DOI: 10.1590/S0100-72032011001100006 - volume 33 - Novembro 2011
Marília da Glória Martins, Graciete Helena Nascimento dos Santos, Márcia da Silva Sousa, Janne Eyre Fernandes Brito da Costa, Vanda Maria Ferreira Simões
Introdução
Adolescência é o período compreendido entre os 10 e 19 anos, caracterizado por intenso crescimento e desenvolvimento, que se manifestam por marcantes transformações anatômicas, fisiológicas, mentais e sociais1,2. Na atualidade, gravidez no extremo inferior da vida reprodutiva tem sido objeto de preocupação, pois a gestação, o parto e a maternidade são situações que podem trazer múltiplas consequências emocionais, sociais e econômicas para a saúde da mãe adolescente e do seu filho. Com o aumento do número de gestantes adolescentes surgem grandes desafios na perinatologia, por conta dos resultados neonatais adversos encontrados em recém-nascidos de adolescentes3.
No mundo, aproximadamente 25% de mulheres têm seu primeiro filho antes de completados os 20 anos de idade, com taxas ainda mais altas em países em desenvolvimento. Segundo o censo de 2010, o Brasil registra 190.755.799 milhões de habitantes, sendo que 17,9% estão no período da adolescência, assim, 17 milhões são mulheres adolescentes4. A população jovem (abaixo de 20 anos) constitui mais de um terço do total, a maior coorte de adolescentes de todos os tempos, respondendo por um milhão de gravidezes/ano. Assim, em nosso país, emerge o reconhecimento da gravidez na adolescência como um crescente problema de saúde pública.
Estudos realizados em diferentes regiões têm explorado o impacto da gravidez na adolescência sobre a mortalidade materna e neonatal. Um fato preocupante é que as complicações relacionadas à gravidez e ao parto estão entre as principais causas de morte de adolescentes no período de 15 a 19 anos de idade, em todas as cercanias do mundo5. Ao comparar as cifras com dados provenientes de mulheres adultas, observa-se que as adolescentes apresentam maior incidência de complicações médicas que envolvem tanto a mãe quanto o filho; dados recentes indicam que esses riscos são especialmente relevantes para as adolescentes mais jovens. As adolescentes têm 75% mais risco de ter parto prematuro que as mulheres adultas6,7.
Para a adolescente, a gravidez ocorre em um organismo que ainda está em desenvolvimento físico e emocional, e poderá apresentar problemas de crescimento e desenvolvimento, distúrbios emocionais e comportamentais, educacionais e de aprendizado, além de complicações na gravidez e problemas inerentes ao parto8. A jovem mãe geralmente não está habilitada para a nova função e, adicionalmente, encontra maiores dificuldades para continuar os estudos e inserir-se no mercado de trabalho6. A gravidez na adolescência é considerada um problema de saúde pública, uma vez que pode acarretar complicações obstétricas, com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psicossociais e econômicos2,9.
As pesquisas apontam maior incidência de partos pré-termos e de recém-nascidos de baixo peso nesse grupo de gestantes que, como é sabido, são importantes marcadores de morbidade e mortalidade neonatal e infantil, sendo a prematuridade responsável por cerca de 70% da taxa de mortalidade perinatal no Brasil3,6,7,10. O parto pré-termo é intercorrência obstétrica com maior frequência entre adolescentes em comparação com gestantes de outras faixas etárias11,12. O aumento dos índices de gravidez na adolescência pode contribuir para maior prevalência de parto pré-termo, apesar da etiologia dos aspectos obstétricos da prematuridade ser multifatorial. Dentro do universo das causas de parto pré-termo, as condições socioeconômicas adversas, a desnutrição, a anemia ferropriva, as infecções do trato geniturinário, primiparidade jovem e doença hipertensiva na gravidez são as intercorrências que interferem no equilíbrio materno-fetal, contribuindo para aumentar os percentuais de parto pré-termo e de recém-nascidos de baixo peso6.
A prematuridade constitui-se em um grande problema de saúde pública, por tratar-se de um determinante de morbimortalidade neonatal, principalmente em países em desenvolvimento. Crianças prematuras e com baixo peso ao nascer apresentam risco de mortalidade significativamente superior a crianças nascidas com peso maior ou igual a 2.500 g e duração da gestação maior ou igual a 37 semanas11,13,14. Em países industrializados, a prematuridade é responsável por 70% da mortalidade neonatal e 75% da morbidade neonatal, além de contribuir com problemas de desenvolvimento do sistema nervoso, disfunção pulmonar e complicações visuais13,15.
Considerando o importante papel da prematuridade na mortalidade infantil no País, torna-se importante e necessário identificar as causas desse aumento por meio de estudos específicos. A partir da determinação dessas causas poderão ser planejadas intervenções que diminuam a ocorrência de partos prematuros e, consequentemente, as taxas de mortalidade infantil16.
Métodos
Foi feito um estudo observacional e analítico, realizado no Serviço de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU-UFMA), no período de julho a dezembro de 2006, nas enfermarias de puerpério, com a casuística total do período.
Foram entrevistadas todas as mulheres internadas nas enfermarias do puerpério no período de 1º de julho a 31 de dezembro de 2006, perfazendo um total de 2.196 pacientes. As adolescentes (10-19 anos) foram comparadas com mulheres adultas (20-34 anos), assim foram excluídas 132 pacientes com idade ³35 anos. Foram incluídas as gestantes hígidas, que pariram nesse Serviço, com idade gestacional ³22 semanas, e conceptos com peso ³500 g e gestação única. Foram excluídas 42 pacientes com gestação múltipla e 44 com doenças preexistentes. A amostra final totalizou 1.975 pacientes.
Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, a leitura e o aceite, do termo de consentimento livre e esclarecido, aplicamos o questionário previamente confeccionado, com perguntas abertas e fechadas. A seguir, foram buscados os dados técnicos para complementar os itens do questionário nos prontuários e na Declaração de Nascidos Vivos. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HU-UFMA, respeitando todos os requisitos exigidos pela resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde para estudos envolvendo seres humanos.
Efetuou-se análise univariada com distribuições de frequências e medidas de dispersão e tendência central. Utilizou-se o teste do para avaliar a significância das associações e, quando esse não foi aplicável, utilizou-se o teste exato de Fisher.
A idade gestacional foi definida com base na data da última menstruação e confirmada com o exame ultrassonográfico, de preferência de primeiro trimestre, quando disponível. A prematuridade foi definida como idade gestacional menor que 37 semanas no momento do parto17. Com relação à escolaridade, considerou-se baixa escolaridade (de zero a sete anos de estudo) e boa escolaridade (oito ou mais anos de estudo); com relação à situação conjugal, foram reunidas as pacientes com companheiro (casadas ou com união consensual) e aquelas sem companheiro (solteiras, divorciadas, viúvas); quanto ao atendimento pré-natal, considerou-se início tardio quando iniciado após o quarto mês de gestação comparando com início oportuno, quando iniciado antes disso. Quanto ao número de consultas, houve uma adaptação entre o que preconiza o Ministério da Saúde (pré-natal adequado com seis ou mais consultas) e o estudo realizado por Santos et al.10, que consideraram as seguintes categorias: pré-natal ausente, quando a gestante não realizou nenhuma consulta; pré-natal inadequado ou precário quando realizou de uma a três consultas; pré-natal regular ou intermediário quando realizou de quatro a seis consultas e pré-natal adequado quando a mulher compareceu a mais de seis consultas; quanto ao tipo de parto, normal (vaginal) ou operatório (cesárea); quanto ao peso do recém-nascido, peso adequado (³2.500 g) ou baixo peso ao nascer (<2.500 g).
Para análises multivariadas, utilizaram-se modelos de regressão logística, tendo, como variável, resposta a prematuridade. Como variáveis independentes, foram incluídas as variáveis: faixa etária materna, escolaridade, número e consultas no pré-natal, idade gestacional no início do pré-natal e situação conjugal. Foram estimadas as odds ratio (OR) brutas e respectivos intervalos de confiança (IC) de 95%. O valor de p considerado estatisticamente significante foi <0,05. A análise dos dados foi realizada por meio do software estatístico de domínio público Epi-Info, versão 3.4.1, de 2007.
Resultados
Foram entrevistadas todas as mulheres atendidas no Serviço, no período de julho a dezembro de 2006. Após aplicados os critérios de exclusão, a amostra final totalizou 1.975 pacientes. Os resultados são apresentados em tabelas com números absolutos e relativos, e, com fins comparativos, as mulheres estão agrupadas por idade de 10 a 19 anos e de 20 a 34 anos, considerada faixa de idade ideal para procriação e utilizada como grupo controle. Com relação à escolaridade, os dados demonstram que a maioria dos partos ocorreu em mulheres com tempo de estudo de 8 a 11 anos, sendo 389 (72,4%) adolescentes e 1.096 (76,2%) adultas. As adolescentes com pouca escolaridade (menos de sete anos de estudo) representaram 26,1% do total de adolescentes, comparadas com, somente, 16,4% entre as adultas; o analfabetismo (igual a 0 anos de estudo), correspondeu a 0,3% do total das mulheres.
Quanto à situação conjugal, tanto nas adolescentes (58,1%) quanto nas adultas (58,5%), predominou a união consensual, onde não houve diferença percentual entre os dois grupos.
Com relação ao pré-natal, a maioria das pacientes iniciou o pré-natal até o quarto mês, as pacientes adultas em maior número, 1.264 (87,9%), do que as adolescentes, onde 427 (79,5%) o fizeram (Tabela 1).
As informações relativas ao número de consultas no pré-natal indicam que a maioria das pacientes frequentou pré-natal regularmente (4 a 6 consultas), sendo 271 adolescentes (50,5%) e 743 adultas (51,7%) e, das que não tiveram nenhuma ou no máximo 3 consultas, 115 (21,4%) eram adolescentes e 185 (12,9%) adultas. Levando em consideração o critério definido pelo Ministério da Saúde, que considera adequado o pré-natal em que a paciente realiza no mínimo seis consultas, verificamos que 71,9% das adolescentes não realizaram um pré-natal adequado versus 64,5% das adultas. Entre as adolescentes, um número expressivo (110), perfazendo 20,5% das pacientes, não realizou o pré-natal ou o iniciou tardiamente (após o 4º mês) e, entre as adultas, isso ocorreu somente com 174 (12,1%) pacientes.
Considerando-se o tipo de parto, nota-se predominância discreta de parto normal (55,1%), quando comparadas aos partos cesáreos (44,9%). Em relação aos grupos etários, observa-se que, entre as adolescentes, os percentuais de cesáreas são menores, com 66,7% de parto normal versus 33,3% de cesáreas, sendo 66,2% nas adolescentes de 15 a 19 anos e atingindo 80% de partos normais nas menores de 15 anos, quando comparadas às mulheres adultas, que ultimaram a gestação por parto operatório em maior proporção, 49,2% nas mulheres entre 20 e 34 anos, sendo 45,2% entre 20 e 24 anos, 48,8% na idade de 25 a 29 anos e chegando a 64,6% na faixa entre 30 e 34 anos. É notável o valor crescente de partos cesáreos, por faixa etária, bem como o percentual decrescente de parto normal.
As variáveis significantes foram idade gestacional e peso ao nascer (p=0,0006 e p=0,0062, respectivamente) (Tabela 1). A prematuridade ocorreu em 17,3% dos recém-nascidos, o que significa dizer que, aproximadamente, de cada 30 mulheres, 5 delas não completaram as 37 semanas de gestação, sendo o maior percentual entre as adolescentes, com 21,4 versus 15,7% entre as adultas.
Com relação ao peso do recém-nascido, 15,8% de todas as mulheres tiveram filhos com peso <2500 g, sendo 19,9% entre as adolescentes e 14,3% entre as adultas; 79,8% dos recém-nascidos apresentaram peso adequado, com resultados semelhantes entre os grupos (78,4 versus 80,4%) e 4,4% dos conceptos nasceram com mais de 4.000 g (1,6% de adolescentes versus 5,3% de adultas).
Todas as variáveis estudadas mostraram-se estatisticamente significantes, sendo o início tardio do pré-natal (OR 1,9), pré-natal inadequado, com poucas consultas (OR 1,8), e ausência de companheiro (OR 1,9), as mais relevantes. Quanto ao parto cesáreo, a adolescência se mostrou como fator de proteção (OR 0,5) (Tabela 2).
Com relação ao desfecho prematuridade, verificou-se associação com o baixo número de consultas pré-natal, menos de quatro consultas, quando a gestante tem três vezes mais chance de ter concepto prematuro (OR 3,2; IC95% 2,4-4,2), bem como com baixa escolaridade da mãe (OR 1,6; IC95% 1,2-2,1), além da associação com a adolescência per se (OR 1,4) (Tabela 3).
Discussão
A prevalência de partos em adolescentes verificada nesta pesquisa foi de 25,4%, número superior à média nacional (22%) e aos encontrados em Campinas (SP) (17,8%)15, e em Montes Claros (MG) (21,5%)7, estudos baseados em dados do Sistema de Informações de Nascidos Vivos (SINASC); porém, um pouco abaixo do resultado encontrado por Simões et al.18 (29,4%), em pesquisa realizada na mesma cidade do atual estudo, e por Amorim et al.19 (27,2 %), em maternidade-escola da Paraíba (27,2%), região com características socioeconômicas parecidas, onde predominam o baixo nível de escolaridade das adolescentes, dos pais e a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, fatores de risco para o crescimento do número de adolescentes grávidas18-20.
Essas taxas são consideradas muito altas quando comparadas com as de países desenvolvidos, como o Canadá, França e Suécia, que apresentam respectivamente, 11,6% e 4%21. Nos Estados Unidos, em 2001, a proporção de gravidez em mulheres de 10 a 19 anos foi de 4,1%, apresentando redução de 24% desde 199022.
A frequência de gravidez na adolescência tem grande variação e depende da situação social e econômica da região, sendo mais incidente nas regiões menos desenvolvidas e menos urbanizadas12,23. De acordo com os dados do Registro Civil 2005, 19,9% das crianças que nasceram naquele ano foram de mães adolescentes. Não obstante, esse aumento relativo pode estar também influenciado pelo decréscimo acentuado da fecundidade nas faixas etárias a partir de 25 anos. Essa proporção se mostrou mais elevada na Região Norte, com destaque para Tocantins, Pará e Acre, além do Maranhão na região Nordeste. No outro extremo, o Distrito Federal, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, apresentam valores abaixo da média nacional. Entre 1995 e 2005, o Piauí e o Ceará foram os estados que tiveram os maiores crescimentos relativos da proporção de nascidos vivos de mães adolescentes, com 54,1% e 39,7%, respectivamente4.
Com relação à escolaridade, 75,1% do total de mulheres pesquisadas verificou-se que elas tinham de 8 a 11 anos de estudo. Já as adolescentes com pouca escolaridade, até 7 anos de estudo, representaram 26,0% do total de adolescentes versus 16,4% entre as adultas, uma incidência de baixa escolaridade menor que a encontrada em estudo realizado em Maceió, que encontrou elevada taxa de baixa escolaridade, analfabetas ou com menos de quatro anos de estudo entre as mulheres participantes da pesquisa (90,8% entre adolescentes e 71,6% das adultas)23. Estudo de Campinas mostrou que 48,4% das adolescentes tinham escolaridade de até sete anos de estudo em relação a 43,3% das adultas9. A baixa escolaridade pode ser devido ao abandono escolar, que ocorre frequentemente em decorrência da gravidez, pois para aquelas que frequentam a escola, a gravidez leva, na maioria das vezes, a adolescente a abandonar os estudos temporária ou definitivamente.
Segundo dados da United Nations Childrens Fund (UNICEF)5, em 2009, das meninas que abandonaram a escola, 28% fizeram pelo fato de estarem grávidas. Em estudo realizado em São José do Rio Preto, foi constatado que, para 75% das adolescentes, a gravidez foi motivo para deixarem os estudos24. É frequente a relação entre gravidez e abandono escolar5,19,24, levando a um agravamento das condições socioeconômicas dessas adolescentes, limitando suas possibilidades na qualificação e inserção no mercado de trabalho, cada vez mais exigente, gerando uma dependência do companheiro ou da família14,24.
Educação e urbanização são importantes determinantes de baixa incidência de gravidez em adolescentes19. A educação das adolescentes pode fortalecê-las a decidir sobre suas próprias vidas e desenvolver um comportamento planejado9,13,22. Quanto menor a escolaridade, maior a dificuldade de entendimento da necessidade de cuidados especiais no decorrer da gravidez, levando ao inicio tardio e ausência de pré-natal, alimentação inadequada e hábitos e vícios incompatíveis com a gravidez25.
Com relação à situação conjugal, houve predominância de mulheres que se declararam com união consensual (em torno de 58% nos dois grupos), 66,1% entre as adolescentes e 78,8% entre as adultas, além de maior percentual de solteiras entre as adolescentes (33,9%), do que entre as adultas (21,2%). Em estudo populacional americano verificou-se frequência de 20,6% de adolescentes e 54,5% de adultas que se declararam casadas26.
Verificou-se maior incidência de parto pré-termo entre as adolescentes, (21,4%) em relação às adultas (15,7%), inclusive na faixa de prematuridade extrema (22 a 33 semanas), quando ainda há imaturidade pulmonar (10,6% entre as adolescentes e 5,6% entre as mulheres entre 20 e 34 anos). A incidência de prematuridade na adolescência foi maior que o observado por Carniel et al.9, em estudo realizado em Campinas (7,5%), porém menor do que a encontrada por Goldenberg et al.7, em Montes Claros (MG) e Chalem na periferia de São Paulo, que verificou percentual de 32,9% e 27%, respectivamente, entre adolescentes de 10 a 19 anos7,9,22. Esse percentual elevado de prematuridade entre adolescentes vem se mantendo ao longo dos anos em nosso meio, visto que, Simões et al.18 encontraram 22,9% de partos prematuros entre pacientes de 13 a 19 anos e 11,2% entre aquelas de 20 a 24 anos.
Apesar da magnitude do problema, não está nítido se esses resultados dependem de fatores biológicos ou são unicamente a consequência de fatores sociodemográficos que se associam com a gravidez na adolescência. A imaturidade biológica poderia ser a explicação desses resultados adversos; essa imaturidade tem dois aspectos: por um lado a idade ginecológica jovem (definida como a concepção nos dois primeiros anos após a menarca) e por outro o risco de engravidar antes de haver completado o seu desenvolvimento. A imaturidade do suprimento sanguíneo do útero ou do colo uterino pode predispor as mães muito jovens a infecções subclínicas, aumento na produção de prostaglandinas com consequente aumento na incidência de partos prematuros. De outro modo, as mães adolescentes que continuam crescendo poderiam competir com o feto por nutrientes em detrimento do mesmo25.
Nesta pesquisa, realizada a análise multivariada tendo como desfecho a prematuridade, foi significante a associação com baixa frequência às consultas de pré-natal (OR 3,1; IC95% 2,3-4,2) e baixa escolaridade (OR 1,6; IC95% 1,2-2,1), além da adolescência per se (OR 1,4), contrariando estudo realizado em São Paulo onde a assistência pré-natal adequada pareceu diminuir a frequência de baixo peso ao nascer em filhos de mães adolescentes, porém não interferiu na frequência da prematuridade14.
No que diz respeito ao atendimento pré-natal, nesta pesquisa verificamos também que 87,9% das pacientes adultas, entre 20 e 34 anos, iniciaram o pré-natal no primeiro trimestre da gestação, enquanto entre as adolescentes esse percentual foi de 79,5%, resultado bom em relação a outros estudos, como o de Gama et al.27 que verificaram entre as puérperas de baixa renda um percentual de 10,3% de pacientes adolescentes sem consultas ou com início após o sexto mês, aproximadamente a metade do que foi encontrado em estudo analisando pacientes sem consulta ou início do quinto mês em diante (20,4%)16. Estudo realizado em Maceió também encontrou uma incidência alta de 54,8% de adolescentes que realizaram menos de seis consultas no pré-natal28. No trabalho de Goldenberg et al.7, verificaram, que somente 28,5% das adolescentes realizaram pré-natal adequado. Os achados deste estudo são concordantes com estudo realizado no município de Campinas (SP), que relaciona gestação na adolescência com a baixa adesão ao pré-natal9.
Suzuki et al.14, em estudo em hospitais públicos de São Paulo, constatou que a gravidez na adolescência esteve relacionada com nascimentos de crianças prematuras (31,4% no grupo de mães adolescentes e 8,6% no grupo de mães adultas, p=0,01). Em estudo em maternidade de Vitória (ES) verificou-se menores índices, 5,8%, talvez devido à adesão pré-natal satisfatória, com seis ou mais consultas que chegaram a 80,7% nas adolescentes tardias3. Na maioria dos estudos, os autores referem-se a baixa adesão ao pré-natal, chegando inclusive a percentuais na ordem de 23%. As diferenças geográficas, o nível de educação materna e as particularidades de cada população podem justificar os resultados dos percentuais diferentes encontrados na literatura3,10,19.
Em estudo realizado em Campinas (SP), com dados do SINASC, verificou-se que mais de um terço das adolescentes (35,2%) compareceu em menos de sete consultas de pré-natal, enquanto 64,8% fizeram sete ou mais consultas, ao contrário da maioria das adultas (76,5%) que fizeram o número adequado de consultas preconizado pelo Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM)9.
Gestantes adolescentes frequentam menos as consultas no período pré-natal ou ingressam tardiamente nesse acompanhamento. Vários fatores podem ser responsabilizados, desde a dificuldade de assumir a gestação, conflitos familiares, bem como o desconhecimento da importância dessa assistência. Uma questão que merece destaque é a estreita relação dos efeitos adversos à gestação com a assistência prestada no pré-natal. O acompanhamento médico adequado durante a gestação pode ser visto como uma política compensatória de saúde, cabendo a ele o papel de minimizar o efeito das desigualdades socioeconômicas26.
Os resultados mostraram que o número de consultas pré-natais exerce forte influência na ocorrência ou não de nascimentos prematuros. No presente estudo, a avaliação sobre a adequação do pré-natal restringiu-se ao número de consultas realizadas, considerando-se sete consultas ou mais como adequadas. Estudos verificaram que, com o aumento do número de consultas pré-natais, de nenhuma a três para sete ou mais, há redução significativa da prevalência de baixo peso e/ou pré-termo (de 14% para 4%)11,14. Esses resultados corroboram o presente estudo.
A atenção pré-natal é reconhecidamente importante na investigação de riscos biológicos de gestantes adolescentes, tais como colo curto, infecções, nutrição inadequada e abuso de drogas ilícitas, fatores implicados na ocorrência de parto prematuro. O pré-natal poderia também ser importante no sentido de oferecer suporte psicossocial nas dificuldades e situações de estresse, nas quais as mães adolescentes se encontram. Sofrimento emocional é reconhecido como causador de distúrbios endócrinos e parto pré-termo, e reduzindo esse estresse poderíamos conduzir a gravidez para resultados mais favoráveis. Suporte psicossocial de mães adolescentes pode prevenir marginalização econômica, educacional e social e não se limitar apenas ao atendimento médico necessário. Além do mais, como parturientes adolescentes são mais, frequentemente, desempregadas que outras mulheres de sua idade, suas crianças podem necessitar de suporte e vigilância adicional28.
Embora, teoricamente, a imaturidade biológica pudesse predispor o maior número de distocia e partos laboriosos, encontramos menor incidência de partos operatórios entre as adolescentes (33,3% versus 49,2% entre as adultas), em concordância com os resultados encontrados em Montes Claros, que observaram 20% de incidência de cesárea entre as adolescentes e 35% em idade adulta11, e similar ao observado em Maceió, onde se verificou 31,2% de cesárea em pacientes abaixo de 20 anos e 42,8% entre aquelas de 20 a 30 anos13.
Em estudo realizado em Campinas, os partos vaginais (63,8%) apresentaram maior percentual que os partos cesáreos para as menores de 20 anos, embora sua frequência tenha sido maior do que nas mulheres adultas (45%)13. Ficou evidenciado no presente estudo que o grupo de adolescentes é protegido dos partos operatórios, achado semelhante a outros estudos. Uma provável explicação seria a alta taxa de partos prematuros e baixo peso ao nascer em adolescentes que poderiam estar associados com maior chance de parto via vaginal e a menor incidência de cesárea, bem como a política de incentivo do Sistema Único de Saúde em diminuir os partos operatórios, a fim de minimizar e otimizar a recuperação das mães.
Conclui-se, nesta pesquisa, que entre os principais fatores relacionados à prematuridade estão a adolescência e a baixa adesão às consultas de pré-natal. A complexa natureza de cuidados intensivos de crianças prematuras demanda profissionais de saúde altamente qualificados e altos custos de tratamento. Isso nos faz raciocinar que a adoção de políticas que visem o esclarecimento da importância das consultas pré-natal iniciadas precocemente, com equipe multiprofissional, profissionais qualificados para o atendimento de gestantes adolescentes é enfoque primordial na prevenção da gravidez na adolescência, uma vez que a gravidez nesse período da vida tem sérias implicações biológicas, familiares, emocionais e econômicas.
Conflito de interesses: não há.
Recebido 22/12/2010
Aceito com modificações 25/10/2011