DOI: 10.1590/S0100-72032010001100007 - volume 32 - Novembro 2010
Adriana Wagner, Adelino Moreira de Carvalho, Mary Uchiyama Nakamura, Ricardo Santos Simões, Tereza Maria Pereira Fontes, Silvia Espiridião, Luiz Kulay Júnior
Introdução
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA ou AIDS) surgiu há quase três décadas e foi rapidamente disseminada por todos os continentes, com crescentes índices de mortalidade, representando uma das infecções mais temidas dos séculos 20 e 21. No entanto, o tratamento dos infectados pelo HIV com medicamentos antirretrovirais diminuiu significativamente a taxa de mortalidade desde a introdução da terapia antirretroviral combinada em 19961. Assim, durante a última década, a terapia antirretroviral combinada de alta potência, denominada HAART (highly active antiretroviral therapy) veio atenuar esses índices, controlando as infecções oportunistas e aumentando a sobrevida2,3.
Essa terapia, que compreende a combinação de drogas, promove uma importante e sustentada supressão da replicação viral, elevando a sobrevida dos pacientes soropositivos e, com isso, aumentando a prevalência dessa infecção4. Essa redução da mortalidade é particularmente evidente em países industrializados, de alta renda, onde o acesso aos cuidados de saúde e tratamentos antirretrovirais é facilitado5.
Atualmente, temos cinco grupos de agentes antirretrovirais com diferentes mecanismos de ação: inibidores da transcriptase reversa (NARTIs), inibidores da protease (PI), inibidores de fusão viral (FI), análogos nucleosídeos e não análogos de nucleosídeos e inibidores da integrase. Alguns ainda não são usados em mulheres grávidas6. A combinação desses medicamentos, usando de dois a três compostos, é que se nomeia terapia antirretroviral de alta potência7.
No entanto, apesar de tais fatos, deve-se salientar que estudos que avaliem a segurança desses medicamentos durante a gravidez são necessários, especialmente quanto à sua toxicidade e potencial teratogênico. O uso de uma droga durante a gravidez exige a investigação de seus efeitos sobre o feto e o recém-nascido, principalmente em relação à teratogenicidade, mutagenicidade e carcinogênese, dependendo da farmacocinética e toxicidade da droga e da transferência transplacentária. Dessa forma, o efeito de uma droga sobre o feto depende da dose ingerida pela mãe, da idade gestacional em que o feto foi exposto, da duração da exposição, da interação com outras drogas e de outros fatores, tais como a genética materna e fetal8. Com o objetivo de esclarecer a ação combinada de medicamentos antirretrovirais durante a gravidez, decidiu-se estudar a ação da associação zidovudina/lamivudina/ritonavir sobre a morfologia e fisiologia hepática e renal de ratas prenhes.
Métodos
Foram usadas ratas (Rattus norvegicus albinus) adultas, virgens, pesando aproximadamente 250 g, fornecidas pelo Centro de Desenvolvimento de Modelos de Experimentação (CEDEME) da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de são Paulo (UNIFESP). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (parecer nº 0749/07).
Os animais foram confinados em gaiolas plásticas, no biotério da Disciplina de Histologia, com temperatura ambiente controlada a 22ºC e iluminação artificial, obtida com lâmpadas fluorescentes, sendo o fotoperíodo de 12 horas claro (7h00min - 19h00min) e 12 horas escuro (19h00min - 7h00min), com alimentação e água ad libitum.
Após um período de sete dias, os animais foram acasalados na proporção de um macho para três fêmeas, por período de duas horas. O início da gestação (dia zero da prenhez) foi determinado pelo encontro de espermatozoides na vagina da rata.
Quarenta ratas prenhes foram então distribuídas ao acaso em quatro grupos de animais, como descrito a seguir: GCtrl (n=10), ratas que foram tratadas diariamente com 0,5 mL de propilenoglicol por via oral (controle do veículo) e três grupos experimentais. Os experimentais foram assim distribuídos: GExp1x (n=10), ratas tratadas com uma associação oral de zidovudina/lamivudina/Ritonavir, correspondendo à dose diária de 10 mg/kg de zidovudina mais 5 mg/kg de lamivudina mais 20 mg/kg de ritonavir (zidovudina e lamivudina dos Laboratórios GlaxoSmithKline, London; ritonavir do laboratório Abbott, North Chicago, Illinois); GExp3x (n=10) sob tratamento similar ao grupo anterior, sendo as ratas tratadas diariamente com 30, 15 e 60 mg/kg de zidovudina/lamivudina/ritonavir, respectivamente. Finalmente, o GExp9x (n=10), constituído por ratas tratadas com 90, 45 e 180 mg/kg de zidovudina/lamivudina/ritonavir, respectivamente. A droga e o veículo (propilenoglicol) foram administrados por gavagem em dose única diária, com um volume final de 0,5 mL, desde o dia 0 até o 20º dia de prenhez.
Ao termo (20º dia), todos os animais foram anestesiados com mistura de xilazina (20 mg/kg) e cetamina (100 mg/kg), por via intraperitoneal. Após tóraco-laparotomia, 2-3 mL de sangue materno foram retirados diretamente das câmaras ventriculares para as determinações bioquímicas da aspartato aminotransferase (AST), alanina aminotransferase (ALT), ureia e creatinina, as quais foram encaminhadas ao Laboratório Central do Hospital São Paulo (UNIFESP). As enzimas plasmáticas AST (aspartato aminotransferase) e ALT (alanina aminotransferase) foram utilizadas como marcadores bioquímicos para avaliar o dano hepático agudo precoce, sendo determinadas pelo método colorimétrico de Reitman e Frankel9. A função renal foi analisada pela determinação da ureia plasmática determinada por método cinético-enzimático10 e dos níveis de creatinina por método cinético-colorimétrico11 (reativos Labtest®).
Também foram retiradas amostras dos fígados e rins maternos e fetais que foram mergulhadas em formol a 10% tamponado (tampão fosfato 10 mM, pH 7,4) e processados para estudo histológico à microscopia de luz. O preparo e o estudo histológicos foram realizados na Disciplina de Histologia e Biologia Estrutural do Departamento de Morfologia e Genética da UNIFESP-EPM. Após os procedimentos habituais de inclusão em parafina, os blocos foram cortados (5 µm) e as lâminas coradas pela hematoxilina-eosina (HE). As lâminas foram avaliadas em microscópio de luz marca Carl Zeiss.
Na leitura das lâminas, considerou-se padrão de normalidade para o fígado: bom estado de conservação, homogeneidade de aspecto, identificação de lóbulos hepáticos íntegros, espaço porta íntegro e veias hepáticas bem definidas; cordões sinusoides presentes, íntegros, confluindo para veia centro-lobular. Nos capilares sinusoides, entendeu-se como normal a presença de algumas hemácias. Nas células hepáticas, consideraram-se normais aquelas com um ou mais núcleos íntegros, em geral centralizados, e nucléolos bem evidentes. No citoplasma, foi considerado padrão de normalidade encontrar áreas basófilas e eosinófilas. Nos fígados fetais, considerou-se ainda a morfologia das células da linhagem eritrocitária nas diferentes fases do desenvolvimento e os megacariócitos.
Nos rins, a normalidade obedeceu aos quesitos: bem conservados, apresentando corpúsculos renais e túbulos contorcidos proximais e distais íntegros; os glomérulos formados por capilares, podócitos, células endoteliais e mesangiais sem alterações histológicas. Outros itens avaliados: cápsula de Bowman íntegra, presença de células cúbicas ou poliédricas, apresentando citoplasma eosinófilo e núcleo arredondado. Na região medular, analisaram-se as alças de Henle junto aos capilares e túbulos coletores, estes com citoplasma bem delimitado e núcleo esférico, quando dentro da normalidade.
Quando houve alteração da coloração padrão estabelecida para as estruturas hepáticas, alteração na morfologia de núcleos, rompimento de limites de alguma organela citoplasmática e presença de congestão vascular, isso foi entendido como provavelmente provocado pelas drogas em suas doses de aplicação.
Para análise estatística dos dados das dosagens plasmáticas, foi usada a análise de variância (ANOVA) complementada pelo teste de Comparações Múltiplas de Tukey-Kramer. Para tanto, usou-se o software SPSS para Windows 3.1 (p<0,05).
Resultados
Os dados das dosagens bioquímicas mostraram maior concentração nos níveis séricos da aspartato aminotransferase (AST) (mU/mL) no grupo Exp9x em relação aos outros grupos de estudo (Exp9x = 305,70±55,80* > Ctrl = 126,40±32,10 = Exp1x = 115,60±42,70 = Exp3x = 123,60±10,20; p<0,05). O mesmo foi evidenciado na concentração da creatinina (mg/100 mL) (Exp9x = 0,50±0,09* > Ctrl = 0,41±0,05 = Exp1x = 0,42±0,04 = Exp3x = 0,40±0,07; p<0,05). Não houve diferenças significantes entre os grupos estudados quanto aos níveis de alamina aminotransferase (ALT) e ureia. Os dados estão expressos na Tabela 1.
Nos fígados maternos, notou-se que os grupos Ctrl, Exp1x e Exp3x apresentaram padrões de normalidade. Foram facilmente visualizados lóbulos hepáticos, espaços porta e veias hepáticas bem delineados. Os hepatócitos formavam cordões confluentes para a veia centro-lobular. Entre os cordões, observavam-se sinusoides hepáticos com núcleos arredondados e volumosos, geralmente eucromáticos (Figura 1A). No grupo Exp9x, que recebeu 90, 45 e 180 mg/kg de zidovudina/lamivudina/ritonavir, respectivamente, o fígado apresentou alterações morfológicas, tais como: alguns hepatócitos apresentando dois núcleos, outros pequenas áreas claras no citoplasma (sinais de infiltração gordurosa), eosinofilia citoplasmática e núcleo heterocromático sugestivo de atrofia e apoptose. Além disto, identificou-se vasodilatação dos capilares sinusoides (Figura 1B). Esse quadro morfológico esteve presente em todas as lâminas dos animais do grupo Exp9x, evidenciando alteração abrangente e significativa.
A morfologia dos rins maternos apresentou-se muito semelhante nos grupos Ctrl e Exp1x, nos quais se observaram corpúsculos renais e túbulos contorcidos proximais e distais dentro dos padrões de normalidade. No entanto, no Exp3x notou-se dilatação dos vasos sanguíneos peritubulares e alguns glomérulos congestos com alguns núcleos hipercromáticos (Figura 1C). No Exp9x, houve nítida dilatação dos vasos sanguíneos peritubulares e foram identificados glomérulos de menor tamanho, ricos em células contendo núcleos intensamente corados (heterocromáticos) e túbulos contorcidos com células apresentando citoplasma eosinofílico (Figura 1D).
Quanto aos fígados fetais, não foram observadas quaisquer alterações à microscopia de luz. Observaram-se núcleos de hepatócitos bem evidentes, células morfológicas da linhagem eritrocitária em diferentes fases do desenvolvimento e megacariócitos. Não se evidenciaram os limites dos lóbulos hepáticos, padrão compatível com a normalidade morfológica nessa etapa do desenvolvimento da cria (Figura 1E). O aspecto morfológico dos rins fetais se mostrou semelhante em todos os grupos estudados, tanto no córtex quanto na medula, sem sinais de alteração celular. Observaram-se glomérulos, túbulos contorcidos (na cortical), e ductos coletores e alças de Henle (na medular) típicos (Figura 1F).
Discussão
As doses administradas de zidovudina/lamivudina/ritonavir no grupo GExp1x são proporcionalmente semelhantes às recomendadas para uso terapêutico em humanos, isto é, respectivamente 10/5/20 mg/kg de peso corporal por dia. Já em GExp3x e GExp9x os animais foram tratados com doses três e nove vezes superiores à dose menor, porque o metabolismo hepático da rata é três vezes mais rápido do que o dos humanos e também porque a depuração renal desses animais é duas vezes mais rápida12,13.
Com relação aos resultados morfológicos obtidos em Ctrl, Exp1x e Exp3x, não se observaram quaisquer alterações à microscopia de luz tanto nos fígados maternos quanto de suas crias. No entanto, nas matrizes do Exp9x, as que receberam a maior dose da associação zidovudina (90 mg/kg), lamivudina (45 mg/kg) e ritonavir (180 mg/kg), foi possível notar a presença de núcleos hipercrômicos e com eosinofilia citoplasmática nos hepatócitos, representando sinais de degeneração celular. O achado de núcleos binucleados nesse grupo é sinal provável de concomitante proliferação celular. Já o achado de áreas claras nos hepatócitos é sugestivo da presença de infiltração gordurosa. Relata-se que a administração da associação de lamivudina, zidovudina e indinavir leva a aumento em 2,5 vezes na expressão gênica da enzima málico lipogênica. Similar efeito potencializador também foi observado utilizando inibidores da transcriptase reversa (NRT) na expressão do gene da ácido graxo sintase14. Isso pode induzir a aumento do metabolismo dos lipídeos (hiperlipidemia) e dos carboidratos (hiperglicemia), levando à lipodistrofia.
Os valores bioquímicos da avaliação dos níveis séricos de AST, ALT, ureia e creatinina obtidos no grupo Crtl estão dentro dos padrões de normalidade obtidos em ratos norvegicus15,16.
Com relação às enzimas analisadas, houve ligeiro aumento, porém não significante, nos níveis de ALT de Exp9x, quando comparado aos outros grupos. A AST se mostrou mais elevada, com aumento significante em Exp9x em comparação aos demais grupos. A AST possui, além da fração citoplasmática, frações em mitocôndrias, elevando-se em geral após a ALT, em resposta a agressões mais intensas17.
Alterações na ALT seriam esperadas, pois quando há agressão hepática, essa enzima é a que mais precocemente se eleva18. Deve ser registrado que o esgotamento da ALT ocorre na presença de alterações hepáticas intensas (cirrose, hepatites agudas, tóxicas e crônicas e colestases)19. Em nosso estudo, o mais provável é que essa enzima tenha diminuído em Exp9x, sem significado estatístico.
Notou-se aumento significante da AST em Exp9x. A hipótese explicativa seria que, provavelmente, a enzima se elevou porque ocorreu dano importante nos hepatócitos. Assim, a ocorrência das lesões hepáticas observadas em Exp9x poderiam ter ocasionado o esgotamento dos níveis de ALT e a elevação da AST20. Por isso, nossos achados histológicos são condizentes com as alterações hepáticas notadas.
As lesões hepáticas maternas observadas em Exp9x ocorreram provavelmente em razão do ritonavir, com base nos dados publicados na literatura13,21,22.
Deve-se notar que as alterações histológicas hepáticas provocadas pela associação dessas três drogas foram bem menos pronunciadas quando comparadas a experimentos que utilizaram zidovudina, lamivudina e ritonavir, isoladamente. Foi relatado que alterações hepáticas já podem ser observadas a partir de doses menores de ritonavir13, o que reforça a hipótese de a lamivudina diminuir os efeitos tóxicos do ritonavir. Essa diminuição do efeito tóxico do ritonavir na associação com a zidovudina também foi observada no fígado materno23. É relatado que os efeitos adversos do ritonavir (37%) são mais intensos quando usado de forma isolada do que quando associado a outro inibidor da protease, no caso, como o saquinavir (16%)24. Por isto mesmo, atualmente preconiza-se que o ritonavir seja utilizado em baixas doses, em combinação com outros antirretrovirais a fim de atuar como reforço terapêutico no aumento da eficácia do tratamento e na minimização dos efeitos adversos.
Outra hipótese diz respeito à farmacocinética das drogas em questão, como a interação medicamentosa no nível intestinal relativamente à absorção. Sabe-se que a glicoproteína P (gp-P) é encontrada em diferentes territórios e pode estar envolvida no fenômeno de modificação da absorção, distribuição e eliminação dessas drogas25.
É presumível que a adição da lamivudina pode ter atenuado a ação do ritonavir sobre o sistema metabólico enzimático P450, reduzindo seus níveis circulantes e, consequentemente, diminuindo a toxicidade materna. A lamivudina pode ter ativado também a gp-P intestinal, renal e hepatobiliar, contribuindo para diminuir os níveis séricos do ritonavir, por diminuir sua absorção intestinal26 e/ou aumentar sua eliminação27.
Quanto aos rins maternos, alterações histológicas foram observadas nos grupos Exp3x e Exp9x (em doses 3 e 9 vezes maiores que a terapêutica). Nestes grupos, foram evidenciadas alterações principalmente na região cortical, sendo mais intensas em Exp9x. Pela morfologia, notamos glomérulos menos ativos neste último grupo, contudo sem acarretar alterações bioquímicas nos níveis séricos de ureia compatíveis com disfunção renal. No entanto, os níveis séricos de creatinina mostraram-se elevados.
Quanto à avaliação da função renal, não se encontrou aumento nos níveis de ureia, que podem ter se elevado nas fases mais iniciais da agressão. No entanto, observou-se aumento significante no nível de creatinina, que pode ter se elevado mais tardiamente. Esses achados sugerem que, apesar da lesão estrutural em Exp9x, a reserva funcional renal foi suficiente para tolerar a agressão promovida pela combinação dessas drogas, nas doses e período administrado, o que justifica o achado dos níveis normais de ureia e elevação da creatinina.
A despeito de a lamivudina ser excretada predominantemente pela via renal, tanto por filtração glomerular quanto por secreção tubular ativa, nossos achados não confirmam ter sido ela a principal causadora da lesão renal observada em Exp9x, embora não se possa descartar que o ritonavir possa ter contribuído, de modo importante, para tal ocorrência.
Mesmo considerando não ser a via renal a principal via de eliminação do ritonavir (em torno de 11% apenas), essa hipótese se justifica pelo fato de que, em outros experimentos, nos quais o ritonavir foi utilizado em terapia combinada com outro inibidor de protease (lopinavir/ritonavir) ou com um análogo nucleosídeo inibidor da transcriptase reversa (zidovudina/ritonavir) em doses semelhantes às administradas em nosso experimento, a lesão renal ocorreu de forma mais acentuada, tanto com o uso de doses elevadas (nove vezes a dose terapêutica) quanto com doses menores (três vezes a dose terapêutica). Esses fatos sugerem fortemente que ele possa ter contribuído para a nefrotoxicidade observada neste e em outros estudos22,23.
Não houve alterações morfológicas hepáticas e renais nos conceptos dos grupos estudados, o que poderia ser explicado pela restrita passagem da lamivudina e do ritonavir pela barreira placentária. Em vários experimentos previamente publicados envolvendo outros antirretrovirais, não houve alteração estrutural nos fígados e rins fetais, confirmando nossos achados13,22,23,28-32. Tais achados provavelmente se devem à relatada proteção que a glicoproteína P (gp-P) placentária (proteína de transporte transmembrana que existe em grande concentração na superfície materna da placenta) exerceu ao impedir que quantidades apreciáveis tanto do ritonavir quanto da lamivudina ultrapassassem a barreira placentária13,23,33,34.
A discrepância entre as observações do uso dos antirretrovirais isolados ou em associações, bem como as diferentes expressões da gp-P em ratos, camundongos e nos seres humanos, pode ser explicada pelos diversos mecanismos envolvidos na regulação da expressão da gp-P entre as espécies. Parece óbvio que a gp-P está presente na placenta desde os estágios iniciais da gestação, mudando sua expressão ao termo, o que pode influenciar nos efeitos de xenobióticos sobre o feto35.
Em síntese, nosso trabalho mostrou que a associação zidovudina-lamivudina-ritonavir não provocou qualquer alteração nos fígados e rins fetais. Por outro lado, foi deletéria aos fígados e rins maternos, provocando lesões menos intensas quando comparada ao uso da lamivudina ou do ritonavir de forma isolada durante a prenhez das ratas.
Recebido 20/9/2010
Aceito com modificações 9/11/2010
Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo, Escola Paulista de Medicina - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil.