DOI: 10.1590/S0100-72032007001200007 - volume 29 - Dezembro 2007
Francisco Airton Rangel Filho, Carlos Augusto Alencar Júnior, Francisco Edson de Lucena Feitosa, Francisco Herlânio Costa Carvalho, Francisco Carlos Nogueira Arcanjo
Introdução
A gestação e o parto são fenômenos fisiológicos e, por isso mesmo, evoluem na maioria dos casos sem intercorrências. No entanto, um pequeno número de pacientes, por terem características específicas ou por sofrerem algum agravo, necessita de cuidados especiais e, entre estes, está a indução do trabalho de parto. Na indução, o método ideal seria aquele simples, reversível, seguro para a mãe e o feto e que provocasse uma rápida mudança cervical, instalando as alterações e os sinais de trabalho de parto o mais fisiologicamente possível1.
O misoprostol, um derivado sintético da prostaglandina E1, tem, na atualidade, recebido maior atenção como agente modificador do colo e indutor do trabalho de parto, tendo como principais vantagens a termo-estabilidade, menor risco de efeitos colaterais, custo reduzido e facilidade de conservação e estocagem, quando comparado às prostaglandinas naturais2.
Muitos estudos foram realizados com misoprostol, tentando-se estabelecer a menor dose, a via e o intervalo de administração3-7. A absorção e a eliminação do misoprostol, quando administrado por via oral ou vaginal, são bastante diferentes. Níveis séricos máximos são observados 30 minutos após a ingestão oral de misoprostol, com níveis apenas detectáveis quatro horas após a ingestão. Com a administração vaginal, o nível sérico máximo é alcançado 40 a 60 minutos mais tarde e a diminuição dos níveis séricos é lenta, sendo obtidos níveis mais estáveis, justificando, assim, a observação clínica de que são necessárias doses duas a quatro vezes maiores por via oral que por vaginal, para se conseguir o mesmo efeito8,9.
Quando se compararam as diferentes vias de uso, confirmaram-se as pesquisas sobre a farmacocinética do misoprostol: maior eficácia com a via vaginal, ou seja, porcentagem de partos em 24 horas mais elevada e menor freqüência de efeitos colaterais, embora fosse observada maior freqüência de taquissistolia, porém sem repercussões perinatais3,10-12.
Quando comparado o uso do misoprostol vaginal, nas doses de 25 e 50 mcg, a dose de 50 mcg mostrou-se mais eficaz, porém com maiores taxas de taquissistolia e síndrome de hiperestimulação13,14. Sendo assim, o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG)15 confirmou o que recomendou, em 2000, sobre a utilização de dose não superior a 25 mcg, por via vaginal, na indução do parto a termo na tentativa de diminuir as taxas de taquissistolia e síndrome de hiperestimulação. Em nosso país, essa orientação já tinha sido proposta pelo Ministério da Saúde, em 200116.
Dois estudos brasileiros compararam diferentes doses de misoprostol, por via vaginal, para a indução do parto a termo em gestantes com feto vivo. No primeiro estudo, em 1999, 50 mcg foi comparado com 25 mcg, ambos por via vaginal, com intervalo de administração a cada quatro horas, na indução do parto a termo em gestantes com colo uterino desfavorável. Participaram desse estudo 61 mulheres, 33 no grupo que recebeu 50 mcg e 28 no grupo que recebeu 25 mcg. Não houve diferença significativa entre via de parto, tempo de início da indução até o parto e desfechos neonatais, concluindo-se que a dose de 25 mcg foi tão eficaz e segura quanto a de 50 mcg17.
O segundo estudo brasileiro utilizando misoprostol em dose baixa na indução do parto a termo em gestantes com feto vivo, realizado em 2002, foi um ensaio clínico controlado e aleatorizado, unicego, exploratório, que comparou duas diferentes doses de misoprostol via vaginal (25 e 12,5 mcg) para preparo cervical e indução do parto em gestantes a termo. Neste estudo, o intervalo de administração do misoprostol foi a cada seis horas. Não foram observadas diferenças significativas em relação à porcentagem de partos vaginais, tempo de início da atividade uterina e duração do trabalho de parto, bem como ocorrência de complicações perinatais representadas por alterações cardiotocográficas, presença de mecônio no líquido amniótico e índices de Apgar de primeiro e quinto minutos abaixo de sete18. Nesse estudo, não se compararam a necessidade de suplementação com ocitocina e as indicações de cesárea. Ademais, as dosagens de 12,5 e 25 mcg foram obtidas por manipulação farmacológica a partir de comprimidos originais de 200 mcg de misoprostol (Cytotec®) e a quantidade do princípio ativo dos comprimidos manipulados não foi testada. Em virtude disso, decidimos avaliar prospectivamente, no intuito de pesquisar a menor dose efetiva, o uso do misoprostol vaginal, comparando baixas doses farmacologicamente preparadas (25 e 12,5 mcg), a cada quatro horas, na indução do trabalho de parto a termo.
Métodos
O estudo foi realizado na Maternidade Sant'Anna da Santa Casa de Misericórdia de Sobral, Ceará, entre maio de 2005 e abril de 2006. Foi realizado ensaio clínico randomizado, duplo-cego, para comparação de duas doses vaginais de misoprostol (25 e 12,5 mcg), com intervalo de administração a cada quatro horas. O presente estudo atendeu às determinações da Declaração de Helsinque, emendada em Hong-Kong, e à resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, e somente teve início após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição envolvida. Foram critérios de inclusão: idade gestacional entre 37 e 42 semanas, com indicação de indução do trabalho de parto, escore de Bishop desfavorável (menor ou igual a 6), feto vivo, em apresentação cefálica, único, com boa vitalidade, ausência de contrações uterinas características do trabalho de parto, membranas íntegras e índice de líquido amniótico normal. Foram critérios fetais de exclusão: fetos com malformações, os não reativos à cardiotocografia e em apresentação anômala. Os critérios maternos foram: cicatriz uterina prévia (cesárea anterior ou outras cirurgias), ruptura prematura de membranas, gestação prematura, intercorrências associadas que contra-indicassem o parto vaginal, sangramento genital anormal, discordância entre as idades gestacionais estimadas pela amenorréia e pela ultra-sonografia maior que duas semanas ou que uma das duas idades gestacionais estimadas fosse menor que 37 semanas e conhecida alergia às prostaglandinas.
As gestantes que preencheram os critérios de inclusão e concordaram em participar do estudo, após o esclarecimento, assinaram o termo de consentimento e foram encaminhadas para a enfermaria de risco elevado. Os comprimidos de misoprostol foram armazenados em 80 envelopes opacos e fechados, previamente numerados em ordem seqüencial e crescente; era sorteado um envelope para cada paciente, contendo oito comprimidos, com dose de 25 mcg ou de 12,5 mcg, para serem administrados a cada quatro horas, por via vaginal, até a efetiva instalação do trabalho de parto (três contrações de 40 segundos em dez minutos).
A indução era considerada falha quando não desencadeado o trabalho de parto até quatro horas depois da administração do oitavo comprimido. Era, então, indicada a cesárea por falha de indução. Como conflito de interesse, declaramos que o misoprostol de 12,5 mcg foi desenvolvido especificamente para essa pesquisa pelo Laboratório Herbron. O de 25 mcg foi o Prostokos, do mesmo laboratório, de uso restrito hospitalar, segundo a portaria 344 12/05/1998 Anvisa-MS (SVS/MS n 344/98). Antes do início da indução, as gestantes foram submetidas ao toque vaginal bidigital, ultra-sonografia obstétrica e cardiotocografia basal anteparto.
A variável independente foi a dose do misoprostol administrada: 12,5 e 25 mcg. As dependentes foram: intervalo entre o início da indução e da atividade uterina, intervalo entre início da indução e parto, intervalo entre o início da atividade uterina e parto, número de doses até o início da atividade uterina, tipo de parto (vaginal ou cesárea), indicação do parto abdominal, freqüência de partos vaginais em 24 horas, uso de ocitocina, distúrbios da contratilidade uterina (hipoatividade, hiperatividade, taquissistolia, hiperestimulação e hipertonia), alterações da cardiotocografia intraparto e eliminação de mecônio.
Outras variáveis estudadas incluíram: efeitos colaterais maternos (náuseas, vômitos, diarréia, febre, hipotensão, calafrios) e desfechos perinatais (escores de Apgar ao primeiro e quinto minutos, sepse neonatal, necessidade de admissão em Unidade de Cuidados Intermediários (UCI) neonatal, necessidade de oxigenoterapia, morte perinatal).
Foi avaliada a vitalidade fetal antes da indução por meio do sonar Doppler e cardiotocografia. Considerou-se boa vitalidade quando se encontrou freqüência basal entre 110 e 160 batimentos por minuto, presença de acelerações transitórias e ausência de desacelerações. Após o início do trabalho de parto, toda a evolução foi registrada no partograma. Nesta fase, a dinâmica uterina era verificada clinicamente a cada 30 minutos e a ausculta fetal intermitente com sonar Doppler a cada 15 minutos. A realização de toque vaginal era restrita ao mínimo necessário, de acordo com o padrão contrátil observado e a dilatação cervical no exame anterior. Os distúrbios da contratilidade uterina incluíram bradissistolia (freqüência das contrações menor que duas em dez minutos), taquissistolia (freqüência das contrações maior que cinco em dois períodos consecutivos de dez minutos) e hipertonia (uma contração única com pelo menos dois minutos de duração). A síndrome de hiperestimulação foi diagnosticada na vigência de taquissistolia ou hipertonia uterina associada a alterações da cardiotocografia, como bradicardia, desacelerações tardias e/ou redução ou perda da variabilidade dos batimentos cardíacos fetais. Na presença de taquissistolia, era orientado repouso em decúbito lateral esquerdo, hidratação rápida com 1.000 mL de Ringer lactato por 30 minutos e oxigenoterapia materna (O2 sob cateter, 5 litros/minuto). Persistindo o quadro, era realizada tocólise aguda com nifedipina sublingual (20 mg), repetindo-se a dose com 30 minutos, se necessário. Em se diagnosticando síndrome de hiperestimulação, a gestação era interrompida por via abdominal.
O tamanho da amostra, por ser um estudo piloto, foi decidido arbitrariamente, alocando-se 30 gestantes em cada grupo, ficando no final do estudo 32 gestantes no grupo que recebeu 25 mcg e 30 no que recebeu 12,5 mcg.
A análise dos dados foi realizada utilizando-se o programa estatístico Epi-Info 2002. Inicialmente, foi realizada a comparação dos grupos para teste da randomização, utilizando-se as variáveis "idade materna", "paridade", "idade gestacional" e "escores de Bishop". Era de se esperar, pelo processo de randomização, que estas características fossem semelhantes nos dois grupos.
Os grupos foram, então, comparados para verificar a associação entre a variável independente (dose do misoprostol administrada: 12,5 e 25 mcg) e as variáveis dependentes (desfechos maternos e perinatais). Utilizaram-se os testes c2 de associação (Pearson) e exato de Fisher (quando necessário) para as variáveis categóricas. Para as variáveis quantitativas, foi utilizado o teste t de Student. Em se tratando de grupos com pelo menos 30 pacientes, este teste pode ser utilizado assumindo-se a normalidade da amostra (teorema de regressão central da média).
Resultados
Foram selecionadas 64 gestantes com 63 elegíveis e uma não elegível, por já estar em trabalho de parto. Uma não concordou em participar do estudo, ficando 62 gestantes para a randomização, com 32 no Grupo de 25 mcg e 30 no de 12,5 mcg.
Em ambos os grupos, a média de idade das gestantes foi de aproximadamente 25 anos. A idade gestacional variou entre 37 e 42 semanas, com média de 40 semanas nos dois grupos. A porcentagem de nulíparas no Grupo de 12,5 mcg foi de 50% e no Grupo de 25 mcg ultrapassou 65%. A mediana da paridade, em ambos os grupos, foi três. Escore de Bishop inicial menor que 4 no Grupo que recebeu 12,5 mcg foi 36,6% e no Grupo que recebeu 25 mcg foi 34,3%. Em todas estas variáveis, não houve diferença estatisticamente significante (Tabela 1).
As principais indicações para indução, em ambos os grupos, foram pós-datismo (63,5% no Grupo de 12,5 mcg e 65,7% no de 25 mcg) e pré-eclampsia (33,2% no Grupo de 12,5 mcg e 34,3% no de 25 mcg). No grupo que recebeu 12,5 mcg, houve um caso de restrição de crescimento fetal, correspondendo a 3,3% das indicações.
No Grupo de 25 mcg, a média do tempo de início da atividade uterina após a administração da primeira dose do misoprostol (762 minutos), a média do tempo de início da atividade uterina até o parto (450 minutos) e o tempo entre a primeira dose e o parto (1.212 minutos) foram menores que no Grupo de 12,5 mcg (1.014 minutos, 510 minutos e 1.524 minutos, respectivamente), embora essas diferenças não tenham sido significantes. Sete pacientes necessitaram de apenas uma dose de misoprostol 25 mcg para o início do trabalho de parto. No outro grupo, nenhuma paciente iniciou atividade uterina regular com uma única dose. A média da dose total administrada foi significativamente maior no Grupo de 25 mcg (61,2 mcg) que no Grupo de 12,5 mcg (40 mcg), conforme a Tabela 2.
Em ambos os grupos, a taxa de parto vaginal foi elevada: 71,9% para o Grupo que utilizou 25 mcg e 70% para o de 12,5 mcg (p=0,7). Quando o escore de Bishop foi maior ou igual a 4, o percentual de partos normais no Grupo de 12,5 mcg foi de 89,0% (17) e 90,5% (19) no de 25 mcg. Parto vaginal nas primeiras 24 horas ocorreu em 40% no Grupo de 12,5 mcg versus 53,1% para o Grupo de 25 mcg (p=0,2). Ocorreu um único parto a fórcipe, no grupo que recebeu 25 mcg, em um caso em que a paciente desenvolveu hiperestimulação uterina (p=0,3). A taxa de cesariana foi semelhante em ambos os grupos, com 25% para o grupo que utilizou 25 mcg e 30% para o grupo que usou 12,5 mcg (p=0,7).
Registros cardiotocográficos alterados ocorreram em quatro pacientes no Grupo de 12,5 mcg e em cinco parturientes do outro grupo. Uma única paciente, no grupo com dose de 25,0 mcg, apresentou síndrome de hiperestimulação. Presença de mecônio foi evidenciada em duas grávidas do Grupo de 12,5 mcg e em quatro no de 25,0 mcg. Taquissistolia foi mais freqüente no Grupo de 25 mcg (5) que no Grupo de 12,5 mcg (4). Em todas as situações, não houve diferença significante (Tabela 3).
A distócia foi a principal indicação de cesárea, com 15,6% no Grupo de 25 mcg e 13,3% no de 12,5 mcg (p=0,6). Falha de indução ocorreu em três gestantes (10%) no grupo que recebeu 12,5 mcg e não houve nenhuma indicação por falha de indução no Grupo de 25 mcg. Houve necessidade do uso de ocitocina em 43,3% das parturientes no Grupo de 12,5 mcg e 28,1% no de 25 mcg (p=0,7). As cesáreas também foram indicadas pela presença de taquissistolia em uma grávida (3,3%) do Grupo de 12,5 mcg e em duas (6,2%) do Grupo de 25 mcg (p=0,5). Em cada grupo ocorreu um parto abdominal por sofrimento fetal agudo (3,3 versus 3,1%, p=0,4).
A mediana do escore de Apgar ao quinto minuto foi idêntica em ambos os grupos: nove (p=0,7). O escore de Apgar foi inferior a sete, ao primeiro minuto, em 10% dos neonatos do grupo que utilizou 12,5 mcg versus 25% no grupo que utilizou 25 mcg (p=0,7). Houve apenas um recém-nascido com escore de Apgar menor que sete ao quinto minuto no grupo que utilizou 12,5<mcg e dois no que usou 25 mcg (p=0,5). No Grupo de 12,5 mcg, a média de peso ao nascer dos recém-nascidos foi 3.286,6 g versus 3.417,5 g no Grupo de 25 mcg (p=0,5). Poucas complicações perinatais existiram com o grupo que utilizou 12,5 mcg, com apenas um neonato necessitando de reanimação e três necessitando de oxigenoterapia. No grupo que utilizou 25 mcg, cinco recém-nascidos necessitaram de reanimação (p=0,7), oito precisaram de oxigenoterapia (p=0,6) e houve um óbito no caso em que ocorreu hiperestimulação uterina (p=0,3). Nenhum caso de sepse neonatal foi detectado em ambos os grupos. Não houve necessidade de internamento dos recém-nascidos, de ambos os grupos, em unidade de cuidados intermediários (Tabela 4).
A freqüência de efeitos colaterais maternos foi baixa em ambos os grupos, ocorrendo náuseas em duas pacientes no Grupo de 25 mcg e em uma no Grupo de 12,5 mcg (p=0,5). Febre e hipotensão ocorreram em uma paciente do Grupo de 25 mcg, não se observando nenhum caso no Grupo de 12,5 mcg (p=0,320). Não foram registrados casos de vômitos, calafrios e diarréia.
Discussão
Embora o misoprostol seja bastante efetivo no amadurecimento do colo uterino e na indução do trabalho de parto, a dose ideal e o intervalo entre elas ainda não foram determinados, embora a dosagem de 25 mcg, com intervalos de seis em seis horas, seja amplamente utilizada na prática clínica para indução do trabalho de parto em gestações a termo com feto vivo19. Um estudo brasileiro, realizado em 2002, comparando 25 mcg com 12,5 mcg, ambos via vaginal e com intervalo de seis horas entre as doses, concluiu que 25 mcg parece ser, de fato, a menor dose útil para se conseguir tais efeitos, visto que uma dose menor não apresentou evidentes vantagens clínicas. No entanto, no mesmo trabalho, a dose de 12,5 mcg teve praticamente a mesma porcentagem de partos vaginais, ausência de efeitos colaterais maternos e resultados perinatais semelhantes. Isso nos motivou a realizar pesquisa semelhante, utilizando, porém, intervalo entre as dosagens inferiores às utilizadas naquele estudo18.
O presente estudo demonstrou que o misoprostol vaginal utilizado na dosagem de 12,5 mcg foi efetivo, quando comparado à dose de 25 mcg, na indução do trabalho de parto no termo. Todas as gestantes tinham escores de Bishop menores ou iguais a 6. Escores de Bishop iniciais mais desfavoráveis, menores que 4, corresponderam a 36,6% no grupo que recebeu 12,5 mcg e 34,3% no grupo que recebeu 25 mcg. A principal indicação para a indução foi o pós-datismo, em ambos os grupos, seguido pela doença hipertensiva, semelhante a um outro estudo brasileiro20.
A eficácia das duas diferentes doses do misoprostol (12,5 e 25 mcg) foi semelhante, observando-se, no entanto, redução significativa da média da dose total administrada no grupo que recebeu 12,5 mcg (40 mcg versus 61,2 mcg). A média do tempo de início da atividade uterina, o tempo de início da atividade uterina até o parto e o tempo entre a primeira dose e o parto, embora não tenham sido estatisticamente significantes, sempre foram menores no grupo que recebeu 25 mcg. Estes resultados foram semelhantes ao estudo realizado em 2002, que comparou 12,5 mcg com 25 mcg, ambos por via vaginal, com intervalo de seis horas entre as dosagens. Também não existiram diferenças significativas no tempo de início da atividade uterina (1.254 minutos versus 996 minutos), no tempo entre o início da atividade uterina e o parto (468 minutos versus 414 minutos) e no tempo entre a primeira dose e o parto (1.722 minutos versus 1.416 minutos)18.
Quanto ao número de doses de misoprostol necessárias para o início do trabalho de parto, observou-se, na dose de 25 mcg, que sete pacientes (21,9%) necessitaram apenas de uma dose, semelhante ao evidenciado por Moraes Filho et al.21, em 2005, que precisaram de apenas um comprimido para o desencadeamento do trabalho de parto em 24% das pacientes. Nenhuma paciente iniciou o trabalho de parto com apenas um comprimido quando se utilizou a dosagem de 12,5 mcg, sendo necessários até oito comprimidos em 6,6% das pacientes que utilizaram 12,5 mcg.
Em ambos os grupos, a taxa de parto vaginal foi elevada, 71,9% para o grupo que utilizou 25 mcg e 70% para o que usou 12,5 mcg, não havendo diferença estatisticamente significante. Quando o escore de Bishop foi maior ou igual a 4 tivemos cerca de 90% de partos vaginais em ambos os casos. A porcentagem de parto vaginal em 24 horas no grupo que recebeu 25 mcg foi de 53,1% e de 40% no de 12,5 mcg.
No Grupo de 25 mcg, o percentual de partos vaginais foi semelhante a outros estudos descritos na literatura20-22. O grupo que recebeu 12,5 mcg obteve 70% de partos vaginais, índice maior que o do estudo anterior que motivou esse ensaio clínico, que encontrou taxa de 65%18. Isto pode ser justificado pelo menor intervalo entre as dosagens em nosso estudo, a cada quatro horas.
Houve três casos de falha de indução no Grupo de 12,5 mcg, correspondendo a 10% do total das indicações de cesárea. No grupo que utilizou 25 mcg, não foi encontrado nenhum caso de falha de indução nas indicações de cesárea. Wing et al.9, em 2000, encontraram 6,25% de falha de indução no grupo que utilizou misoprostol vaginal na dose de 25 mcg. Dois estudos brasileiros recentes, realizados em 2005, que utilizaram misoprostol 25 mcg via vaginal o primeiro com intervalo de seis horas e dose máxima de 200 mcg e o segundo com intervalo de seis horas e dose máxima de 100 mcg , obtiveram índices de falha de indução de 4,8%, no primeiro estudo, e 16% no segundo21,22. Atribuímos as maiores falhas de indução ao maior intervalo de tempo entre as doses em relação ao nosso estudo.
A necessidade do uso de ocitocina foi maior, como era esperado, no grupo que utilizou 12,5 mcg, com taxa de 43,3%, contra 28,1% para o grupo que utilizou 25 mcg. Mesmo este grupo, porém, teve porcentagem bem menor quando comparado ao obtido por um estudo que utilizou a mesma dose e via, com intervalo de seis em seis horas, com taxa de 41,9%19. Em outro estudo brasileiro, o percentual de pacientes que necessitou do uso de ocitocina foi de 34,7%22.
Houve baixa incidência de cardiotocografia alterada, presença de mecônio e taquissistolia. No Grupo de 25 mcg, houve um caso de hiperestimulação uterina, diagnosticado no período expulsivo, em uma gestante que usou seis comprimidos, ou seja, 150 mcg, tendo evoluído para parto vaginal, com fórcipe de alívio, de urgência, infelizmente com natimorto.
A incidência de taquissistolia e de hiperestimulação parece depender da dose do misoprostol empregada. Nesse estudo, encontraram-se 13,3% de taquissistolia, no grupo que recebeu 12,5 mcg e 15,6% no que recebeu 25 mcg taxas mais elevadas que as obtidas em estudo realizado em 1997, que utilizou misoprostol na dosagem de 25 mcg, a cada quatro horas, e obteve incidência de taquissistolia de apenas 8,0%23. Outro estudo, utilizando misoprostol 25 mcg via vaginal, encontrou incidência de taquissistolia de apenas 4,3%, com intervalo entre as doses também de quatro horas24. Em nosso estudo, nenhum caso de hiperestimulação uterina foi encontrado no grupo que recebeu 12,5 mcg e, como citado, houve um caso (3,1%) no grupo que recebeu 25 mcg. Em recente estudo brasileiro que utilizou misoprostol para indução do parto a termo, na dose de 25 mcg, com intervalo de seis em seis horas, a incidência de taquissistolia e hiperestimulação ficaram em torno de 7 e 3%, respectivamente21.
A incidência de efeitos colaterais foi muito baixa nos dois grupos. No que recebeu 12,5 mcg, ocorreu apenas um caso de náusea, sem nenhum outro efeito colateral associado. No grupo que recebeu 25 mcg, ocorreram dois casos de náuseas, um de vômito e um de febre, resultados semelhantes a dois outros estudos brasileiros18,21.
O percentual de escore de Apgar menor que sete ao primeiro e quinto minutos foi inferior no Grupo de 12,5 mcg, porém, sem diferença significativa. Os percentuais de escores de Apgar ao primeiro e quinto minutos, nos dois grupos estudados, foram semelhantes aos descritos na literatura18,21.
Analisando as complicações perinatais no grupo que utilizou 12,5 mcg, tivemos um caso de reanimação neonatal e três recém-nascidos necessitaram de oxigenoterapia. No grupo que utilizou 25 mcg, cinco necessitaram de reanimação neonatal e oito de oxigenoterapia. O número de neonatos que utilizaram oxigênio parece elevado, mas, se levarmos em consideração que é rotina do serviço de neonatologia da instituição que seja instituído oxigênio a todo recém-nascido com escore de Apgar menor que sete ao primeiro minuto, verificaremos que esse foi exatamente o número de recém-nascidos que tiveram escore de Apgar menor que sete ao primeiro minuto no grupo que usou 25 mcg. Não houve nenhum caso de sepse neonatal. Ocorreu um óbito fetal no grupo que utilizou 25 mcg. Nesta paciente, foi diagnosticado taquissistolia e, então, realizada conduta de acordo com o protocolo da instituição. Em seguida, observou-se alteração da freqüência cardíaca fetal, sendo diagnosticada síndrome de hiperestimulação, indicando-se o parto abdominal de urgência. Durante a preparação para a cesárea, evidenciou-se estar a dilatação completa, com feto no 4° plano, sendo, então, realizado o parto vaginal a fórcipe, com natimorto. Essa paciente evoluiu no pós-parto imediato com hemorragia uterina por atonia, respondendo bem ao tratamento clínico e transfusão sangüínea. Atribuímos esse fato a uma provável avaliação inadequada da atividade uterina, com diagnóstico tardio da síndrome de hiperestimulação, como sugerido por um estudo publicado, em 1996, quando ocorreu um caso semelhante25. Destaque-se que a dose de 25 mcg não costuma estar associada à ocorrência de síndrome de hiperestimulação, apesar de, em um estudo brasileiro, ter também ocorrido um caso, seguido igualmente de atonia uterina, com necessidade de realização de histerectomia20.
Apesar da orientação dada pelo ACOG15 e pelo Ministério da Saúde16 de que a dose de 25 mcg é suficiente para desencadeamento do trabalho de parto com menor freqüência de taquissistolia e síndrome de hiperestimulação, este estudo mostrou que a dose de 12,5 mcg de misoprostol vaginal, aplicada a cada quatro horas, mostrou-se eficiente e segura para indução do parto, com baixas taxas de cesárea e de taquissistolia, poucos efeitos colaterais maternos e bons resultados perinatais. No entanto, inclusive pelo pequeno número de casos avaliados, faz-se necessária a realização de novos estudos, inclusive com maior número de pacientes, para confirmar os achados obtidos em nossa pesquisa.
Recebido: 29/11/2007
Aceito com modificações: 21/12/2007