências7.
A frequência do alelo de risco T reportada em gestantes finlandesas com parto prematuro foi de 41,7%, superior a das pacientes com a mesma condição neste estudo22. Deve-se considerar que essas populações apresentam ancestralidade e características genéticas distintas. Enquanto a primeira apresenta marcada homogeneidade, a população brasileira detém, reconhecidamente, elevada miscigenação23. Tais distinções podem ser responsáveis pela ausência de genótipos homozigotos TT na população desta pesquisa.
Ainda em relação ao SNP rs12473815 do gene FSHR, curiosamente, é possível observar que o genótipo CT foi mais frequente no grupo Controle do que no grupo Caso. Isso se deve, possivelmente, à característica multifatorial da prematuridade. Hábitos comportamentais e condições sociodemográficas, biológicas e médicas favoráveis permitiram que gestantes, mesmo dispondo o genótipo de risco, apresentassem trabalho de parto a termo.
Replicar estudos em diferentes centros populacionais constitui um grande desafio em razão das disparidades raciais. O tempo de duração de uma gestação e as taxas de prematuridade variam de modo expressivo entre diferentes raças24. Estudo publicado em 2003, por exemplo, demonstra chance mais elevada de ocorrência de parto prematuro em negras e asiáticas, quando comparadas às gestantes brancas europeias, sugerindo que a maturação fetal em tais casos ocorre mais precocemente24. No Brasil, país de elevada miscigenação racial, é difícil estimar até que ponto tais características naturais interferem na prematuridade.
Em relação à análise dos SNPs rs12473815 do gene FHSR e rs1942836 do gene PGR, é importante também considerar que suas indicações como fator relacionado com a prematuridade são recentes e que, portanto, poucos estudos foram realizados até o momento.
Considerando os aspectos multifatoriais que envolvem o nascimento prematuro, é possível reconhecer algumas limitações do estudo que possam ter inviabilizado a determinação de associação positiva entre alguns fatores de risco estudados e a prematuridade. Inicialmente, a entrevista das pacientes ocorreu após o parto, permitindo, por meio de viés de memória, que algumas informações já não pudessem ser recordadas. Adicionalmente, existe a possibilidade de dados terem sido deliberadamente fornecidos de maneira errônea, configurando um possível viés devido a respostas falseadas. Admite-se, ainda, que os resultados alcançados estejam sob a influência de um número reduzido de gestantes provenientes de um único centro.
Em conclusão, a ingestão frequente de álcool, os extremos do IMC pré-gestacional e a presença do genótipo CT do SNP rs12473815 do gene FSHR e dos genótipos TC e CC do SNP rs1942836 mostraram associação com o nascimento prematuro. É importante considerar que a prematuridade apresenta um caráter complexo e multifatorial, envolvendo diversos aspectos sociais, comportamentais e biológicos que, em estudos posteriores, poderão apresentar correlação com a prematuridade. Ao se conhecer a influência de certas características maternas, auxilia-se no planejamento e na gestão da assistência à saúde integral da gestante e do RN.
Ao Fundo de Apoio à Pesquisa da Universidade da Região de Joinville (FAP/UNIVILLE) pelo suporte financeiro e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa de estudos CAPES à pesquisadora Bruna Barbosa Hackbarth.