DOI: S0100-7203(12)03401200005 - volume 34 - Dezembro 2012
Eliana Aguiar Petri Nahas, Bruno da Rosa de Almeida, Daniel de Araújo Brito Buttros, Heloísa De Luca Véspoli, Gilberto Uemura, Jorge Nahas-Neto
Introdução
A sobrevida média cinco anos após diagnóstico do câncer de mama é de 61%, sendo que nos países em desenvolvimento é de 57% e, nos países desenvolvidos, essa sobrevida se eleva para 73%1. O diagnóstico precoce do câncer de mama é fundamental para que ocorra redução da mortalidade pela doença. No Brasil, o rastreamento mamográfico para mulheres entre 50 a 69 anos é estratégia recomendada para o controle desse câncer2. Na última década, o rastreamento proporcionou redução na mortalidade por câncer de mama de 1,6 a 3,4% por ano3. Embora essa redução se deva também a tratamentos mais eficazes para o câncer de mama, muito é consequência da detecção precoce com o rastreamento populacional3. Longo tempo de seguimento é recomendado após o diagnóstico e tratamento e, com o envelhecer, o risco de comorbidades aumenta4,5. Em recente estudo, com avaliação de 91 mulheres na pós-menopausa em seguimento pós-tratamento do câncer de mama, houve alto índice de comorbidades6. A obesidade esteve presente em metade dos casos, hipertensão em 34%, doença periférica vascular em 26% e diabetes em 13% entre as doenças mais prevalentes. Em conclusão, essa elevada taxa de comorbidades não relacionadas ao câncer pode escapar do tradicional seguimento pelo oncologista. Somente o trabalho multidisciplinar poderia oferecer qualidade na assistência a essa população6.
Estratégias atuais anticâncer têm contribuído para o aumento na sobrevida de pacientes oncológicos e em alguns casos o câncer torna-se uma doença crônica4,7. As pacientes tratadas de câncer de mama são de elevado risco para outros cânceres, assim como para doença cardiovascular (DCV), osteoporose e diabetes; sendo, portanto, reconhecidamente uma população vulnerável8,9. Assim, com o aumento da expectativa de vida das mulheres tratadas de câncer de mama, de forma semelhante àquelas sem câncer, o risco de morte por DCV aumenta10. O risco para DCV, principalmente doença coronariana, aumenta ao longo de toda a vida, com especial incremento em mulheres na pós-menopausa, quando ocupa o primeiro lugar como causa de mortalidade11.
A síndrome metabólica (SM), definida como um conjunto de fatores de riscos metabólicos que incluem obesidade abdominal, dislipidemia, hipertensão arterial e disglicemia, sabidamente associa-se com o aumento no risco de desenvolvimento de DCV e diabetes tipo 212. Acomete aproximadamente 30% da população de mulheres com mais de 50 anos13,14. Essa síndrome associa-se à desordem metabólica denominada resistência à insulina, cuja ação da insulina é prejudicada. Fatores ambientais, particularmente obesidade abdominal e inatividade física, estão amplamente implicados, mas alguns indivíduos são geneticamente predispostos à resistência a insulina15,16. As mulheres tratadas de câncer de mama parecem apresentar risco adicional de síndrome metabólica, resultante do excesso de adiposidade e efeito dos tratamentos17. Thomson et al.18 estudaram a SM como indicador de risco para DCV em 41 mulheres na pós-menopausa com sobrepeso, tratadas de câncer de mama. Empregaram os critérios diagnósticos do US National Cholesterol Education Program: Adult Treatment Panel III (NCEP-ATP III)15, que considera a presença de pelo menos três dos seguintes critérios: obesidade abdominal (circunferência da cintura), elevação da pressão arterial, redução de HDL-colesterol, aumento de triglicerídeos e intolerância à glicose. Os autores detectaram a SM em 54,8% das participantes, sendo a obesidade abdominal o critério mais frequente, presente em 96% dos casos, seguido pela redução do HDL em 65%18.
Importante notar que mesmo sem as manifestações da SM, as mulheres tratadas de câncer de mama são de risco para DCV pela elevada taxa de comorbidades, como a obesidade, hipertensão e diabetes não relacionadas ao câncer1,18. Baseado nesse contexto, o objetivo do presente estudo foi avaliar a ocorrência e os indicadores de risco da síndrome metabólica em mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama.
Métodos
Desenho do estudo e seleção da amostra
Trata-se de estudo clínico, analítico e transversal. O grupo populacional foi constituído de pacientes atendidas no Centro de Avaliação em Mastologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, de julho de 2011 a junho de 2012. O cálculo do tamanho amostral foi embasado em estudo prévio que diagnosticou SM em 54,8% mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama18. Considerando essa frequência, com nível de significância de 5% e um erro tipo II de 10% (poder do teste de 90%), foi estimada a necessidade de avaliar, no mínimo, 95 pacientes. Foram incluídas no estudo mulheres com: data da última menstruação há pelo menos 12 meses e idade ≥45 anos; diagnóstico histológico de câncer de mama; ter completado tratamentos cirúrgico, radioterápico, hormonioterápico e quimioterápico (quando indicado); estar livre de doença há pelo menos cinco anos; não etilistas e não drogaditas. Assim, das 724 consultas médicas realizadas entre julho de 2011 a junho de 2012, 472 pacientes foram excluídas por estarem na perimenopausa, idade <45 anos, presença de doença metastática, menos de 5 anos de diagnóstico e recusa em participação. Foram conduzidas, portanto, 252 entrevistas. Destas, 95 não retornaram para coleta dos exames bioquímicos, portanto um total de 158 mulheres foi elegível para o estudo. Foram esclarecidos, para as pacientes selecionadas, os objetivos e procedimentos a que seriam submetidas, e solicitadas as assinaturas do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), exigência da Resolução nº 196 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde, após aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho".
Metodologia
Inicialmente, no dia da consulta, foram coletados, por meio de entrevista individual, os seguintes dados: idade, idade e tempo de menopausa, paridade, tabagismo, uso ou não de terapia hormonal (TH), história pessoal de DCV, hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes, dislipidemais, atividade física e pressão arterial. Foram consideradas ativas as mulheres que praticavam exercícios físicos aeróbicos de intensidade moderada, pelo menos 30 minutos, 5 vezes na semana (150 minutos/semana) ou exercícios de resistência 3 dias por semana19. Foram diagnosticadas com síndrome metabólica as mulheres que apresentaram três ou mais critérios diagnósticos propostos pelo US National Cholesterol Education Program (NCEP)/ Adult Treatment Panel III (NCEP-ATP III)15: circunferência da cintura >88 cm; triglicerídios≥150 mg/dL; HDL colesterol <50 mg/dL; pressão arterial sanguínea≥130/85 mmHg; glicemia de jejum≥100 mg/dL ou sob terapia. Foram obtidos os seguintes dados para avaliação antropométrica: peso, altura, índice de massa corpórea (IMC=peso/altura2) e circunferência da cintura (CC). Para classificação das pacientes, conforme o IMC, foi empregado o critério da World Health Organization, que considera obesidade IMC≥30kg/m2. Para a medida da CC foi utilizado o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca, com a paciente em posição ortostática; sendo considerada aumentada para mulheres se fosse maior que 88 cm15.
A partir do levantamento de dados dos prontuários foram obtidas informações sobre o peso prévio (na ficha anestésica) e o câncer de mama quanto ao diâmetro do tumor, tipo e graduação histológica, tipo de cirurgia e estudo imunohistoquímico (receptores de estrogênio e progesterona, e Cerb-2), tempo de seguimento e tratamentos adjuvantes (radioterapia, quimioterapia e hormonioterapia). O diâmetro do tumor foi obtido a partir dos laudos histopatológicos e graduado histologicamente em graus I (bem diferenciado), II (moderadamente diferenciado) e III (indiferenciado), de acordo com método proposto que utiliza como critérios os aspectos arquiteturais, o grau de diferenciação nuclear e o índice mitótico20.
Para os exames laboratoriais, as pacientes foram orientadas a manter jejum por 12 horas. Foram realizadas avaliações do perfil lipídico e glicídico pela mensuração do colesterol total (CT), HDL, LDL, triglicerídeos (TG), e glicemia, assim como da proteína C-reativa (PCR). Todas as avaliações bioquímicas foram realizadas pelo Laboratório de Análises Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu. As mensurações de triglicerídeos, CT, HDL, glicemia e PCR foram processadas pelo analisador bioquímico automático, modelo Vitros 950® pelo método colorimétrico de química seca (Johnson & Johnson, Rochester, NY, EUA). O método é linear até 800 mg/dL para TG e 900 mg/dL para CT. O LDL foi obtido subtraindo-se o valor do CT, da soma do HDL e do TG dividido por cinco. Os valores considerados ótimos foram: CT<200 mg/dL, HDL>50 mg/dL, LDL<100 mg/dL, TG<150 mg/dL, glicemia<100 mg/dL15 e PCR<1,0 mg/dL21. A insulina foi quantificada pelo Sistema Immulite® (DPC®, USA), que emprega imunoensaio, em fase sólida, por quimioluminescência, para uso em analisador automático, designado para leitura quantitativa hormonal. A taxa de normalidade para insulina, segundo o método empregado, é de 6,0 a 27,0 µIU/mL. Para avaliação da resistência insulínica (RI) foi utilizado método baseado em medida estática com dois constituintes plasmáticos (insulina e glicemia de jejum). O Homeostasis model assessment-Insulin Resistant (HOMA-IR) foi calculado pela fórmula: Insulina mU/mL x glicemia de jejum, mmol/L/22,5. Valores que indicam RI foram definidos como Homa-IR>3,622.
Análise estatística
A partir dos dados foram construídas as tabelas das variáveis de mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama, quanto à presença (n=76) ou ausência (n=82) da síndrome metabólica (SM). Para análise dos dados foram calculados as médias e desvio padrão para as variáveis quantitativas e os percentuais para as variáveis qualitativas. Na comparação entre os grupos em relação às características quantitativas (clínicas, antroprométricas e bioquímicas) foi empregado o Teste t de Student. Na associação entre a frequência das características clínicas categóricas foi empregado o teste do χ2. Os testes estatísticos foram bilaterais e o nível de significância adotado foi de 5%. As análises foram realizadas utilizando-se Statistical Analyses System (SAS), versão 9.2, pelo Grupo de Apoio à Pesquisa (GAP) da Faculdade de Medicina de Botucatu, que deu o atendimento metodológico e conduziu os procedimentos estatísticos.
Resultados
As características clínicas e laboratoriais das 158 mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama, quanto à presença (n=76) ou ausência (n=82) da síndrome metabólica foram submetidas à comparação estatística, e estão representadas nas Tabelas 1 e 2. De acordo com o NCEP/ATP III, que considera a presença de três ou mais critérios para o diagnóstico, 48,1% das mulheres foram classificadas como portadoras da síndrome metabólica. Entre os critérios diagnósticos, o mais prevalente foi a obesidade abdominal (CC>88cm) afetando 54,4% (86/158) das participantes. Outros critérios como hipertensão arterial, hipertrigliceridemia, baixos valores de HDL e disglicemia estiveram presentes em 50,6% (80/158), 48,7% (77/158), 43,7% (69/158) e 37,3% (59/158), respectivamente.
Na Tabela 1 verifica-se que os grupos foram homogêneos para as seguintes variáveis: idade, tempo de menopausa, paridade, pressão arterial sistólica e diastólica e sistólica e nos valores de colesterol total e LDL (p>0,05). Observou-se diferença significante para os critérios diagnósticos da SM (CC, glicemia, HDL e TG), assim como nos valores médios do peso prévio e atual, IMC prévio e atual, insulina basal, HOMA-IR, PCR e tempo de seguimento. Na avaliação bioquímica, valores médios da PCR mostraram-se superiores nas mulheres tratadas de câncer de mama com SM, assim como apresentavam resistência a insulina demonstrado pelo HOMA-IR (p<0,05). As pacientes sem SM tiveram maior tempo de seguimento quando comparadas àquelas com SM. Em relação ao IMC atual, as pacientes sem SM apresentavam média de IMC de 26,9 (sobrepeso) e aquelas com SM, a média de 33,4 (obesidade) (p<0,05) (Tabela 1). No grupo de pacientes com SM, na comparação entre o IMC no momento do diagnóstico do câncer e o atual (27,8±5,4 versus 33,4±5,4 kg/m2) observou-se ganho significativo de peso (p<0,001) no tempo médio de seguimento de 9,1±4,0 anos. Por outro lado, entre as pacientes sem SM não houve diferença significativa nos valores médios do IMC (25,9±4,5 versus 26,9±4,3 kg/m2).
Quanto às características clinicas e laboratoriais, não foram observadas diferenças entre os grupos para tabagismo atual, uso prévio de TH, atividade física e antecedente familiar de câncer de mama (p<0,05) (Tabela 2). Quanto ao tempo de uso prévio de TH não houve diferença entre os grupos. As pacientes com SM usaram, em média, 2,6±1,6 anos e aquelas sem SM, 2,7±1,0 anos (p=0,2). Em relação ao IMC, maior porcentagem de pacientes com SM era obesa (47,4%) quando comparada às mulheres sem SM (15,8%) (p<0,05). Na comparação das variáveis bioquímicas, não foram observadas diferenças significativas na distribuição percentual quanto aos valores considerados ótimos de colesterol total e LDL (p>0,05). Por outro lado, maior porcentagem de mulheres com SM (35,5%) apresentaram valores elevados de PCR quando comparadas àquelas sem SM (9.8%) (p>0,05) (Tabela 2). Entre as pacientes constatou-se, pelos exames laboratoriais, que 37,3% apresentaram disglicemia e 48,7%, hipertrigliceridemia. Em contrapartida, no relato das pacientes apenas 13,5% referiram história de diabetes e 22,1% de hipertrigliceridemia.
Na comparação das características tumorais e tratamentos oncológicos entre as pacientes com e sem SM não foram demonstradas diferenças no estadiamento, características anatomopatológicas, imunohistoquímica e tratamentos adjuvantes (Tabela 3). Observou-se que 59,5% (94/158) das mulheres estavam no estádio II, sendo que 90,0% (142/158) com carcinoma ductal, 45,6% (72/158) com grau histológico II e 60,1% (95/158) com RE/RP positivo. Em relação ao tamanho do tumor, 62,7% (99/158) tinham entre 2 e 5 cm e 68,3% (108/158) com axila negativa. No total de pacientes, 50,6% (80/158) haviam sido submetidas a mastectomia, e 79,1% (125/158) tratadas com radioterapia, 55,7% (88/158) com quimioterapia e 60,1% (95/158) com hormonioterapia (Tabela 3).
Discussão
A presente pesquisa demonstrou elevada frequência de síndrome metabólica entre mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama. Entre estas, o risco de desenvolver SM foi de 48,1%, superior ao observado em mulheres sem câncer de mama e de mesma faixa etária e região geográfica, que foi de 39,6% em estudo prévio14. Dentre os critérios adotados para o diagnóstico da SM, o mais frequente entre as pacientes tratadas de câncer de mama foi obesidade central afetando 54,4% dos casos. Esses resultados estão em concordância com outros estudos18,23. Estudo prévio detectou SM em 54,8% de 41 mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama, sendo a obesidade abdominal o critério mais frequente18. Em estudo brasileiro, avaliando 81 mulheres (idade entre 40 - 80 anos) com diagnóstico recente de câncer de mama comparadas a Grupo Controle de mulheres sem a doença, foi observada a ocorrência da SM em 59,2 e 37%, respectivamente. A obesidade central (86,4%) e a hipertensão arterial (60,5%) foram os critérios mais prevalentes23. Por outro lado, outro estudo demonstrou prevalência de 39% da SM entre 105 mulheres na pós-menopausa com diagnóstico recente de câncer de mama24.
A obesidade abdominal e a redução do HDL colesterol estão entre os principais contribuintes para a maior prevalência da SM no sexo feminino, principalmente entre as mulheres com 45 anos ou mais de idade, revelando o possível efeito da menopausa no estabelecimento da SM14,25. Nesse contexto, está bem estabelecido o ganho de peso entre as mulheres tratadas de câncer de mama, superior a 60% em alguns estudos26-28. No presente estudo, enquanto 40,2% do grupo de mulheres tratadas de câncer de mama sem SM tinham índice de massa corpórea adequado, entre as pacientes com SM, 25,0% eram sobrepeso e 73,7% eram obesas. O ganho de peso ocorrido entre o diagnóstico do câncer de mama e o momento atual (tempo médio de seguimento de 9,1±4,0 anos) foi em média de 4,7 kg, repercutindo em aumento significativo no IMC. Esse resultado é semelhante ao obtido por estudo prévio que observou IMC médio de 31,4±4,2 kg/m2, com ganho médio de peso em 5 anos de 9,3 kg18.
Nesta pesquisa demonstrou-se que as pacientes com SM apresentavam, em média, resistência a insulina pelo HOMA-IR. O ganho excessivo de peso relaciona-se a diversas alterações inflamatórias e metabólicas que resultam na SM, sendo elas: deposição central de gordura, resistência insulínica (RI), hipertensão arterial e dislipidemia aterogênica29. Componentes individuais da SM, assim como a própria síndrome, têm sido associados ao aumento do risco para o câncer de mama entre as mulheres na pós-menopausa23,30-32. Estudo brasileiro demonstrou maior risco para SM e hipertensão arterial entre as pacientes com câncer de mama quando comparadas ao Grupo Controle23. Estudo populacional, que comparou 3.869 mulheres suíças e italianas na pós-menopausa com câncer de mama com 4.082 mulheres na mesma faixa etária sem câncer, encontrou que os fatores de risco significativos para câncer de mama foram diabetes mellitus, hipertensão arterial, hiperlipidemia e obesidade abdominal; todos componentes da SM. Os autores concluíram que a síndrome metabólica é fator de risco independente para câncer de mama (RR=1,7) e que o risco aumenta com a idade (RR=3,0)32. Em estudo caso-controle com 777 mulheres, os pesquisadores sugerem que a SM possa ser um indicador de risco para o câncer de mama em mulheres na pós-menopausa31.
Estudos atuais indicam que a SM e a obesidade, além de fatores independentes de risco para o câncer de mama23,30-32, são importantes fatores prognósticos5,24,33. Na presente pesquisa não foram constatadas diferenças entre as pacientes tratadas de câncer de mama com e sem SM em relação aos fatores preditivos e prognósticos. Isso pode ser explicado pelo fato de terem sido incluídas neste estudo mulheres sem recidiva ao longo do tratamento, sendo selecionados apenas casos de melhor prognóstico, para os quais a avaliação de risco cardiovascular se torna importante. Estudos que demonstraram associação entre a SM e fatores prognósticos para câncer de mama avaliam pacientes no momento do diagnóstico5,24,33. Contudo, na presente pesquisa mulheres sem SM tiveram maior tempo médio de seguimento (11,0±5,2 anos) quando comparadas àquelas com SM (9,1±4,0 anos). Em estudo prévio que incluiu 2.452 mulheres com história de câncer de mama em estádio inicial, os pesquisadores observaram que o diabetes tipo 2 esteve associado com pior prognóstico após 7,3 anos de seguimento5. Da mesma forma, em estudo avaliando 110 mulheres com câncer de mama, houve taxas mais elevadas de recorrência da doença entre as pacientes com SM após 5,5 anos de seguimento33. Em outro estudo analisando 105 mulheres na pós-menopausa com diagnóstico recente de câncer de mama, os autores observaram que as pacientes com SM, obesidade central e resistência a insulina apresentaram maior frequência de estádios II, III e IV no momento do diagnóstico quando comparadas às pacientes sem síndrome (78 e 55% respectivamente); o alto grau histológico esteve diretamente relacionado à presença da SM24. Por outro lado, concordando com nossos resultados, em um estudo de revisão com 860 casos de câncer de mama para determinar a relação entre a presença de receptor estrogênio e a ocorrência da SM, os autores não encontraram nenhuma associação34.
Neste estudo, os valores médios de PCR mostraram-se superiores em mulheres com SM comparado aos de mulheres sem SM. Este resultado está em concordância com estudo prévio que demonstrou valores de PCR significativamente elevados entre mulheres com SM e câncer de mama18. Os valores elevados de PCR podem refletir o fato que as mulheres participantes deste estudo eram sobrepeso ou obesas, com deposição aumentada de gordura abdominal, como demonstrado em estudos prévios35-37. Elevações nos marcadores inflamatórios sistêmicos da DCV38-40 e a presença de SM33,34 têm sido associados com redução na sobrevida de mulheres com câncer de mama, embora o número de estudos seja limitado. Em análise de dados de uma coorte de 3.993 mulheres norte-americanas com idade entre 25 a 79 anos com diagnóstico de câncer de mama não metastático, durante um período médio de seguimento de 6,3 anos, foram verificadas 121 mortes pelo câncer e 95 mortes por DCV41. Entre as mulheres que ganharam peso pós-diagnóstico, cada 5 kg de ganho esteve associado a 13% de aumento no risco de morrer do câncer e a 19% de morrer por DCV41.
A avaliação da SM em mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama alerta para a necessidade de mudanças no estilo de vida visando a redução do risco de DCV, o que é relevante para a saúde dessas mulheres1. No presente estudo, entre as pacientes tratadas de câncer de mama, constatou-se pelos exames laboratoriais, que 37,3% apresentaram disglicemia e 48,7% hipertrigliceridemia; em contrapartida, no relato das pacientes apenas 13,5% referiram história de diabetes e 22,1% de hipertrigliceridemia. Assim, após o diagnóstico da SM, a conduta deve ser direcionada para reduzir fatores causais, como a obesidade e inatividade física, e o tratamento associado dos fatores glicídicos (disglicemia), lipídicos (dislipidemias) e não lipídicos (hipertensão arterial)15. O tratamento deve ser intensivo com mudança de hábitos, incluindo redução na ingestão de gordura saturada e colesterol, aumento da atividade física e controle do peso corporal42.
Entre as mulheres tratadas de câncer de mama, o ganho de peso deve-se em parte a diminuição da atividade física, associada ao estresse psicológico e físico do tratamento27,28,41. No presente estudo, mais de 80% das mulheres foram consideradas sedentárias, não realizando nenhum tipo de exercício físico regular. Pesquisa, avaliando o nível de atividade física antes e após 12 meses do diagnóstico do câncer de mama em 812 mulheres, encontrou diminuição da atividade física no total de 2 horas por semana. As maiores reduções foram observadas entre as pacientes tratadas com radio e quimioterapia (50%) comparadas àquelas submetidas a cirurgia (24%) ou a radioterapia (23%) isoladas28. Outro estudo avaliando 753 mulheres tratadas de câncer de mama (>5 anos de diagnóstico) constatou que o tempo médio referido de exercício físico moderado foi de apenas 10 minutos por semana e que somente 7% apresentaram adequado índice de alimentação saudável, repercutindo em pior qualidade de vida nesse grupo de mulheres9. Recente pesquisa, avaliando o efeito do aconselhamento nutricional por seis meses em 40 mulheres tratadas de câncer de mama sobre o peso e os índices metabólicos de risco encontrou redução média no peso de 6,1±4,8 kg, o que repercutiu positivamente sobre os parâmetros metabólicos com melhora na relação colesterol total/HDL e diminuição nos valores de triglicerídeos e insulina43. Estudo prospectivo que incluiu 82 mulheres tratadas de câncer de mama demonstrou que a intervenção com exercício físico levou à redução dos valores de insulina e da gordura abdominal, ambos marcadores da SM44. A promoção de estilo de vida saudável é de particular importância nessa população vulnerável, incluindo a orientação alimentar e atividade física11,41,43.
Em conclusão, conforme demonstrado no presente estudo, pacientes na pós-menopausa tratadas de câncer de mama apresentam elevado risco de desenvolver síndrome metabólica e obesidade central; reconhecidamente fatores de risco para DCV e possivelmente fatores prognósticos para o câncer de mama. Assim, o seguimento dessas mulheres deveria incluir a monitorização do peso com incentivo a dieta e exercício físico e, controle da pressão arterial e do perfil lipídico e glicídico, para promover intervenção precoce e melhorar a qualidade e a sobrevida de mulheres na pós-menopausa tratadas de câncer de mama.
Agradecimentos
À Fundação de Amparo da Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo apoio financeiro da Bolsa de Iniciação Científica, Processo nº 2011/02459-5.
Recebido: 12/09/2012
Aceito com modificações: 08/10/2012
Trabalho realizado no Setor de Climatério e Menopausa do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - UNESP - Botucatu (SP), Brasil.