DOI: 10.1590/S0100-72032010000400004 - volume 32 - Abril 2010
Ânderson Gonçalves Sampaio, Alex Sandro Rolland Souza
Introdução
Estima-se que mais de 7,6 milhões de mortes perinatais ocorram anualmente no mundo, das quais 57% são de óbitos fetais, sendo a maioria nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. Apesar desse alto número, a redução da incidência de natimortos foi de dez vezes nos últimos 40 e50 anos1-3.
Não há consenso na literatura para definição de morte fetal. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define óbito fetal como aquele que ocorre antes da completa expulsão ou extração do produto da concepção do organismo materno, independente da duração da gestação. O National Center for Health Statistics dos Estados Unidos define que o termo morte fetal deve ser empregado a partir da 20ª semana completa de gestação. Alguns autores, entretanto, relatam morte fetal somente em períodos gestacionais avançados ou utilizam critérios que incluem o peso ou estatura3,4.
A via do parto recomendada em gestantes com óbito fetal é classicamente a vaginal. Sabe-se que a perda fetal representa um episódio frustrante e de difícil elaboração na vida da mulher. Essa situação dificulta que a tradicional conduta, a de se esperar pelo desencadeamento espontâneo do trabalho de parto, seja ainda a opção preferencial. Desta forma, na atualidade, devido ao quadro de ansiedade materna, há uma tendência de conduta ativa, particularmente com a utilização de técnicas de indução do parto. Assim, a conduta obstétrica na gestante com feto morto modificou-se, graças aos progressos propedêuticos e terapêuticos, permitindo a realização do parto vaginal. Entretanto, a cesariana em gestantes com óbito fetal ainda é frequentemente realizada5,6.
Os fatores relacionados à indicação de cesariana nas gestantes com feto morto são pouco estudados. Especula-se que o óbito fetal tardio e intraparto podem ser os principais responsáveis por essa indicação. Destaca-se que as principais causas de óbito fetal precoce e/ou anteparto são asfixia fetal e/ou infecção, o que refletem principalmente o nível de acompanhamento pré-natal, sendo, nessas situações, o parto vaginal a melhor opção. Entretanto, as principais causas do óbito tardio e/ou intraparto são obstrução do canal de parto, hipoxia fetal, descolamento prematuro da placenta (DPP) e gravidez pós-termo, refletindo na qualidade de vigilância da frequência cardíaca fetal e no nível de experiência obstétrica e tipo de parto, podendo a cesariana ser indicada na tentativa de salvar a mãe e/ou feto1,7.
Outros fatores podem estar associados à indicação de cesarianas em gestantes com óbito do concepto, podendo se superpor às mesmas indicações em gestações apresentando feto vivo: cesariana anterior, apresentação anômala e gestação múltipla. Além disso, ressalta-se que muitos dos fatores etiológicos associados ao óbito fetal são também indicações frequentes de cesariana, como DPP, síndromes hipertensivas e suas complicações, e outras doenças maternas associadas. Porém, sabe-se que mesmo com o concepto vivo, muitas dessas indicações não são formais para a realização do parto abdominal. Mesmo assim, a cesariana em feto morto pode ser erroneamente justificada nessas situações8.
Assim, considerando-se que o estudo do óbito fetal é fundamental na promoção das ações voltadas para saúde materno infantil e que a recomendação da via de parto é a vaginal (porém, a cesariana ainda é frequentemente realizada), foi objetivo deste estudo identificar os principais fatores associados à indicação de cesariana nas gestantes com feto morto.
Métodos
Os dados do estudo referem-se ao Hospital Barão de Lucena (HBL), localizado em Recife, Pernambuco, Brasil, o qual integra a rede própria do Sistema Único de Saúde (SUS). O HBL é um serviço de referência no Estado de Pernambuco para assistência às gestantes de alto risco. A maioria das pacientes atendidas apresenta escolaridade entre quatro e sete anos, metade reside com seus companheiros, não trabalham fora do lar e, aproximadamente, 60% são procedentes da região metropolitana de Pernambuco, com acesso fácil aos serviços de saúde, os quais realizam o pré-natal.
Trata-se de um estudo transversal e retrospectivo, que avaliou os fatores associados à cesariana em gestantes com óbito fetal após a 20ª semana de gravidez com peso do feto ao nascer superior a 500 g. No total, 258 óbitos fetais foram incluídos, no período de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2008, sendo 71 nascimentos por cesariana.
Utilizou-se como fonte de dados de óbitos fetais o sistema de informação sobre mortalidade (SIM) do Hospital Barão de Lucena (HBL), fornecido pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Estado de Pernambuco, e a avaliação dos prontuários de todas as pacientes, nos quais se encontravam as devidas declarações de óbitos fetais e descrições dos procedimentos e condutas realizadas.
Foram incluídas no estudo todas as gestantes na 20ª semana ou mais de gravidez com óbito fetal, segundo o National Center for Health Statistics4, com peso do feto ao nascer superior a 500 g, diferenciando do abortamento, de acordo com a OMS3. A via de parto foi dividida em cesariana, quando parto abdominal, e vaginal, quando o parto foi normal ou assistido.
As variáveis estudadas foram: idade materna de 19 anos ou mais e mais de 35 anos; idade gestacional igual ou superior à 37ª semana e superior à 40ª semana, confirmada por ultrassonografia realizada antes da 24ª semana de gravidez; escolaridade com três anos ou menos de estudos completos; estado civil com companheiro, quando casada ou com união consensual; números de gestações anteriores (igual a uma ou menos), partos cesarianos anteriores (igual a um ou mais); ausência de partos vaginais anteriores; assistência pré-natal (se houve alguma consulta descrita no cartão de pré-natal); gestação múltipla, quando dois ou mais conceptos; baixo peso do feto ao nascer, quando abaixo de 2.500 g; macrossomia; peso do recém-nascido com mais de 4.000 g; indicações da cesariana, a causa do óbito e o método de indução do parto (qualquer método utilizado, como amniotomia, descolamento das membranas, misoprostol e ocitocina), como descritos no prontuário médico.
As principais causas dos óbitos fetais foram determinadas pela décima classificação internacional de doenças (CID-10)9. As causas dos óbitos fetais foram colhidas da declaração de óbito e ratificadas conforme o prontuário médico, quando necessário. As indicações de cesarianas foram resgatadas conforme descrito no relatório cirúrgico.
O óbito fetal foi classificado de acordo com a idade da gestação em precoce, quando ocorreu entre a 20ª e 28ª semanas, e tardio, a partir da 28ª semana completa. Classificaram-se, ainda, os óbitos fetais de acordo com a época do acontecimento em anteparto e intraparto.
Todos os dados foram digitados em arquivo específico, criado no programa estatístico Epi-Info 3.5.1. Para a análise estatística, considerou-se todas as variáveis como dicotômicas do tipo sim ou não, segundo descrito anteriormente, comparando-se em tabelas de contingência, conforme a via de parto (cesariana ou vaginal). Utilizou-se o teste do χ2 de associação para as seguintes variáveis: idade materna de 19 anos ou menos e de 35 anos ou mais, presença de uma ou nenhuma gestação anterior, uma ou mais cesarianas anteriores, partos normais ausentes, assistência pré-natal adequada, utilização de método de indução, uso de misoprostol, óbito intraparto, óbito tardio, idade gestacional igual ou superior à 37ª semana, baixo peso do feto ao nascer, causa indeterminada, síndromes hipertensivas, infecções, malformações congênitas e DPP. Para as variáveis de gestação múltipla, realização de amniotomia, descolamento das membranas, uso de ocitocina, idade gestacional superior à 40ª semana, macrossomia, diabetes, anemia, isoimunização Rh, síndrome do anticorpo antifosfolípide, anomalias cromossômicas, funiculopatias, placenta prévia e síndrome transfusor-transfudido foi utilizado teste exato de Fisher. Para ambos os testes foi considerado um nível de significância de 5%.
Calculou-se a razão de prevalência (RP) como medida de risco, determinando-se seu intervalo de confiança (IC) a 95%. Posteriormente, todas as variáveis independentes que apresentaram um nível de significância de 20% foram selecionadas para análise multivariada. Realizou-se análise de regressão logística múltipla stepwise, evidenciando-se, para o modelo final, variáveis que persistiram associadas com o desfecho. Para todas as análises, considerou-se diferença estatisticamente significativa quando p<0,05.
O trabalho foi realizado após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Agamenon Magalhães (HAM), conforme normas para pesquisa envolvendo seres humanos, resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, sob protocolo nº. 253.766, em 29/4/2009.
Resultados
No período de Janeiro de 2005 a Dezembro de 2008 ocorreram 11.377 nascimentos vivos, na maternidade do Hospital Barão de Lucena, Recife, Pernambuco, Brasil. Obteve-se informação sobre 258 gestantes que tiveram óbito fetal, após a 20ª semana de gravidez, sendo 27,5% (n=71) submetidas ao parto cesariano, 70,9% (n=183) ao parto vaginal e 1,6% (n=4) ao parto fórceps.
As principais indicações de cesariana foram DPP (49,3%), seguida de síndromes hipertensivas (14,1%), presença de duas ou mais cesarianas anteriores (14,1%), gestação múltipla (11,3%) - sendo uma gestação tripla - e falha de indução do parto (9,9%). Outras indicações pouco frequentes foram apresentação pélvica (5,6%), sofrimento fetal (5,6%), placenta prévia (2,8%), macrossomia (2,8%), coagulação intravascular disseminada (2,8%), fatores uterinos (1,4%), prolapso de cordão (1,4%) e hemorragia do terceiro trimestre não especificada (1,4%).
A amostra foi dividida em cesariana e parto vaginal (normal e assistido). Realizou-se análise bivariada, identificando-se os principais fatores significativamente associados à cesariana em gestantes com óbito fetal. Observou-se que as mulheres apresentando idade superior ou igual a 35 anos (RP=1,6; IC95%=1,04-2,4), com passado de um ou mais partos cesarianos (RP=2,5; IC95%=1,80-3,75), gestação múltipla (RP=2,1; IC95%=1,35-3,56) e presença de assistência pré-natal (RP=2,2; IC95%=1,24-4,1) tiveram maior risco de serem submetidas ao parto cesariano quando comparado ao parto vaginal (normal e assistido). Ao contrário, a possibilidade de serem submetidas à cesariana foi menor entre as mulheres com idade inferior ou igual a 19 anos (RP=0,5; IC95%=0,27-0,96), nuligestas e primigestas (RP=0,6; IC95%=0,39-0,92) com ausência de partos normais anteriores (RP=0,6; IC95%=0,40-0,96). Não se observou associação quanto às outras variáveis analisadas, como escolaridade menor ou igual a três anos completos (RP=0,8; IC95%=0,44-1,53) e estado civil quando ausente o companheiro (RP=1,0; IC95%=0,69-1,52) (Tabela 1).
As pacientes que tiveram o parto induzido, independente do método utilizado, apresentaram menor risco de serem submetidas à cesariana (RP=0,2; IC95%=0,11-0,48). Segundo os métodos para indução do parto, o uso do misoprostol foi significante para reduzir o risco de cesariana (RP=0,2; IC95%=013-0,56). Não se observou associação quanto à amniotomia (RP=0,5; IC95%=0,08-3,19). Apenas as pacientes que tiveram partos vaginais utilizaram ocitocina e descolamento das membranas como método de indução (Tabela 1).
Quanto à classificação do óbito fetal, encontrou-se associação significativa à cesariana quando a morte do concepto ocorreu durante o parto (RP=2,0; IC95%=1,33-3,11) e quando o óbito foi tardio (RP=3,0; IC95%=1,59-5,81). Observou-se, ainda, um maior risco para cesariana em fetos a termo (RP=1,7; IC95%=1,19-2,63). Entretanto, o baixo peso do feto ao nascer foi associado ao menor risco (RP=0,6; IC95%=0,43-0,96). Não se observou associação com idade gestacional de mais de 40 semanas, macrossomia e sexo fetal (Tabela 1).
Quanto às causas do óbito fetal, as indeterminadas foram menos frequentes nas pacientes submetidas à cesariana (RP=0,2; IC95%=0,09-0,43). As síndromes hipertensivas (RP=1,9; IC95%=1,31-2,89) e a anemia (RP=2,8; IC95%=2,29-3,43) representaram importantes fatores significativamente associados à cesariana. As pacientes com infecções inespecíficas tiveram 86% menos risco de serem submetidas à cesariana (RP=0,1; IC95%=0,02-0,93). O diabetes, a isoimunização Rh e a síndrome do anticorpo antifosfolípide não foram associadas à cesariana. O DPP (RP=3,3; IC95%=2,34-4,69) foi o principal determinante do parto cesariano. Não se observou associação significativa quanto a funiculopatias, síndrome transfusor-transfundido e placenta prévia (Tabela 2).
Após análise multivariada, os fatores que permaneceram significativamente associados à cesariana foram idade materna abaixo de 20 anos (OR=0,2; IC95%=0,06-0,85), antecedentes de uma ou mais cesarianas (OR=7,0; IC95%=2,29-21,55), gestação múltipla (OR=9; IC95%=2,01-40,7), uso de misoprostol para indução do parto (OR=0,07; IC95%=0,01-0,32), óbito fetal ocorrido durante o trabalho de parto (OR=4; IC95%=1,13-14,2), baixo peso do feto ao nascer (OR=0,3; IC95%=0,11-0,94), presença de síndromes hipertensivas (OR=3,7; IC95%=1,46-9,39) e descolamento prematuro de placenta (OR=13,9; IC95%=4,67-41,69) (Tabela 3).
Discussão
O presente estudo foi motivado pelo interesse em relação ao conhecimento dos fatores determinantes da cesariana em gestantes com óbito fetal, e pela identificação das causas do óbito fetal, as quais podem ter influenciado essa conduta em gravidez de alto risco.
A morte fetal, apesar da sua reconhecida importância no planejamento de ações preventivas em saúde pública, tem sido pouco estudada no Brasil. Revisando-se os bancos de dados Medline/Pubmed e LILACS/SciELO, com base nos descritores "cesárea" e "óbito fetal", não se encontraram estudos com a finalidade de determinar os fatores associados à cesariana nessa situação. Estudos foram encontrados com o objetivo de se definir as causas associadas ao óbito fetal e a sua tendência nos últimos anos10-13.
Segundo recomendação da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e de outras organizações mundiais, a via de parto preferencial nas gestantes com óbito fetal é a vaginal14. No presente estudo, das 258 gestantes com óbitos fetais, 71 foram submetidas à cesariana, o que representa 27,5% das pacientes, taxa superior a um estudo realizado em São Paulo, que identificou 9,1% de cesáreas nas gestações com fetomorto5. Destaca-se que o estudo anterior foi realizado com amostra menor, o qual avaliou a indução do parto nessa situação. Entretanto, nossa amostra foi maior, sendo a principal indicação de cesariana o descolamento prematuro da placenta (49,3%), além da inclusão, em nosso estudo, de óbitos ocorridos durante o trabalho de parto. Em uma coorte realizada em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, observou-se uma alta frequência de cesarianas, aproximadamente 40%. Ressalta-se que, o estudo de Pelotas, à semelhança do nosso, incluiu todos os casos de mortalidade fetal anteparto e intraparto12.
As principais causas de morte fetal encontradas neste estudo foram semelhantes àquelas que aparecem com maior frequência na literatura, como síndromes hipertensivas, malformações, infecções e sofrimento fetal12,13,15,16. Em estudo realizado em São Paulo, nos 31,4% dos casos de perdas fetais a causa não pôde ser determinada16, enquanto em estudo realizado em Recife, aproximadamente metade das causas dos óbitos foram desconhecidas15. A maioria dos autores reconhece que a necropsia do feto e o estudo anatomopatológico da placenta representam os exames mais importantes na elucidação da etiologia do óbito do concepto6,14. Lamentavelmente, não é rotina a prática dessa atividade em nosso serviço.
Dentre as causas de indicações de cesariana no óbito fetal, o DPP prevaleceu com altos índices (49,3%), sendo também um dos principais fatores determinantes da cesariana em gestantes com óbito fetal. Sabe-se que o DPP é uma emergência obstétrica com elevadas taxas de morbidade e mortalidade materna e perinatal17. Segundo recomendação da Febrasgo, nos óbitos fetais por DPP, aconselha-se o parto, o mais precoce possível, pelo risco elevado de coagulopatia, sendo a interrupção da gravidez indicada, caso haja interesse da mãe6,14.
Apesar de utilizar-se o sistema de informação sobre mortalidade e o registro dos prontuários médicos para coleta de dados, observou-se que persistiu um elevado percentual de informações ignoradas sobre ocupação materna (44,1%), escolaridade (29,5%) e assistência pré-natal (21,7%). Ainda assim, quanto à frequência ao pré-natal - considerando-se apenas a sua realização ou não, sem avaliação da qualidade - encontrou-se uma associação significativa com a cesariana, em conformidade com o que sugere a literatura18,19. Porém, após análise multivariada, essa associação não foi mantida.
Encontrou-se, também, associação significativa entre cesariana anterior, síndromes hipertensivas e gestações múltiplas, mesmo após análise multivariada. É importante destacar que a cesariana prévia está entre as principais indicações para partos cirúrgicos subsequentes, apesar de não ser indicação formal8. A tentativa do parto vaginal em cesariana anterior é recomendada quando a paciente apresentar apenas uma cesariana prévia e houver possibilidade de realização de parto vaginal, ou condições maternas favoráveis8,14. Especificamente nas pacientes com óbito fetal, as quais frequentemente apresentam colo uterino desfavorável, a indução do parto se torna uma alternativa20. Atualmente, o misoprostol é o método de indução mais realizado em nosso meio15, porém sua utilização é contraindicada, devido ao risco aumentado de rotura uterina na presença de cesariana anterior20. Destaca-se a existência de outras formas de indução, como a introdução de sonda Foley no canal cervical, que pode ser indicada nessas situações21, embora pouco utilizada em nossa instituição. Desta forma, a cesariana pode ter sido frequentemente realizada em pacientes com cesariana prévia pela falta de consenso sobre a melhor conduta em tais situações22. Destaca-se que, até o momento, não existe evidência de qual a melhor conduta em gestantes com óbito fetal apresentando cicatriz uterina20.
As síndromes hipertensivas não são indicação absoluta de cesariana, porém seu tratamento definitivo é a interrupção da gestação8,23. Apesar dessa recomendação, a cesariana é frequentemente realizada pelos médicos assistentes, os quais justificam uma suposta diminuição da morbidade e mortalidade materna e fetal. No presente estudo, as altas taxas de cesariana nesse grupo de pacientes pode ter sido motivada pela resolução mais rápida do quadro clínico e decesso fetal, tendo em vista as complicações maternas da pré-eclâmpsia na conduta conservadora. É importante destacar as altas incidências de cesarianas mesmo em gestantes com síndrome hipertensivas e feto vivo24. Possivelmente, por esse motivo, observou-se a pré-eclâmpsia como importante fator determinante da cesariana, mantendo-se significativamente associadas mesmo após análise de regressão logística.
Atualmente, há grandes controvérsias sobre a via de parto da gestação múltipla25-27. Estudos vêm sendo realizados para melhores esclarecimentos26. Entretanto, nas gestantes com óbito fetal anteparto, a via baixa continua sendo a mais recomendada8. Neste estudo, encontrou-se um aumento de nove vezes no risco para realização de cesarianas. Provavelmente, isso ocorreu devido à angustia dos obstetras em se deparar com situações de mutilação do concepto14.
Observou-se que as adolescestes tiveram menor chance de serem submetidas à cesariana. Nessas pacientes, a avaliação da vida reprodutiva, principalmente antecedentes obstétricos, é bastante discutida quando obstetras irão definir alguma conduta. Nas pacientes adolescentes é prudente que o parto vaginal seja preferido em muitas situações8, para que isso não comprometa o seu futuro reprodutivo com a realização de sucessivas cesarianas nas gestações seguintes28.
Os métodos de indução do parto foram importantes fatores protetores contra a indicação de cesariana, sendo o misoprostol o método mais utilizado, o qual se manteve estatisticamente significante após análise de regressão logística. Esse dado está de acordo com estudo realizado em Campinas, São Paulo, Brasil, que também mostrou o misoprostol como método de indução eficaz e seguro em gestantes com óbito fetal5.
O óbito fetal intraparto, neste estudo, foi um importante fator determinante para a cesariana. As mortes intraparto frequentemente envolvem manejo inapropriado do parto e do nascimento e ocorrem, em sua maioria, em gestações de baixo risco, sendo mais facilmente preveníveis do que os óbitos anteparto29. Ressalta-se que o HBL, por ser referência em gestações de alto risco, apresentou alta taxa de causa de óbitos fetais e indicações de cesarianas por descolamento prematuro da placenta, com consequente mortalidade fetal intraparto.
Recebido 2/12/09
Aceito com modificações 24/3/10
Serviço de Obstetrícia do Hospital Barão de Lucena - HBL - Recife (PE), Brasil; Centro de Atenção à Mulher do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira - IMIP - Recife (PE), Brasil.