DOI: 10.1590/S0100-72032011000400007 - volume 33 - Abril 2011
Claudia Pignatti Ferederice, Eliana Amaral, Néville de Oliveira Ferreira
Introdução
As alterações no mecanismo de suporte uretral e da continência são evidenciadas clinicamente pela presença de sintomas urinários irritativos como a urgência e aumento de frequência urinária, e de incontinência1,2. Fatores vinculados à gravidez e ao parto são apontados como risco para o desenvolvimento de distúrbios do assoalho pélvico (AP), incluindo o tempo prolongado de trabalho de parto e do período expulsivo, o uso de episiotomia e o peso elevado do recém-nascido3-5.
No parto vaginal, a região do AP é submetida à pressão da cabeça fetal que, potencializada por manobras de Valsalva no período expulsivo, pode levar à distensão e compressão dos tecidos, nervos e dos músculos do assoalho pélvico (MAP). Mudanças no formato ou eventual rompimento uni ou bilateral da musculatura elevadora do ânus podem afetar a porção pubovisceral e puborretal6,7. Este mecanismo, principalmente se repetido, provoca distúrbios na atividade elétrica desses músculos, dano direto à sua inervação ou ainda lesão da musculatura decorrente da compressão e isquemia8. Assim, o alongamento ou sobrecarga dos tecidos do assoalho pélvico pode levar a mudanças irreversíveis nas propriedades teciduais, alterando o mecanismo de suporte uretral e de continência9.
Porém, ainda não há evidências suficientes para afirmar que a cesariana diminui o risco de desenvolvimento de incontinência urinária ou fecal. Enquanto alguns apoiam a prática da cesariana como forma de proteger o AP10-12, outros autores defendem que a operação cesariana, por si só, não previne tais distúrbios, principalmente quando é precedida de trabalho de parto10-13.
Foi demonstrado que há uma diminuição na pressão dos MAP, com o uso de perineômetro, nas mulheres que evoluíram para o parto vaginal, comparadas às que haviam sido submetidas à cesariana14. Porém, este método de avaliação utilizado na prática clínica é pouco recomendado como método de investigação, pois não há padronização dos aparelhos, do tamanho das sondas e de unidades utilizadas15. Além disso, por considerar a pressão máxima exercida pelos MAP, verifica a função de fibras musculares tipo fásicas, as quais não correspondem à maior parte de fibras que compõem a musculatura do AP.
A avaliação eletromiográfica é considerada um método confiável para analisar a função dos MAP, pois é capaz de aferir o tônus base (TB), a função de fibras fásicas durante a contração voluntária máxima (CVM) e das fibras tônicas na contração sustentada média (CSM), o que proporciona uma avaliação funcional mais completa16.
Embora se saiba que há uma relação entre a menor força dos MAP e a presença de incontinência urinária17, pouco se sabe sobre a repercussão na função muscular do AP após o parto vaginal e a operação cesariana precedida por trabalho de parto. Desta forma, este estudo tem como objetivo avaliar a prevalência de sintomas urinários de primíparas 60 dias pós-parto vaginal com episiotomia e cesárea após trabalho de parto e associação da função muscular do AP com os sintomas urinários.
Métodos
Este estudo tipo corte transversal em primíparas avaliou os sintomas urinários e função do assoalho pélvico 60 dias pós-parto. Foi realizado no período de outubro de 2008 a abril de 2010, após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) (processo nº: 827/2007).
As voluntárias foram incluídas no estudo entre a 30ª e a 34ª semanas gestacionais e convidadas a retornar dois meses após o parto. Foram consideradas gestantes nulíparas, com feto único e idade entre 18 e 35 anos. Os critérios de exclusão foram: mulheres que apresentavam dificuldade de compreensão, déficit motor ou neurológico de membros inferiores, com cirurgia prévia na região pélvica, diabetes, as que praticavam exercícios para a musculatura do AP e que tinham contraindicação para a palpação vaginal. Os objetivos do estudo e os procedimentos foram explicados às candidatas e aquelas que aceitaram participar, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
As informações sociodemográficas (idade, altura, peso, cor, grau de escolaridade, estado marital, profissão), sobre a prática de atividade física nos últimos seis meses e sobre o conhecimento sobre o AP foram coletadas durante a gestação.
Para a análise foram incluídas as mulheres que retornaram 60 (±10) dias após parto vaginal com episiotomia ou cesariana precedida de trabalho de parto. Neste retorno foram aferido o peso materno e coletados os dados de evolução obstétrica nos prontuários clínicos (tempo de trabalho de parto, peso do recém-nascido (RN), tempo de gestação até o parto). O Índice de Massa Corporal (IMC) foi classificado como: baixo peso (<18,5 kg/m2); adequado (18,5-24,9 kg/m2); sobrepeso (25-29,9 kg/m2); obesidade (>30 kg/m2)18. As participantes foram questionadas sobre a presença de sintomas urinários após o parto e submetidas a um exame físico.
A presença de sintomas urinários foi questionada de acordo com a terminologia proposta pela Sociedade Internacional de Continência (ICS)19: incontinência urinária de esforço (IUE queixa de perda urinária involuntária de urina ao esforço físico, espirro ou tosse); incontinência por urgência urinária (IUU queixa de perda involuntária de urina acompanhada ou imediatamente precedida por urgência); enurese noturna (queixa de perda urinária involuntária durante o sono); aumento da frequência urinária diurna (queixa de urinar com mais frequência durante o tempo em que está acordada, mais do que considera normal ou mais que sete vezes ao dia); urgência (queixa de vontade súbita e de difícil controle de urinar); noctúria (queixa de interrupção do sono uma ou mais vezes por vontade de urinar). Os sintomas de aumento da frequência urinária diurna, urgência e noctúria foram agrupados como sintomas irritativos vesicais20.
O exame físico foi realizado com a voluntária na posição de decúbito dorsal (quadris semifletidos e abduzidos com joelhos semifletidos), para avaliação da função dos MAP por graduação de força muscular e posteriormente por eletromiografia de superfície (EMG). A pesquisadora principal e uma auxiliar treinada realizaram todas as medidas e as entrevistas.
A avaliação subjetiva de força muscular foi realizada por toque vaginal unidigital, utilizando luvas de procedimento e gel neutro. A graduação foi feita de acordo com a escala validada de Oxford Modificada21, que varia de zero a cinco, sendo zero a ausência de contração muscular; um o esboço de contração; dois a contração fraca; três a contração média (elevação do dedo do examinador sem resistência); quatro a contração forte (elevação do dedo do examinador contra pequena resistência); e cinco a contração muito forte (elevação do dedo do examinador contra forte resistência). Os graus foram posteriormente subcategorizados em graus 1-2 e 3-4 para análise dos dados. Caso a puérpera apresentasse grau zero pelo toque vaginal, era imediatamente descontinuada da pesquisa, pois não seria possível avaliar sua condição muscular por meio de EMGs.
Para realização de EMGs, foi utilizado eletrodo intravaginal estéril conectado a um eletromiógrafo (Miotool® 200URO, Miotec, Porto Alegre-RS, Brasil), que converte o sinal mioelétrico em valores contínuos expressos em microvolts (µV), visualizados em forma de gráficos. A avaliação por EMGs consistia em captar os valores do tônus muscular de base (TB) médio, em repouso, por um minuto, o valor de CVM (maior valor em três repetições seguidas) e o valor médio da contração sustentada (CSM) por dez segundos.
A análise estatística foi feita com o uso dos programas Epi Info versão 3.5.1 e SAS versão 9.02 e o nível de significância assumido foi 5%. Para descrição das variáveis sociodemográficas, função muscular (graduação de força e EMGs do AP) e prevalência de sintomas urinários foram utilizadas medidas de frequência, médias (±DP) e medianas. O teste exato de Fisher foi empregado para a análise da associação entre a graduação de força e sintomas urinários. O Teste de Mann-Whitney foi utilizado para a avaliação da associação entre sintomas urinários e graduação de força do AP com as medidas de EMGs. Para análise dos possíveis fatores associados à presença de sintomas urinários (cor branca, escolaridade até 8ª série do Ensino Fundamental, nenhuma prática de atividade física, IMC pós-parto >25 kg/cm2, peso do recém-nascido >3000g, tempo total de trabalho de parto >763,5 minutos, parto vaginal, TB<2,17µV, CVM<11,84µV, CSM<8,44µV e graus 1-2 de força muscular) foram utilizados os testes do χ2 e exato de Fisher. Foi calculada a razão de prevalência (RP) e o intervalo de confiança (IC) de 95% para presença de IUE, IUU e sintomas irritativos.
Resultados
Um total de 46 puérperas foi submetido à avaliação pós-parto (56,5% após cesariana com trabalho de parto e 43,5% após parto vaginal com episiotomia mediolateral). As mulheres passaram por avaliação após média de 63,7 (±3,6) dias depois do parto. Mais da metade se autoclassificou como da cor não branca (52,2%), 87% eram casadas ou viviam em união estável e a maioria das mulheres estudou além da 8ª série do Ensino Fundamental (67,4%). A média de idade foi 24,2 anos (±5,2), com peso 70,3 Kg (±18,5) e IMC pós-parto de 27 Kg/m2 (±6,2). A maioria (82,6%) não realizava atividade física e, das que praticavam atividade física regular, grande parte caminhava. Do total de voluntárias, 89,1% não tinham conhecimento sobre o AP. A mediana da idade gestacional no parto foi de 39 semanas (34-41), a média de peso dos RN foi 3217,5 gramas (±543,4) e o tempo total de trabalho de parto, 763,5 minutos (±1049,7), ou 12,7 horas.
A Tabela 1 demonstra os valores da função muscular do AP e a prevalência dos sintomas urinários. A maioria das puérperas (56,5%) apresentou grau 3 de força muscular e os valores médios encontrados de TB, CVM e CSM foram 3 µV (±2,6), 14,6 µV (±11,3) e 10,3 µV (±8,6), respectivamente. Quanto à prevalência de sintomas urinários foi observado que 30,4% das puérperas relataram a presença de algum sintoma; os sintomas irritativos foram relatados por 28,3%, sendo a noctúria o mais prevalente (19,6%), seguido de urgência (13%) e do aumento da frequência urinária diurna (8,7%); sintomas de incontinência urinária foram relatados por 10,9% das puérperas, sendo IUE a mais prevalente entre elas (6,5%).
Não se observou associação entre os sintomas urinários e graduação de força com EMGs do AP (Tabela 2). Também não foi observada associação entre graduação de força muscular com a presença de sintomas urinários (Tabela 3).
Puérperas obesas ou com sobrepeso tiveram 4,6 vezes mais sintomas irritativos (RP bruta=4,6 [IC95% 1,2-18,6; valor p=0,0194]) (Tabela 4). Não se observou prevalência superior de sintomas de incontinência urinária segundo os possíveis fatores associados. Foram analisadas prevalências reduzidas e similares de IUE e IUU entre as mulheres que evoluíram para o parto vaginal e para cesariana, de 10 e 5% e de 3,8 e 3,8%, respectivamente.
Discussão
No presente estudo, aproximadamente 30% de primíparas apresentaram sintomas irritativos e 10,9% tinham incontinência 60 dias após o parto. A noctúria foi o sintoma isolado mais prevalente, relatado por quase um quinto das puérperas, enquanto outro estudo observou prevalência ainda maior, de 44,4%20. A prevalência do aumento da frequência urinária diurna foi 8,7%, semelhante à encontrada em outro estudo22, porém, três meses após o parto. Não se observou nesta pesquisa associação entre o tipo de parto, tempo de trabalho de parto e peso do recém-nascido com a presença dos sintomas irritativos, o que corrobora com os achados de Scarpa et al.20.
Em nosso estudo foi verificado que puérperas obesas e com sobrepeso tiveram prevalência aumentada (4,6 vezes) de sintomas irritativos. O incremento na pressão intra-abdominal causado pelo excesso de peso levaria à sobrecarga das estruturas de sustentação dos órgãos pélvicos, causando compressão de nervos e modificação do posicionamento do colo vesical, o que poderia estar associado ao desenvolvimento desses sintomas23. A influência do IMC materno elevado após o parto (29±6 kg/m2) na presença de sintomas irritativos também foi encontrada em outro estudo24.
Diversas são as fontes de confusão para os efeitos do tipo de parto e outros fatores de risco sobre a prevalência de sintomas urinários. Além do tempo de puerpério no momento da avaliação (60 a 360 dias), um importante determinante é a forma como o sintoma é questionado, se por meio de questionário autorrespondido ou entrevista. No presente estudo, a avaliação foi feita por entrevista e utilizou-se a definição de sintomas urinários recomendada pela ICS19, englobando os irritativos e de incontinência para oferecer uma visão abrangente das alterações urinárias 60 dias pós-parto de primíparas.
Na literatura, encontraram-se diferentes fatores de risco associados ao tipo de parto para o desenvolvimento de urgência miccional22. Após um ano do parto vaginal, o IMC materno no início da gestação, o peso do recém-nascido (>3500 g) e o tempo do segundo estágio de trabalho de parto (52-66,7 minutos) foram considerados fatores de risco para urgência miccional.
No presente estudo, 10,9% das puérperas relataram algum tipo de incontinência urinária. Pesquisas que avaliaram a presença de IUU em primíparas demonstraram prevalências maiores do que as observadas nesta casuística, sendo 8 a 17% após o parto vaginal e 5% nas mulheres submetidas à cesariana22,25. No caso da IUE, a prevalência varia de 7,2 a 15,9% entre primíparas que evoluíram para o parto vaginal espontâneo, de 11 a 25% entre aquelas que foram submetidas à cesariana com trabalho de parto e de 2 a 10,7% entre as que fizeram cesariana eletiva5,11,26. As menores taxas foram observadas um ano após o parto. No entanto, os autores diferem no método de avaliação (entrevista e questionários autorrespondidos) e no período do puerpério (quatro e seis meses e um ano pós-parto).
As mulheres submetidas à cesariana com trabalho de parto apresentaram prevalências maiores de IUE em diversos estudos5,11,26. Os tempos prolongados de trabalho de parto, particularmente do segundo estágio, poderiam causar compressão excessiva sobre nervos e músculos devido à pressão da cabeça fetal sobre essas estruturas durante as contrações uterinas1. Quanto maior o tempo em que o AP ficaria sujeito a esse processo, maior seria a chance de ocorrerem lesões. Além disso, durante o segundo estágio de trabalho de parto, haveria a somatória de forças exercidas pelas contrações uterinas, às da parede abdominal e do diafragma maternos, o que submeteria o AP a considerável distensão1. Estiramento excessivo poderia causar lesão muscular, o que predisporia ao desenvolvimento de incontinência urinária. Em nosso estudo, não foi observada associação significativa entre o tempo total de duração do trabalho de parto e a presença de incontinência. Contudo, não foi possível avaliar o efeito de ter ou não trabalho de parto em mulheres submetidas à cesariana, pois não foram incluídas aquelas submetidas à cesariana eletiva.
O parto vaginal tem sido apontado como o principal fator associado à presença de incontinência urinária entre primíparas2,4,5,22,27. Estudos que utilizaram a ressonância magnética (RM) como método de avaliação anatômica dos MAP demonstram que, após o parto vaginal, foi observada lesão uni ou bilateral, principalmente do músculo puborretal, em 20 a 51% das primíparas6,28. Esses defeitos seriam causados principalmente pelo estiramento decorrente da passagem da cabeça fetal pelo canal de parto7. No entanto, Branham et al.28 sugerem que a diminuição da espessura muscular observada após o parto vaginal pode ser causada por lesão neuropática e não por laceração ou avulsão propriamente dita, visto que observaram aumento na massa muscular do puborretal seis meses após o parto levando em conta a encontrada seis semanas pós-parto, o que não ocorreria em situação de laceração verdadeira. Apesar da ultrassonografia tridimensional e da RM serem capazes de demonstrar modificações anatômicas, ainda não está clara a relevância clínica desses achados, pois mesmo em nulíparas foram encontrados defeitos na morfologia dos músculos do assoalho pélvico28. Foi observada em nosso estudo, semelhança entre as prevalências de incontinência urinária após o parto vaginal com episiotomia e cesariana com trabalho de parto, similar ao encontrado por outros autores11,26. Estes achados demonstram que provavelmente o trabalho de parto teria influência sobre as estruturas que compõem o AP.
O peso elevado do RN seria mais um fator associado à presença de incontinência urinária, o que não foi observado no presente estudo e em outros2,4,11,26,29. No entanto, Eftekhar et al.5 encontraram prevalência superior de IUE entre as primíparas que tiveram RN com peso superior a 3000 g, independente do tipo de parto. Em outro estudo30, houve aumento no risco de IUE apenas quando o peso do RN excedia 4000 g entre as mulheres que evoluíram para o parto vaginal.
Também são apontados como fatores de riscos para o desenvolvimento de incontinência urinária após o parto de primíparas, a idade materna avançada (>35 anos)2, o uso de fórcipe e episiotomia2,25,29, presença de incontinência durante a gestação2,22,25,31, diminuição da força dos MAP31, além do tipo de parto2,4,5,25,27,29.
No presente estudo, não foi observada associação do IMC materno após o parto com a presença de IUE e IUU, como em outros documentos4,22,31, contrariando alguns autores5,27. Diferentemente desta pesquisa, as outas utilizaram o IMC pré-gestacional. Assim, essa associação ainda necessita de investigações.
Alguns autores observaram que mulheres com mais de 30-35 anos têm maior chance de apresentar IU4,27,31. Neste estudo, a idade das participantes foi limitada em 35 anos para avaliar potenciais fatores de risco aplicáveis a mulheres em seu período mais fértil, o que impede a avaliação do impacto da idade além do limite imposto pelo desenho da pesquisa. Também não foi observada associação de IU com a prática de atividade física na gestação, diferentemente de Boyles et al.27, que observaram prevalência de IU, um ano após o parto, significativamente maior entre as mulheres que caminhavam. Essa diferença pode ter ocorrido pela intensidade e tempo de prática do exercício, informação não relatada pelos autores.
Em nosso estudo não foi verificada associação entre a diminuição do grau de força muscular e a presença de sintomas irritativos, diferentemente da encontrada por Sobhgol e Charandabee24. Possivelmente essa relação não foi relatada no presente estudo devido ao número restrito de casos analisados. Outro documento31 observou pressão dos MAP significativamente menor entre as primíparas que apresentavam incontinência urinária de esforço após qualquer tipo de parto, fato não observado por Morkved e Bo32. Nas duas últimas publicações mencionadas foi utilizado o perineômetro de pressão como método de avaliação muscular, apesar de ser pouco recomendado para investigação científica15. As desvantagens do uso do perineômetro justificam a escolha da utilização de outro método de avaliação muscular do AP neste estudo. A EMGs foi selecionada, pois permite avaliação mais completa do AP, incluindo tônus de base, contração voluntária máxima e contração sustentada média, além de ser considerada um método confiável para avaliar os MAP16. Apesar disso, nesta casuística não foi encontrada associação significativa entre os três parâmetros eletromiográficos e a presença de sintomas irritativos e de incontinência urinária 60 dias pós-parto.
Foi considerado que a avaliação do AP por meio de EMGs seria recomendável para oferecer dados concretos da ativação muscular, em escala padronizada, com possibilidade de comparações com outros estudos. Por meio desta avaliação seria viável determinar se há maior deficiência em manter a contração muscular ou em desempenhá-la de forma rápida. Especificar qual deficiência é mais importante permitiria a escolha de exercícios para o treinamento dos MAP de maneira a enfatizar o tipo de fibra muscular que necessitaria maior fortalecimento. No entanto, a EMG é um recurso de custo elevado, que exige pessoal treinado, o que limita seu uso, principalmente em instituições públicas.
Contudo, a avaliação por graduação de força do AP pela palpação vaginal não deve ser descartada como método de avaliação. Apesar de ser um método subjetivo, permite que o examinador se assegure da realização correta da contração, além da alta confiabilidade intraexaminador, baixo custo e fácil execução21. No presente estudo, porém, não foi observada associação entre os sintomas de incontinência e irritativos com a graduação de força muscular. No entanto, sabe-se que o treinamento dos MAP diminui a prevalência de incontinência urinária após o parto33, sendo recomendado para prevenir o aparecimento dos sintomas urinários após o parto e proporcionar melhor qualidade de vida às mulheres.
Algumas limitações metodológicas devem ser consideradas para os resultados deste estudo. Por se tratar de um corte transversal, fica comprometida a análise de causalidade. Além disso, a prevalência de sintomas, principalmente de incontinência, foi menor que a descrita na literatura, o que compromete a análise dos potenciais fatores de aumento ou redução da mesma. O número de casos estudados foi menor que previsto no cálculo de tamanho amostral devido à perda de seguimento do estudo de coorte que deu origem a esta avaliação pós-parto, iniciado com 30-34 semanas gestacionais. Por último, não foi estudada a continência pré-gestacional das participantes, o que teria contribuído para compreender a evolução destes sintomas na gestação e após o parto.
Os resultados deste estudo demonstram que a prevalência de sintomas urinários 60 dias pós-parto de primíparas é baixa. Os sintomas de irritativos são os mais prevalentes e não foram influenciados pelo tipo de parto ou pelo trabalho de parto, mas a obesidade e o sobrepeso seriam fatores de risco para o surgimento deste tipo de sintoma urinário pós-parto. No entanto, a força muscular do AP não se associou aos sintomas de incontinência ou irritativos, como esperado. Novos estudos com maior casuística devem buscar conhecer a real associação entre os sintomas urinários e a função muscular do AP após os diversos tipos de parto, incluindo o vaginal com e sem episiotomia, fórcipe, cesariana eletiva e cesariana após trabalho de parto, controlados pelos diversos fatores que podem influenciar os resultados.
Os resultados deste estudo permitem concluir que a prevalência de sintomas urinários 60 dias pós-parto vaginal com episiotomia e cesariana após trabalho de parto é baixa e não foi demonstrada associação entre a função muscular do assoalho pélvico e sintomas urinários.
Agradecimentos
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) (projeto nº: 2007/59378-1).
Recebido 21/01/2011
Aceito com modificações 16/02/2011
Auxilio financeiro: FAPESP (no: 2007/59378-1).
Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM) da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP Campinas (SP), Brasil.